"Não cometi um crime por ser accionista"

José Azevedo, accionista da Sociedade Lusa de Negócios, detentora do BPN, está preocupado com o seu investimento. Gestores da Caixa devem assumir hoje a liderança do banco.
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Em 2005, fez um investimento na Sociedade Lusa de Negócios (SLN) porque "tinha um amigo que tinha um amigo que precisava de dinheiro e queria vender as acções a 2,10 euros quando elas valiam 2,50 euros. Falei com umas pessoas e decidi comprar". Desde então, tornou-se num dos muitos proprietários do agora nacionalizado Banco Português de Negócios (BPN).

Confiou no anterior presidente, José Oliveira e Costa, e voltou a confiar no último, Miguel Cadilhe, que o convenceu pessoalmente a subscrever a primeira tranche do aumento de capital que acabou por ficar incompleto. Agora, "estou muito apreensivo com o meu dinheiro porque ainda ninguém me disse nada".
 
José Veloso Azevedo é um empresário da construção civil da região de Braga e, embora recuse dizer quanto é que tem na SLN, o DN apurou que a sua participação na sociedade ascende a quase 3%, o equivalente a cerca de 40 milhões de euros. "A saída do sr. Oliveira Costa foi uma surpresa muito grande porque, apesar de ter falado pouco com ele, tinha e ainda tenho as melhores impressões sobre a pessoa." No entanto, "ainda ninguém me explicou porque é que ele saiu".
 
Depois do período de Abdool Karim Vakil, chegou ao banco Miguel Cadilhe, "uma pessoa que tenho como muito séria, que me inspirou confiança e que compreendo que tenha perdido o controlo". Agora, "queria saber onde está o meu dinheiro do aumento de capital que saiu direitinho da minha conta para a do BPN". José Veloso Azevedo não será o único accionista preocupado com a nacionalização, promulgada ontem por Cavaco Silva, Presidente da República. A nova administração deve assumir amanhã a gestão do banco.

Almiro de Jesus Silva e o ex-presidente do BPN Oliveira e Costa seguem-se na lista dos maiores accionista individuais da SLN. Uma lista liderada pela SLN Valor SGPS, seguida da Urbigarde, uma empresa imobiliária, cujo presidente da administração era, até Abril deste ano, o próprio Oliveira e Costa. Em Julho, Alberto Figueiredo, também accionista individual da SLN, assumiu a presidência.

Ao DN, José Veloso Azevedo sublinha ainda que "nunca tive qualquer lugar de gestão e até recusei um convite do sr. Queiroga Figueiredo para ser membro do conselho superior", acrescentando que "não desconfiei de absolutamente nada e aí talvez tenha sido enganado pela omissão".
 
Como tal, não esconde alguma revolta: "Raramente me engano e das poucas vezes que fui a Lisboa para as assembleias gerais, parecia-me tudo bem. Eu só tenho a quarta classe e via todos aqueles doutores a acenar com a cabeça, a aprovar tudo por unanimidade. [Se havia tantos problemas] ninguém questionava nada?" Com alguma mágoa , desabafa: "Se sonhasse que isto ia acontecer, nunca teria comprado ao preço que comprei." Nem sempre o sonho comanda a vida.

Um mistério de empresas e mais empresas

As garagens onde o BPN teria guardado documentos confidenciais estão em nome de uma imobiliária chamada Bamart. Por sua vez, esta é uma sociedade por quotas, divida entre duas empresas: Valle Flor SGPS e a Sociedade Agrícola Valle Flor. Nos registos desta última, surge como vogal Luís Miguel Reis de Almeida.

Um nome que aparece no Relatório e Conta do BPN de 2001 como o técnico oficial de contas da instituição. É uma intrincada rede de empresas em cima de empresas que os investigadores da "Operação Furacão" estão a tentar desfiar até ao ponto de partida. Neste caso em particular, há uma advogada constituída arguida no processo que chegou a ser gerente da Bamart.

Esta empresa imobiliária tem quatro garagens no Condomínio Espelhos do Tejo, no Parque das Nações, em Lisboa. Foi aqui que, na semana passada, a equipa da "Operação Furacão" recolheu muita documentação. Ainda assim, um advogado ligado ao caso disse ao DN que as garagens apenas funcionavam como arquivo morto do banco. Logo, os documentos apreendidos não terão muito interesse para a investigação.

Ontem, o procurador-geral da República, Pinto Monteiro, revelou que existem quatro processo relacionados com o BPN. Dois resultam da "Operação Furacão", os restante de queixas--crime: uma de Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, e outra de Miguel Cadilhe, ex-presidente do BPN. Pinto Monteiro disse ainda que o Ministério Público, no dia seguinte a ter recebido a queixa de Vítor Constâncio, começou a fazer diligências, isto é, a ouvir pessoas e a apreender documentos. O PGR só não concretizou que tipo de crimes é que podem estar em causa.

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