Incêndios florestais vão deixar de ser problema exclusivo da Europa do Sul
Paulo Barbosa
Investigador
Investigador português, Paulo Barbosa está agora à frente do EFFIS, sistema europeu que avalia os fogos florestais na Europa, através de mapas de risco e cartografia de áreas ardidas. Este ano, assinala, há mudanças "interessantes" na Europa do Norte, em países que tradicionalmente não conheciam o drama dos incêndios. Sinais, alerta, de que o cenário de risco está a mudar, talvez devido às alterações climáticas.
As alterações climáticas podem vir a alterar o cenário que conhecemos hoje em termos de incêndios florestais?
Este ano, observámos muitas dificuldades na Europa do Norte, onde tradicionalmente os incêndios florestais não são problema. A Suécia teve um incêndio de grande magnitude, com mais de mil hectares ardidos, o que é raríssimo. Foi, aliás, o maior dos últimos 30 anos, altura a partir da qual temos registos. Mas houve também incêndios na Rússia, que se propagaram à Finlândia. A Primavera foi ainda difícil na Holanda, onde houve um fogo de cem hectares, o que é completamente fora do comum. E registaram-se também muitos incêndios de vegetação na Irlanda e Reino Unido.
O que significa este conjunto de situações anómalas?
Que o contexto dos países de risco em termos de fogos florestais está a mudar, possivelmente em virtude das alterações climáticas. Pode ser que este problema dos incêndios deixe de ser visto, como até agora, como sendo quase exclusivamente da Europa do Sul. Deste ponto de vista, este foi um ano interessante.
E como se explica que tenha havido este Verão, em Portugal, menos incêndios que em anos anteriores?
Tivemos menos incêndios e menos área ardida. Até Julho, o perigo de incêndio em Portugal não foi muito alto. Contudo, no início de Agosto, as condições meteorológicas alteraram-se radicalmente e tivemos então um risco comparável ao de anos dramáticos como 2003 e 2005. O que explica tantos incêndios nesse período. Mas a área ardida foi relativamente menor.
Como se explica isto? Por um combate mais eficiente?
A sensação que tenho, tendo seguido os acontecimentos em Portugal, é que houve uma mudança a nível do combate. A situação deste ano pode levar-nos a pensar que houve um combate às chamas mais eficiente porque, perante condições tão más, a área ardida não foi levada ao extremo de anos anteriores.
Mas este ano não houve também a seca de 2005.
Não houve, de facto, um período de seca acumulado e nesse aspecto as condições não são comparáveis às do ano passado. Mas, nesse aspecto, 2005 foi mesmo pior que 2003, apesar de esse ter sido um ano com mais área ardida.
Uma das componentes dos vosso projecto são os mapas de risco. Qual é a sua utilidade?
O seu objectivo é ajudar as entidades responsáveis pelo combate, fornecendo uma informação apriori das condições de risco. Embora haja países a produzir previsões comparáveis às nossas, isso não é verdade para os 25 da União Europeia, nomeadamente nos que não têm este problema. E mesmo nos casos dos Estados membros mais avançados, o sistema tem a vantagem de dar informação sobre outros. Por exemplo, os dados sobre Espanha permitem às autoridades portuguesas saber quais são as condições nas zonas fronteiriças. E isso é importante porque há muitos incêndios que passam de um lado para outro.
E também permite comparar a situação entre países...
O nosso objectivo é ter informação harmonizada a nível europeu, que possa comparar países. Podemos analisar a evolução em termos de prevenção, de tempo médio de chegada após o alerta, de causas ou de combate - retirar lições que se podem disponibilizar aos outros países. É importante que, a médio prazo, esta informação esteja em bases de dados, que possam ajudar nas tomadas de decisão política na União Europeia, a nível, por exemplo, de financiamentos, ajuda ou prevenção. Sem este suporte de informação harmonizada, é muito difícil tomar decisões de nível transnacional.