"A IL não se podia deixar guetizar em expressões como os queques que querem descontos nos impostos"
O que motivou a sua candidatura à liderança da IL? Não se revê nas outras duas candidaturas?
Sou membro do Conselho Nacional há três anos e tenho defendido um partido diferente do que temos edificado. Não me revejo em nenhuma das duas candidaturas e tinha muitos membros à minha volta a dizer que iam votar em branco pela mesma razão. Portanto, havia aqui um espaço. Outra das razões, é porque vivemos um processo de inevitabilidades num partido que é liberal, em que tudo nos é dado e garantido. Ora um partido liberal é um partido vivo, em que as pessoas debatem, se chegam à frente, eu vejo um partido que um dia tenha cinco ou seis candidatos. As nossas referências têm de ser as boas práticas liberais do norte da Europa, que temos de trazer para a IL e depois para o país.
E em que consiste essa prática?
Eu não quero fazer um partido bengala de ninguém, nem viemos para ser iguais, senão prefiro ir para casa e votar no PSD. Ou conseguimos fazer algo diferente para sermos o 3.º partido, e não numa ótica de votação, mas enraizado, presente, com poder e capacidade de decisão e isso faz-se pela prática política, que é diferente.
Ou seja, Rui Rocha e Carla Castro são faces da mesma moeda ou linha do partido?
É o que penso. Não os vi a votar um contra o outro no Conselho Nacional em três anos. Nesse período, nenhum deles agendou um único ponto para votação, nunca apresentou um único documento alternativo, enquanto eu fiz cerca de 200 ou 300 intervenções, tenho cinco ou seis ou sete pontos agendados, tenho uma infinidade de documentos alternativos apresentados. Portanto, não me sinto representado por esta inação e quase calculismo. É também importante a construção do partido como um projeto político. É preciso que seja trabalhado para além do que é o Parlamento, porque necessita de ser construído no país e chegar aos cidadãos. Isso só se consegue se houver um presidente a tempo inteiro, que esteja dedicado em exclusividade. Não me parece que seja para o papel de um deputado.
Então, se for eleito não será cabeça de lista em lado nenhum?
As eleições legislativas são só daqui a quatro anos. A IL tem de ser capaz de governar. Estes quatro anos são a oportunidade única para construir um partido em todas as suas vertentes, no conhecimento, na sua praxis, no capital humano. Quase 90% dos membros da IL nunca estiveram na política, isto faz uma grande diferença pela positiva e pela negativa. Pela positiva porque é sangue fresco, ideias frescas, gente cheia de motivação, com muita capacidade técnica porque passaram por empresas, muitos viveram lá fora, etc, mas depois têm muita iliteracia política, precisam de aprender a participar, a estarem nas assembleias e câmaras municipais, nos parlamentos, etc. Essa capacitação é o trabalho para os próximos quatro anos.
Citaçãocitacao "Temos muitos quadros dentro da IL. Onde está a nossa capacidade de movimentar esse capital humano e de fazer valer isso para o partido? Até agora zero."
Que ideias centrais destaca da sua Moção de Estratégia?
Tenho lutado muito na IL por várias coisas, entre as quais por uma descentralização, ou seja, um partido que defende a descentralização para o país tem de ser descentralizado. Outra é sobre a partilha do know how político e envolver a sociedade na construção desse know how. Mais uma vez nos últimos três anos o número de propostas nesse sentido... a Carla Castro foi responsável pelo centro de estudos da IL e durante três anos não apresentou um relatório da sua atividade, um documento para arquivo que eu pudesse consultar, e portanto, como é que vou acreditar que estas pessoas são capazes de construir um partido liberal no sentido técnico quase, descentralizado, aberto a todos, diferente do PS e PSD, se durante três anos nada fizeram. Não basta defendermos todos a liberdade de escolha na saúde. O partido também está muito preso à economia e não se podia ter deixar guetizar em expressões como o bloco de esquerda da direita, os queques, os meninos ricos da Lapa que querem descontos nos impostos. O liberalismo é do povo, se formos buscar a história e os países liberais que temos como referência é a capacitação do povo. Há outras bandeiras para trabalhar. Dou o exemplo da Justiça. Quantas empresas estão encalhadas na Justiça? Se a ideia é a do liberalismo e da liberdade máxima do indivíduo, hoje a Justiça funciona como um ataque sério à liberdade individual das pessoas.
O facto de ser conhecido dentro do partido mas quase nada fora dele não é um handicap para a sua candidatura?
O Carlos Guimarães Pinto também era completamente desconhecido e o João Cotrim Figueiredo era eventualmente conhecido aqui numa área mais empresarial do Estado, mas do povo português em geral também era completamente desconhecido.
A imagem constrói-se?
Constrói-se. Estou muito mais preocupado em construir um partido. Não gosto mesmo nada de presidencialismo. Os líderes distinguem-se por dois tipos: ou abafam tudo à sua volta para se destacarem; ou puxam todos os outros para a frente e acreditam que com isso serão maiores do que tudo o que os rodeia. Eu claramente gosto de puxar pessoas para a frente e dar-lhes relevância. A IL, naquilo que se chama capital humano, não tem sabido aproveitar o enormérrimo capital humano que existe no partido. É impressionante e extraordinário o conjunto de pessoas que ali se juntou. Temos muitos quadros dentro da IL. Onde está a nossa capacidade de movimentar esse capital humano e de fazer valer isso para o partido? Até agora zero.
Defendeu que o presidente da IL deve sair das eleições internas com maioria absoluta.
Defendo a segunda volta, que existe no PS e PSD, porque ninguém quer ter um presidente da Comissão Executiva legitimado com 30 e tal por cento dos votos. Isso dá sempre asneira. Porque senão pode entrar em crises sucessivas e é um tiro no pé. A IL está sempre a dizer que é um partido de ideias, ora não viremos um partido de calculistas.
paulasa@dn.pt