A língua portuguesa e o desfile na Avenida da Liberdade

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O desfile na Avenida da Liberdade na passada quinta-feira, dia 25, constituiu um bálsamo para combater algum desânimo que por aqui se instalara nos últimos meses e um forte incentivo para aqui continuar a falar do poder das línguas e do poder dos seus falantes. É difícil não interpretar o desfile na Avenida da Liberdade uma metáfora do caminho percorrido pela língua portuguesa nos últimos 50 anos, tantos são os pontos que um e outra têm em comum!

Tal como o mar de gente que irrompeu pela Avenida foi engrossando ao longo do seu percurso, também a língua portuguesa cresceu e se revigorou nos últimos 50 anos, alimentada pelas torrentes de falantes que, por vontade própria, decidiram adotá-la como símbolo da sua nova identidade.

Tal como a massa de pessoas no desfile constituiu um mosaico espontâneo, desalinhado e colorido de criatividade, entusiasmo e júbilo, também a língua portuguesa se engrandeceu e coloriu ao ser falada por tanta gente espalhada pelo mundo inteiro e ao conviver com tantas culturas e línguas diferentes.

Tal como pessoas tão diversas - na cor, nas crenças, nos sentimentos, nos desejos - se sentiram irmanadas pelo amor à liberdade, também os povos que falam a língua portuguesa se sentem unidos, irmãos, membros de uma prole que aspira à liberdade e à tranquilidade.

Tal como os que descemos a Avenida da Liberdade fomos felizes na comunhão de vozes, desejos e aspirações, também a língua portuguesa vive e rejubila na comunhão das diferenças entre todos aqueles que a falam e dela fazem sua.

Tal como os tantos jovens que desfilaram na Avenida nos trouxeram a certeza da sua determinação em manter os ideais de Abril e as liberdades conquistadas, também os tantos jovens que falam a língua portuguesa por esse mundo e dela fazem sua nos garantem que a farão viver e desabrochar sem correntes nem grilhetas.

Tal como o desfile da Avenida mostrou, com exuberância, o quanto amamos a liberdade e estamos dispostos a lutar por ela, também a língua portuguesa tem a capacidade de demonstrar ao mundo que uma língua não cresce pela afirmação e exercício do poder, mas pela vontade de criar uma comunidade mais ampla, abrangente e diversificada.

Tal como a democracia que foi defendida e proclamada na Avenida da Liberdade é imperfeita, incompleta e precisa de cuidados, alimento e atenção permanentes, também a língua precisa do nosso cultivo, da nossa compreensão, do nosso respeito, do nosso investimento e da nossa dedicação.

Tal como as ameaças, o ódio e os prenúncios de desgraça não intimidaram todos aqueles que, de cravo ao peito, em punho ou enfeitando os cabelos, decidiram dizer “Presente!” e manifestar a sua vontade, também a língua portuguesa será capaz de resistir a bravatas bolorentas e cheias de azedume, nacionalismos bacocos e saudosismos tão tristes quanto inúteis.

Tal como a multidão na Avenida demonstrou que o 25 de Abril não existe apenas em paredes, placas comemorativas e armários fechados a sete chaves, também a língua portuguesa está dispersa e em toda a parte ganhará raízes e espaço no coração dos seus falantes.

A língua portuguesa é um cravo vermelho que se manterá vigoroso enquanto se mantiver uma aliada da liberdade, da democracia e da paz. Todos temos o dever de contribuir para isto.

Viva o 25 de Abril! Viva a língua portuguesa! Viva a liberdade!

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