"Sócios do ACP vão pagar mais pelos serviços que pelas quotas"
Entrevista com Carlos Barbosa, presidente do Automóvel Clube de Portugal
Disse que o Automóvel Clube de Portugal (ACP) deve tornar-se na maior empresa prestadora de serviços para os sócios. Por outro lado, acha que o valor das quotas que pagam (75 euros) já está ultrapassado e não chega para pagar as despesas do clube. Qual é a estratégia para conseguir o equilíbrio financeiro do ACP?
Quando cheguei ao clube tinha quatro milhões de contos no banco e uma gestão negativa, que, aliás, se arrastava há 15 anos. Os juros do dinheiro depositado davam apenas para tapar o défice da gestão corrente. A continuar assim, e a perder dez mil sócios por ano, como estava a acontecer, o ACP não tinha futuro. Era uma associação sem fins lucrativos de utilidade pública que se limitava a fazer assistência na estrada e não tinha capacidade para crescer. A preocupação desta direcção, mal chegou, foi dar aos sócios cada vez mais serviços e ao clube capacidade de gerar cada vez mais receitas, porque o aumento das quotas não é suficiente para pagar os custos. Só para se ter uma ideia: hoje os sócios pagam uma quota de 75 euros/ano e só um reboque custa 82 euros. Se todos utilizassem os reboques a que têm direito, o clube fechava. Assim, o que temos de fazer é arranjar novos negócios para gerar mais-valias, para, em contas consolidadas, obtermos o equilíbrio.
Quais são esses negócios?
Um deles é os seguros. Por isso, comprámos recentemente 50% da maior corretora de seguros portuguesa, a Villas Boas. O outro é o das viagens. Estamos a desenvolver a nossa agência - que antes era apenas uma secção dentro do clube - por forma a torná-la cada vez mais autónoma e lucrativa. Depois temos a parte da mobilidade e o ACP Serviços , que hoje presta assistência na estrada com um serviço que o distingue de todos os outros do mesmo género.
Que lucros dão esses negócios?
O negócio da mobilidade é um negócio de milhões que deixa ficar tostões. Tem por isso de ser muito bem gerido, porque as empresas a quem prestamos serviços querem qualidade, mas também querem esmagar-nos os preços. Nas viagens estamos a tirar cerca de 200 mil euros de lucro por ano. Nos seguros quero tirar entre dois e 2,5 milhões.
O operador móvel virtual a lançar em 2008 é outra via de fazer dinheiro....
O lançamento dos telemóveis é outro negócio que queremos que seja um pinga-pinga. E vamos ser o primeiro operador virtual. Os primeiros cartões serão lançados a 19 de Março. E porquê esta data? Porque foi neste dia que lancei o Correio da Manhã e tive sorte e porque é também o Dia do Pai.
Mas os CTT já anunciaram o lançamento de um operador virtual antes do vosso...
Não. O que eles vão fazer é pintar cartões da TMN com o nome dos CTT. Porque eles não têm clientes. São distribuidores. Nós temos clientes, temos as suas moradas e dados.
Qual o investimento do ACP neste operador?
O investimento roda os 2,5 milhões de euros. O operador de rede com quem iremos trabalhar será escolhido depois de obtermos a licença, o que deverá acontecer na próxima semana.
A saúde é outra das áreas que quer desenvolver. Como vai fazer crescer este negócio?
Temos um contrato externo com a Unimed. Mas nós temos uma capacidade de call center que é raro uma empresa ter, com uma base de dados blindada, que tem registado tudo sobre cada sócio, tipo de seguros que tem, quantas vezes utilizou cada serviço do ACP, tipo de viagens que faz , entre outras coisas. Isto é um grande valor do clube que devo aproveitar para desenvolver novos serviços. Outra coisa que vamos fazer é oferecer serviços aos sócios. Ou seja, de cada vez que um deles telefona para o ACP, quem o atende deve saber vender cada um dos serviços do clube. Vamos passar a ser reactivos em vez de ficar atrás do balcão à espera que os sócios venham procurar os nossos serviços.
E vai ou não haver novo aumento de quotas?
Todos os anos aumentamos as quotas de acordo com a inflação e fazemos arredondamentos. Contudo, só para se ter uma ideia, a quota mais barata de um clube de futebol, sem que os sócios tenham direito a nada, é de 125 euros. Mesmo este cartão dos golos que o Benfica lançou recentemente, como os jogadores não marcam golos os sócios não vão receber muito dinheiro. A minha ideia é que os sócios paguem o menos possível pelas quotas e mais pelos serviços. Para isso, vou dar-lhes cada vez mais e melhores serviços, a preços que não há no mercado. Porque também quero ter cada vez mais sócios. No cartão que iremos lançar com o operador móvel, por exemplo, vão ter imensos conteúdos. Além de todos os serviços, terão inclusivamente produtos para crianças, jovens e mulheres. Aliás, o crescimento do número de sócios deve-se à adesão cada vez maior das mulheres.
Quando conseguirá o equilíbrio financeiro?
Em termos de gestão corrente, em 2007 ainda vamos perder dinheiro. O ano zero de prejuízos em termos de exploração será 2008.
Quanto é que vai aumentar as quotas?
Depende muito dos resultados de 2007. Claro que vai haver um arredondamento das quotas, além do ajustamento à taxa de inflação, mas ficará mesmo assim abaixo dos cem euros.
