"Gosto de filmes de violência gratuita"
O Grande Prémio do Júri que ganhou em Cannes não tem para si um cheiro a Palma de Ouro, sobretudo por ter sido num ano em que o vencedor do festival foi Fahrenheit 9/11, um documentário com agenda política? Na prática, Oldboy-Velho Amigo foi a ficção triunfadora do festival.
Muita gente vem com essa conversa e sinto que me estão a consolar... Ainda assim, nunca vi o filme de Michael Moore. Por isso, não posso falar.
Por que razão o público ocidental tem reagido de forma diferente ao seu filme? De alguma forma parece que na Europa os espectadores ficam mais chocados...
Não sei bem a razão para tal fenómeno. Na Coreia, Oldboy-Velho Amigo foi um grande sucesso de bilheteira, sobretudo porque muitos espectadores viram o filme bastantes vezes. E transformou-se em fita de culto.
Tem filmado incessantemente o tema da vingança. O filme que está agora a acabar é também sobre a vingança. Trata-se de uma obsessão?
Podemos dizer que estou a fazer uma trilogia sobre a vingança. Mas é um tema que encontramos em todo o lado. Vem desde a mitologia mais remota... E outras histórias mais actuais também abordam o mesmo, veja-se Guerra das Estrelas. A vingança aproxima as pessoas e fá-las reagir. É algo que nos obriga a agir, a avançar. Todavia, não estou obcecado com a vingança, apenas com histórias que abordem o tema.
E como enquadra a questão da moralidade nessas histórias?
Não quero saber muito disso. Hoje em dia no cinema comercial há a ideia de que a questão da moral é uma coisa antiquada.
Considera-se um cineasta de extremos?
Sim, sou um cineasta radical. Tento sempre filmar histórias de extremos da forma mais extrema possível. Mesmo se fizesse uma história de amor teria de ser filmada do modo mais extremo. Até o plateau dos meus filmes é caótico, com os técnicos a beber, a falar - sobretudo sobre mulheres - e a comer.
Por ser tão bem sucedido na Coreia do Sul sente que é obrigado a carregar algum tipo de responsabilidade social?
Não muito como cineasta, talvez mais como cidadão. Faço parte do Partido Trabalhador Democrata e participei activamente nas últimas eleições, tendo até realizado campanhas televisivas. E fui a manifestações de protesto contra a presença do meu país no Iraque. Enfim, tenho esse lado de cidadão responsável...
Por ter realizado filmes de campanha eleitoral, deduz-se que gosta de manipular com as imagens...
Os meus filmes não são feitos com esse propósito. O que gosto é de colocar questões. Gosto de confrontar o capitalismo e o sistema.
Quando filmou a cena em que a personagem principal de Oldboy-Velho Amigo come um polvo vivo estava consciente do seu impacto nas plateias ocidentais?
Pensei nisso, mas garanto-lhe que não foi por isso que escolhi mostrá-la. Mesmo entre os coreanos há muita gente que não é capaz de comer polvo daquela maneira. Normalmente, cortamos em pequenos bocados o polvo vivo antes de o comermos. Sinceramente, intriga-me também esse sururu pois na Europa toda a gente come ostras cruas. Há muita conversa sobre o facto de os coreanos comerem carne de cão, mas também há quem fique espantado quando descobre que na Europa as pessoas comem foie-gras. Faz-me impressão pensar que criam gansos apenas para que depois sejam mortos! Parece-me cruel. Já agora, gosto de foie-gras...
O que pensa da violência gratuita que se vê em alguns filmes actualmente?
Os meus filmes não têm essa violência, mas gosto mesmo muito de ver filmes com violência gratuita. Adoro os filmes série B do velho cinema italiano, em especial o seu humor cruel.