'Apocalypto' ou a sangrenta aventura de Mel Gibson entre os maias
Em A Paixão de Cristo, Mel Gibson contou a história de uma divindade que, há dois mil anos, se fez carne e osso para se sacrificar voluntariamente pelos homens. Em Apocalypto, o seu novo filme enquanto realizador, que se estreia hoje em mais de dois mil cinemas dos EUA, Gibson conta a história de um homem que, há cinco séculos, é escolhido para ser sacrificado aos deuses, rejeitando veementemente essa escolha.
Se A Paixão de Cristo era falado em aramaico para reforçar o sentido da época e frisar o cuidado da recriação histórica, Apocalypto é falado em iucateque, um dialecto maia, exactamente com as mesmas intenções. E se A Paixão de Cristo apresentava uma visão repetida e explicitamente violenta da agonia e morte de Jesus Cristo, Apocalypto pinta um retrato insistentemente brutal e sangrento da cultura maia, antes da chegada dos conquistadores espanhóis.
Interpretado por desconhecidos, quase todo rodado no México, financiado pela Icon, a produtora de Mel Gibson, e distribuído pela Walt Disney, Apocalypto tem como herói Pata de Jaguar, um jovem nativo cuja aldeia é atacada por guerreiros maias. Feito prisioneiro, Pata de Jaguar é escolhido para ser sacrificado ao deus Sol, sendo-lhe dada antes uma (cruel) oportunidade de fuga.
Gibson disse em várias entrevistas que o filme tem como tema "as civilizações e aquilo que as mina e leva à decadência", mas ao mesmo tempo pretende ainda "dar um safanão no género de acção e aventura, que está rançoso".
Por isso, e apesar de ser inspirado por textos maias ancestrais como o PopolVuh e de ter tido como consultor Richard Hansen, arqueólogo de renome mundial e especialista na cultura maia, Apocalypto é também um "filme-perseguição", na sua expressão "mais minimal e primitiva", explicou Gibson. Que além de produzir e realizar, também assinou o argumento, com Fahrad Safinia.
A crítica americana recebeu Apocalypto com elogios, na sua maioria, frisando o alto teor de "sangue e tripas" do filme, que , no entanto, "não é exagerado nem está fora de sintonia com o assunto", como escreveu a Variety.
O The New York Times especulava há dias que o recente incidente em que Gibson foi detido pela polícia alcoolizado, e fez afirmações "anti-semitas", poderá prejudicar as pretensões de Apocalypto aos Óscares, considerando o ambiente politicamente correcto e o peso do lobby judeu em Hollywood. Mas será que isso fará mossa a Gibson, se o filme atingir os astronómicos lucros de biheteira de A Paixão de Cristo?