As contas, diz ao DN Luísa Salgueiro, presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), “são simples” de fazer: “308 municípios que todos os dias praticam, cada um deles, centenas de atos administrativos, que dizem diretamente respeito à vida das pessoas. Isso acontece com deputados ou ministros? Todos os municípios têm um canal [online] onde se recebem denúncias dos cidadãos sobre todos os atos administrativos, até sobre atendimentos. Isso acontece com deputados ou ministros? É importante que se saiba disto.”.A conclusão? “As pessoas mais facilmente denunciam um fiscal da câmara, ou um chefe de divisão, ou outro qualquer funcionário do que um membro de gabinete de um ministro, que nem sabem quem é, nem o que faz.” Explicação também “simples”, acrescenta, porque “somos o nível mais próximo das pessoas e que mais atos pratica na relação direta com o cidadão”..As declarações da ministra da Justiça, de que “parte significativa das denúncias de corrupção” [48,5%] residem nas autarquias, merecem, por isso, de Luísa Salgueiro a “constatação” de que “não se pode comparar o incomparável”, dado que “um autarca pratica, por dia, centenas de atos administrativos, um ministro não pratica atos administrativos com impacto na vida das pessoas e um deputado muito menos”..Outro reparo: o que foi anunciado para colmatar a Inspeção-Geral da Administração Local extinta durante a troika e, desde então, substituída na fiscalização das autarquias pela Inspeção-Geral das Finanças, é “aquilo que reivindicamos há muito tempo, que já dissemos ao anterior Governo e ao atual”..“Há muito que a ANMP defende a entrada em funcionamento de uma entidade que fiscalize em permanência, que escrutine, que verifique o cumprimento de todas as regras. Uma entidade com competências, com pessoas habilitadas que dominem o funcionamento das Autarquias Locais, que possa verificar o escrupuloso cumprimento de todas as regras a que os municípios estão obrigados”, sublinha..Daí que, acentua, vá ser assinado, no dia 17, “um protocolo de cooperação com o Mecanismo Nacional Anticorrupção (Menac) com o objetivo de apoiar os municípios na adoção de medidas destinadas a fomentar a transparência, a integridade e a prevenção da corrupção e infrações conexas”, e que, no último Congresso da ANMP, no ano passado, os autarcas tenham pedido a “criação de uma entidade inspetiva exclusivamente dedicada às Autarquias Locais” - “lacuna” para a qual o Governo está a “ponderar alternativas”, como garantiu a ministra da Justiça..Rita Júdice admite a ponderação de três cenários: a criação de uma unidade na Inspeção-Geral das Finanças “dedicado exclusivamente às autarquias”, “criar uma entidade nova” ou “atribuir essa função a uma entidade que já exista”. E, ainda sem saber do modelo definitivo, a ministra veio já assegurar que “esta medida não é contra os autarcas, nem contra os funcionários autárquicos, nem contra os munícipes”..Luísa Salgueiro não aceita que a ideia de “propensão” do fenómeno da corrupção seja associado aos autarcas. “Seria inadmissível, uma ofensa”, avisa..Outra proposta, ontem anunciada, mas já com data - para 31 de janeiro -, é a “criação de um novo mecanismo de confisco de bens, em linha com a recente diretiva da União Europeia” e sem problemas de inconstitucionalidade, tal como tinha sido anunciado em junho..Apesar da polémica gerada com a proposta, na verdade o “confisco de bens” já existe no quadro legal e até já foi objeto de análise por parte do Tribunal Constitucional.