O Orçamento otimista e o diabo escondido nos detalhes

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O Governo apresentou ontem a proposta de Orçamento do Estado para 2025, após longas semanas de negociação com o PS. O documento entregue na Assembleia na República não traz grandes surpresas face ao que já tinha sido avançado, sendo de esperar que, apesar da dramatização - mais intensa do que o habitual, dado o contexto de um governo minoritário -, seja aprovado na generalidade. O Governo fez cedências ao PS a vários níveis e Pedro Nuno Santos terá muita dificuldade em justificar o chumbo do Orçamento, mesmo perante o seu próprio aparelho partidário. O líder do PS caiu no erro de acreditar que o IRS Jovem e o IRC eram as grandes bandeiras do Governo. Até que - surpresa - Montenegro deixou cair, em grande medida, esses temas, e o PS ficou sem argumentos de relevo para tentar justificar a sua eventual oposição ao Orçamento e atirar o Governo para os braços de Ventura. Em suma, Montenegro definiu o campo de batalha, Pedro Nuno foi atrás e acabou flanqueado pela esquerda. Foi quase xeque-mate, em termos políticos. E o Chega, que de irrevogável só tem tido o constante ziguezaguear - já Heráclito dizia que a mudança é a única constante no universo -, não fará grande diferença, a menos que Pedro Nuno abra a caixa de Pandora e arrisque chumbar o Orçamento sem um motivo compreensível.

Em linhas gerais, não podemos dizer que este Orçamento é fruto de pessimismo. Os impostos descem para as empresas e as famílias, enquanto a despesa aumenta de forma significativa, com reforços na saúde, na educação e nas forças de segurança, entre outras áreas. Ainda assim, o Governo diz que será possível atingir um excedente de 0,3% no próximo ano, tal como acordado com Bruxelas. Em poucas palavras, o Executivo acredita que a economia vai continuar a crescer acima de 2% nos próximos anos, se entretanto não ocorrer um choque externo de grande magnitude. E está convicto de que, a manter-se este contexto favorável, será possível manter o equilíbrio das contas públicas, com o terceiro excedente orçamental da história da democracia portuguesa.

É sabido que nenhum plano sobrevive ao primeiro contacto com a realidade e que o diabo costuma estar escondido nos detalhes. O tempo dirá se as previsões do Executivo no contexto do OE2025 são ou não excessivamente otimistas. Mas o contexto macroeconómico, com o Governo a prever um crescimento de 2,1% - em linha com o Banco de Portugal, mas abaixo do CFP (2,4%) e do FMI (2,3%) - não é o único fator de incerteza. Miranda Sarmento afirmou ontem que não há margem para negociação na especialidade, devido à necessidade de manter o excedente de 0,3% prometido à Comissão Europeia, mas, muito provavelmente, o Orçamento que entrará em vigor será bastante diferente, em várias áreas, daquele que ontem foi apresentado. A Oposição terá oportunidade de introduzir alterações na especialidade e vamos assistir nessa altura a uma segunda temporada da “novela orçamental”. Uma novela para a qual muitos já não têm paciência, tal como revela o barómetro da Aximage para o DN, que publicámos esta semana. 

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