15 anos depois, PS adota o "Margem Sul, jamais"

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Só pode ser brincadeira. E no entanto, é mesmo a sério - ou pelo menos é disso que nos querem convencer. A 29 de junho, salta a tampa a Pedro Nuno Santos e o ministro das Infraestruturas, aproveitando a ausência do primeiro-ministro, atira para a esfera da concretização o despacho da decisão sobre o novo aeroporto de Lisboa - que afinal eram dois, para calar todas as choraminguices que durante décadas atrasaram um projeto que é urgente há anos mas não sai da cepa torta. Um absurdo, é certo, mas um passo dado fora do círculo em que andamos desde o século passado que até faz Pedro Nuno merecer créditos pela iniciativa.

Não durou 24 horas, claro. Desautorizado, António Costa tirou a caneta do bolso e o tapete ao seu ministro e anulou tudo em nome de um consenso alargado com o PSD (apesar de nunca antes ter mexido um dedo para sequer ouvir o maior partido da oposição, qualquer que fosse o tema). Mas manteve Pedro Nuno por ali, preso ao cargo mas consciente de que já não podia verdadeiramente desempenhá-lo.

50 dias mal contados sobre o lamentável episódio (mais um) deste governo, em plena silly season quebrada pelo fogo e pela aflição dos que veem o bolso mais leve a cada mês que passa, começou o carnaval.

Veio o Expresso noticiar que um grupo de empresários se propunha construir a infraestrutura e até tinha um projeto e meio de o financiar... em Santarém. Longe de tudo quanto foi estudado (Rio Frio, Ota, Montijo, Beja, Leiria...) e da localização validada pelo LNEC, Alcochete. Mas foi o suficiente para animar a malta, que se esqueceu que já estamos para lá de qualquer prazo razoável e~que voltar à estaca zero seria desprezar uma das mais importantes fontes de receita do país, o turismo.

Quem são estes investidores, não se sabe - e toda a gente acha normal - mas garantem que fazem a obra só com o rendimento das taxas aeroportuárias. Mil milhões, não mais - sem contar, claro, com todas as infraestruturas que se exigiria que o Estado fizesse nascer em redor, incluindo planos que implicam reverter a decisão de excluir Santarém dos investimentos ferroviários.

E assim, em mês e meio, passou-se da decisão tomada à incerteza total, ao nível -10 da solução para um aeroporto que já dá problemas diários e que se quer voltar a repensar desde o início. Reabra-se a conta e comece-se a somar mais dinheiro aos 70 milhões de euros que os portugueses já pagaram em estudos e consultorias para o novo aeroporto de Lisboa. Pois parece que é para amachucar e deitar fora tudo o que já existe e fazer tábua rasa do que diz a instituição mais acreditada - e independente, note-se - do país sobre o tema, pelo menos desde 2008.

Recorda-se? Esses foram os tempos em que outro governo socialista se recusava a aceitar a avaliação isenta do LNEC. "Alcochete, jamais!", ria-se então Mário Lino, antes de deixar tudo em águas de bacalhau. Se não podia ser na Ota, localização privilegiada por quem estava aos comandos, não seria em lado nenhum.

A história repete-se, com velhos protagonistas - e nem o argumento muda. Agora, é João Cravinho que reaparece a dar gás a propostas alternativas às que os técnicos validaram como mais adequadas. Um aeroporto na Margem Sul é a "escolha mais saloia que pode passar pela cabeça de quem tenha uma noção do possível papel de Portugal na União Europeia", diz o homem que anda há 20 anos a rejeitar pareceres técnicos para justificar um aeroporto na Ota. Mário Lino não diria melhor, com o "deserto" que se estende para lá da ponte.

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