Na recepção, as plantas do recinto em braille ao lado dos folhetos em papel couché colorido indiciam que este é um evento diferente. Na Feira das Capacidades, que a Moita acolhe até domingo, a palavra-chave é acessibilidade os invisuais podem escutar o livro mágico, os surdos viram um relato de futebol na rádio através da Internet. A solução para as incapacidades é como o recinto desta feira: está aberta a todos. Basta querer..No estádio, 35 mil espectadores, as equipas do Sporting e do Newcastle, Fernando Correia, comentador da TSF. Na Fundação para Computação Científica Nacional, os dois intérpretes preparam-se para o primeiro relato de futebol em língua gestual, que ia ser difundido na Web. Na sala Internet do pavilhão municipal de exposições da Moita, os computadores estão ligados em www.capacidades.org.pt. O jogo vai começar. .Um grupo da delegação de Setúbal da Associação Portuguesa de Surdos chega à feira. Gesticulam, fazem poesia com as mãos. Estão animados. Conhecem o brasileiro Sérgio e procuram entender-se. É que a língua gestual é como o português ou o inglês varia de país para país, explica Jorge Albuquerque, intérprete da Associação de Língua Gestual Portuguesa. .Enquanto se apresentam, José Conceição, que acompanha o grupo, traduz "a língua gestual tem muito de estenografia". Um gesto ou uma expressão resumem uma ideia.Por exemplo, o nome de uma pessoa é construído com uma característica física dominante - é gordo, usa óculos, tem o pescoço grande... - e a inicial do nome. A expressão facial é fundamental e ajuda a passar a mensagem e uma cara feia nem sempre traduz um estado de espírito... .Nos computadores segue o futebol jogado, depressa, com as mãos. Sérgio aproxima o olhar do ecrã e franze o sobrolho no lance entre Ricardo e Ameobi, mas logo se perde na conversa. Por haver apenas um sportinguista no grupo ou porque a feira estava cheia de atractivos, o relato em língua gestual não cativou. Mas isso não é o mais importante, realça Sónia Vaz, da Câmara Municipal da Moita. O que interessa é este tipo de informação estar disponível. A comunidade surda utiliza muito a Internet e quando não sabem ler ou escrever, iniciativas como a rádio na Net ou as webcams são preciosas para poderem comunicar entre si. .Na sala Internet prossegue a algazarra. Rogério, o mais velho do grupo, puxa-me a manga. Quer conversa mas não dominamos os mesmos códigos. Tirou um pequeno papel, dobrado em quatro à medida do bolso da camisa, e de uma caneta. Escreveu "Eu antigo". Apontou para os jovens em frente ao computador e escreveu: "novos". Fez um dedilhar. "Eles são novos, tu és velho e não sabes trabalhar no computador?", descodifiquei. Riu-se. "Escrevo", lançou neste Pictionary improvisado.