"Agrilhoados" na mira do Ministério Público

Publicado a
Atualizado a

"Tortura ou tratamentos desumanos e cruéis", disse Cândida Almeida, chefe do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) do Ministério Público (MP), a propósito do anúncio anteontem da abertura de um inquérito aberto aos chamados voos da CIA.

E isto tem tradução: o que o DCIAP averigua, para já, são, por exemplo, os "agrilhoados" da base das Lajes denunciados pela eurodeputada socialista Ana Gomes. Ou seja: se, no âmbito dos chamados voos da CIA, houve ou não, em território português, maus tratos ou tortura, de prisioneiros transportados nesses voos.

Ana Gomes afirmou ter ouvido nos Açores testemunhos que diziam ter visto prisioneiros deslocando-se "agrilhoados" na base das Lajes. E o jornalista Micael Pereira escreveu no Expresso, citando fontes não reveladas, sobre a existência de um suspeito pavilhão naquela base (o chamado "pavilhão da Navy") para onde teriam sido transportados prisioneiros. O trabalho do DCIAP parte também de uma participação apresentada ao procurador-geral da República pelo jornalista da Visão Rui Costa Pinto.

A investigação passará, portanto, por garantir, num primeiro momento, se passaram ou não por Portugal prisioneiros dos voos da CIA; e, depois, caso se confirme essa passagem, se foram ou não sujeitos a "tortura ou tratamentos desumanos e cruéis". Isto tanto do ponto de vista do direito interno como das convenções internacionais subscritas por Portugal (e que, por isso, são também direito interno). Poderá envolver, por exemplo, em função da prova que vier a ser obtida, a necessidade de desclassificar documentos nacionais actualmente secretos.

Ontem o ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, fez saber que esperava que o inquérito anunciado pelo DCIAP esclarecesse "todas as dúvidas". "O ministro espera que se esclareçam todas as dúvidas e garante toda a colaboração, tal como tem sido feito até aqui", disse à Lusa uma fonte do seu gabinete.

No dia 16, Amado será ouvido no Parlamento. A audição, requerida pelo Bloco, decorrerá numa reunião conjunta das comissões de Assuntos Constitucionais e dos Negócios Estrangeiros. Amado já se declarou "disponível para prestar todos os esclarecimentos necessários aos deputados". Também Carlos Coelho, presidente da comissão temporária do Parlamento Europeu, saudou a iniciativa do MP, dada a necessidade, no seu entender, de averiguar "o que ainda não está claro, as brumas, as zonas cinzentas".

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt