Carlos Martins: "Temos o melhor resultado desde que foi criado o centro hospitalar"

Em entrevista ao DN, o presidente do conselho de administração Centro Hospitalar Lisboa Norte diz que fecharam 2016 com o melhor resultado desta década e fala dos objetivos e desafios para este ano
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Desde 2009 que os hospitais de Santa Maria e Pulido Valente passaram a estar unidos no Centro Hospitalar Lisboa Norte. Atravessaram anos negros entre 2010 e 2013, altura em que estiveram em falência técnica. Numa entrevista ao DN, o presidente do conselho de administração, Carlos Martins, adianta que fecharam 2016 com o melhor resultado desta década e quais os objetivos e desafios para este ano, como reduzir a dívida aos fornecedores, que está em 250 milhões de euros

Como reequilibraram as contas?

Temos o melhor resultado desde que foi criado o centro hospitalar em 2009 e nessa altura houve uma injeção de capital. Nós conseguimos este resultado saindo do período crítico. Como aí chegámos? Em 2013 perdíamos 11 milhões de euros por mês, podia obrigar ao encerramento do Pulido Valente e levar ao despedimento de 1500 trabalhadores pelo equilíbrio das contas. Tomámos um conjunto de decisões de gestão que passaram muito pela alteração da nossa atividade e por uma maior eficiência sem prejudicar a segurança e a missão.

Que medidas concretas tomaram?

Em 2014 iniciámos uma nova política de recursos humanos, que passou por contratar recursos mais qualificados e renovar a pirâmide etária dos serviços mais importantes. É um trabalho que ainda não terminou. Olhámos para os serviços que estavam mais fragilizados, que corriam risco de encerrar e refundámo-los. O aumentarmos a capacidade em recursos humanos e com diferenciação permitiu passarmos a ter atividade com maior complexidade e mais bem remunerada. A primeira grande alteração foi na qualidade da nossa produção. A segunda foi a quantidade. Temos os melhores resultados de atividade em 2016. Aumentámos a área de responsabilidade em cerca de 100 mil habitantes e encarámos a liberdade de escolha como uma oportunidade porque tínhamos capacidade instalada. Aumentando recursos humanos, assumindo e integrando aumento de custos, as políticas de horário, conseguimos absorver e ampliar a resposta com bons resultados económico-financeiros.

Qual foi o aumento de produção?

Aumentámos tudo: área de responsabilidade, capacidade de internamento. Temos mais 150 camas abertas e mais 30 disponíveis se for necessário. A nossa regra é termos, por antecipação, um conjunto de planos preparados. Consegui-mos a tempo entender que 120 camas do plano de contingência seriam suficientes a nível regional, mas não para a absorção do hospital, tendo em linha de conta a procura que estávamos a ter e o crescimento na urgência. Pela primeira vez em quatro anos contratualizámos camas no exterior para os nossos casos sociais.

Quantas camas contratualizaram para os casos sociais e quais os custos?

Temos 30 camas, todas ocupadas, e mais dez de reserva. São doentes que têm todos alta e não devem estar dentro de um hospital. Estão em camas com a devida qualidade e os níveis de cuidados adequados, contratadas a seis instituições. Só pagamos as camas ocupadas. O custo contratualizado são 160 euros por dia. É o valor fixado. São contratados que envolvem a prestação de cuidados e alguns meios da nossa parte.

Tem que ver com o aumento de casos sociais ou incapacidade de resposta da rede de cuidados continuados?

Tem que ver com a necessidade de ter respostas mais rápidas. Nos últimos dois meses tivemos velocidades vertiginosas de acesso à urgência e depois toda a drenagem para os internamentos. Essas camas estão ocupadas por doentes com alta clínica, com o consentimento dos próprios ou da família e residem na área de influência daquela instituição.

Houve grande pressão na urgência?

O mapa de janeiro mostra que metade da procura podia ser tratada nos centros de saúde. Tivemos, em dezembro, um fluxo completamente anormal com vários picos de 850 episódios de urgência. 56% dos utentes eram de fora da área. Pela primeira vez tivemos, em vários dias, uma seta perfeita: começava em Mafra, passava em Cascais, ao lado de São Francisco de Xavier, por cima do Fernando da Fonseca e vinha para Santa Maria. Houve outra seta que deveria ir em direção a Vila Franca de Xira e parava aqui. Tivemos períodos entre as 22.00 e as 02.00 em que sozinhos tivemos tantos doentes na urgências como as três parcerias público-privadas e os outros três hospitais. Não invalidou resposta em tempo e qualidade. A instituição tem muito orgulho nos profissionais.

Qual é a dívida aos fornecedores?

A nossa dívida a 31 de dezembro era de 250 milhões de euros a fornecedores Estado e não Estado. Temos conseguido diminuir o prazo médio de pagamento e resolver dívida atrasada, mas há uma dívida que vai acumulando. Há um problema que é um stock de dívida de 300 milhões quando chegámos, com 11 milhões de passivo mensal. Não há milagres. Em 2016, o FMI assinalou a trajetória que se antevia que acontecesse e foi-nos transmitido o que tinha sido dito em 2015: não havia capacidade da instituição, com a responsabilidade e o crescimento de atividade que estava a ter, resolver per si o stock da dívida. Claro que temos um plano de reequilíbrio financeiro em que nos disponibilizamos para assumir um terço, 100 milhões de euros. O nosso objetivo é chegar ao fim do mandato - 31 de dezembro de 2018 - com equilíbrio nas contas anuais, como estamos a ter, e com dívida dentro dos prazos normais que estão estipulados. Agora precisamos de ajuda externa, neste caso do governo, num terço da dívida.

O governo injetar aqui dinheiro...

... não é o governo injetar aqui dinheiro. É ajudar a resolver um stock de dívida que tem contribuído para a dívida pública. Esta dívida não foi gerada por esta gestão. Achamos que temos capacidade de resolver em dois anos 100 milhões. Esperamos que o acionista injete também 100 milhões de euros para resolver dívida. Os outros 50? Também nos devem a nós. Temos a expectativa de conseguir cobrar 50 milhões.

Que poupanças conseguiram?

Abrimos um concurso público numa área do sangue que nos deu uma poupança de 6 milhões de euros. Reduzimos 40% a faturação de um único fornecedor nessa área, que pesa 10% anual na área dos consumos clínicos. A introdução dos biossimilares, respeitando sempre a opção dos doentes, permitiu uma poupança de 4 milhões de euros. Temos usado, no bom sentido, os ensaios clínicos para conseguirmos eficiência. Não estamos a depender exclusivamente do contrato-programa com o governo. Temos meios próprios de financiamento. No ano passado tivemos de receita 200 mil euros. É o valor contabilístico tangível. Foi o que faturámos às outras instituições, em regra por serviços médicos nossos. Para o SNS e para o país estamos seguramente a falar de um valor [de poupança] acima de 2,5 milhões porque evitámos deslocações e internamentos. Aumentámos a cirurgia de ambulatório, hospital de dia, serviço domiciliário. Chama-se eficiência de gestão, mas também humanização e qualidade.

Perfil

Nasceu em 1961 em Portimão.

Licenciado em Relações Internacionais pela Universidade do Minho.

Está no segundo mandato como presidente da administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte.

Foi deputado, secretário de Estado da Saúde e secretário de Estado adjunto do ministro do Turismo nos governos de Durão Barroso e Santana Lopes, respetivamente. Em 2012, foi assessor do ministro da Saúde.

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