"RADARES MUDAM EM ALGUNS SÍTIOS"
Tem criticado muito o Executivo relativamente à carga fiscal sobre o automóvel, na qual se inclui os impostos sobre os combustíveis. Como atenuar os custos?
Nem as petrolíferas têm qualquer poder em Portugal. O Governo põe e dispõe sobre o preço dos combustíveis. Ainda agora retirou uma parte do ISP (imposto sobre os produtos petrolíferos) para a Estradas de Portugal. Portanto, das duas uma: ou há uma greve geral de três dias em que ninguém anda de automóvel e o Estado perde milhões de receitas e aí poderá ter de repensar a carga fiscal, o que é muito difícil que aconteça; ou então os carros vão parando à força. O que, aliás, já está a acontecer. Um terço já está parado durante a semana, porque as pessoas não têm dinheiro. A redução no consumo de combustíveis e de portagens, no ano passado, já foi enorme, cerca de 7% no primeiro caso e 4% no segundo. O Estado não pode continuar a ver nos automóveis a mama de tudo o que é impostos. Neste momento, 25% da receita fiscal já vem do sector automóvel. E este novo imposto automóvel (IA) é um disparate completo. Ao fim de três anos, os consumidores pagam mais do que com o anterior imposto de circulação.
Se fosse membro do Governo como taxaria os automóveis?
O que deveria ser feito é aquilo que já se faz na maior parte dos países europeus, onde há uma taxa, por exemplo de 20% sobre o automóvel, e nela estão incluídos todos os impostos. Assim, compra um carro de 5000 contos ou de 20 mil contos e paga 20% desse valor. O que não é justo é que seja feito como cá. Eu tenho um Mercedes lá em baixo na garagem com uma determinada cilindrada e outro cidadão que compra um Renault, com igual cilindrada mas que custou um terço do meu Mercedes, paga o mesmo IA . Com uma taxa ad valorum o Estado não perdia dinheiro e era mais justo.
Que resposta obteve até agora às propostas feitas pelo ACP ao Governo no sentido da redução da carga fiscal?
Zero. Eu há três anos pedi uma audiência ao senhor primeiro-ministro e até agora não obtive qualquer resposta. Ou seja , o senhor primeiro-ministro nunca recebeu o presidente do maior clube português.
Apresentou também uma proposta de alteração relativamente à colocação de radares de velocidade em Lisboa. Entretanto já foi criada uma comissão na qual participa o ACP para discutir este assunto. Já há novidade?
Quero em primeiro lugar que fique claro que nós somos a favor dos radares, desde que seja respeitada a fórmula segurança e mobilidade. Com a actual colocação de radares não está a ser respeitada nem uma nem outra. A Marina Ferreira pôs os radares completamente à balda. Ela não pediu qualquer opinião, nem à Direcção- -Geral de Viação, nem à PSP, nem ao ACP, que nós tínhamos os estudos. Agora entregámos tudo. E é evidente que o dr. Marques Perestrello, que é uma pessoa de bom-senso, vai fazer a reposição nos sítios certos. Já temos uma segunda reunião marcada e creio que vamos tirar conclusões muito rapidamente . Vão mudar- -se radares em alguns sítios, há sítios onde simplesmente não fazem sentido e outros onde até o controlo de velocidade não deve existir. Quando se criam vias rápidas é para as pessoas se despacharem e não para ficarem presas no trânsito.
Que alterações de vulto vamos então ter?
Vamos ter mais radares em sítios perigosos, locais que agora não estão devidamente monotorizados. Porque os radares foram colocados só em sítios onde havia feixe óptico. Nos locais perigosos que não o tinham, não puseram. Tudo para não fazerem o investimento. Acha isto normal? O que vai fazer agora é recolocar os radares, para se garantir a fluidez versus segurança.
"GRUPOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL ACABARÃO VENDIDOS A ESTRANGEIROS"
Foi um dos apoiantes de Carmona Rodrigues, que não ganhou as eleições. Como é hoje a sua relação com a Câmara de Lisboa, com António Costa a presidir?
Ainda sou vereador substituto, ou seja, quando os outros faltarem todos posso sê-lo(risos). Relativamente à câmara, Marques Perestrello tem uma grande sensibilidade para as questões da segurança rodoviária, que lhe advém de cargos onde esteve anteriormente e é uma pessoa de bom-senso , com vontade de resolver os problemas da cidade. Quando ele mete à mesma mesa a Polícia Municipal, PSP, o ACP, o homem que fez a petição das 2000 assinaturas e a ACAM é porque quer ouvir e resolver o problema no sentido de ter mais mobilidade e não mais sinistralidade. É isso que eu acho importante.
Admite, um dia, poder entrar na política activa?
Isso está fora de questão. Porque não gostaria de ter de mentir.
Deixando o ACP, quer voltar à vida empresarial e ao mundo da comunicação social?
Gostaria de ter uma rádio. E estou a negociar com duas de Lisboa. Mas não sei quanto tempo vai demorar a concretizar este negócio.
Como vê hoje a comunicação social portuguesa?
Está apanhada pelos grandes grupos económico se tem como única missão vender por vender. Por isso os conteúdos estão cada vez mais pobres.
Que futuro vê então para os grandes grupos nacionais?
Vão ser vendidos a grupos estrangeiros.