Muitos habitantes da cidade de Lisboa desconhecem que, por detrás de um elevado número de situações comuns do dia a dia, há uma quantidade substancial de tecnologia praticamente invisível. São disso exemplo os sensores que, espalhados pela cidade, permitem aos serviços municipais atuar de acordo com os dados recolhidos, nomeadamente na medição da qualidade do ar, da meteorologia e do ruído, ou a partir dos sensores de inundação, da rede de rega, da qualidade da água, entre outros. .É a partir deste conjunto de dados e de uma boa dose de ferramentas analíticas, entre as quais cada vez mais a Inteligência Artificial (IA), que são tomadas decisões e adequadas as estratégias que vão ao encontro das necessidades. Outros exemplos, como a identificação de grafitti através do reconhecimento em fotografias, a aplicação de algoritmos para previsão do estado do tráfego ou a utilização de redes neuronais para a identificação de coberturas verdes a partir de fotografias aéreas, ilustram situações que já hoje tiram partido do potencial da IA. “Estas técnicas têm sido também amplamente aplicadas aos dados dos dispositivos móveis para detetar e prever padrões de mobilidade interna e dos movimentos pendulares na cidade”, explica Célia Aguiar, diretora do Centro de Gestão e Inteligência Urbana de Lisboa (LxDataLab). .Foram provavelmente muitos destes projetos que valeram a sexta posição europeia alcançada pela capital no ranking elaborado pela ProptechOS, uma empresa sueca especializada em software para cidades inteligentes. Segundo esta análise, divulgada já este ano, Lisboa é uma das cidades da Europa mais bem preparadas para o futuro, tendo obtido uma pontuação de 63,3 pontos (de um total de 100). Paris lidera o ranking, seguida de Londres, Amesterdão, Berlim e Madrid..Apesar de ter recuado uma posição face a 2023, a capital portuguesa subiu 3,5 pontos na avaliação de um conjunto de critérios relacionados com a gestão tecnológica das cidades. O estudo recorre a 16 métricas integradas nos critérios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para avaliar as cidades, agrupadas em três categorias: infraestrutura e conectividade tecnológica, infraestrutura verde e mercado de trabalho tecnológico, na qual Lisboa consegue o primeiro lugar, a par com Paris, e com 89,1 pontos. .Nesta categoria, a capital foi avaliada pelo número de postos de trabalho na área da tecnologia, quer a nível absoluto como por cada 100 mil habitantes, onde atingiu 130 face a Paris, com 62. A quantidade de trabalhadores remotos e de nómadas digitais, bem como a presença em Portugal de vários centros tecnológicos que prestam serviços globais a partir da cidade, contribuem para os resultados alcançados. De acordo com o estudo, Lisboa possui um dos números mais elevados do mundo de programadores e de engenheiros per capita..Colaboração com academia é determinante.Mas para que a tecnologia consiga contribuir para uma gestão cada vez mais eficiente da cidade, a parceria com o mundo académico é essencial. O LxDataLab, integrado no Centro de Gestão e Inteligência Urbana da Câmara Municipal de Lisboa (CML), tem como objetivo promover sinergias entre a academia e o município com vista a potenciar uma melhoria na qualidade dos serviços prestados aos munícipes. “Tirando partido do conhecimento detido pelas universidades e instituições ligadas ao ensino, são desenvolvidas soluções de analítica e visualização de dados para responder a problemas concretos da cidade e otimizar o seu funcionamento”, sublinha Célia Aguiar. .No fundo, o objetivo dos trabalhos desenvolvidos no LxDataLab passa por testar e desenvolver protótipos de soluções que possam vir a ser desenvolvidas e implementadas nos serviços municipais proponentes dos desafios ou noutros cujas soluções possam interessar..Desde 2019, o município já lançou mais de 30 desafios aos seus parceiros, em busca de soluções inovadoras, mas, segundo a CML, o grande desafio é a implementação dos protótipos desenvolvidos. Para fazê-lo seria necessário alocar recursos (humanos e materiais) especificamente com este propósito, uma competência que extravasa a vocação do LxDataLab. “Tentamos, no entanto, promover a relação estreita entre os serviços promotores e os participantes, por forma que as soluções em desenvolvimento se adequem às suas necessidades e que, se houver interesse de ambas as partes, possam avançar para a fase seguinte”, explica a responsável. .O trabalho colaborativo entre o município e as universidades permite aliar o conhecimento académico à experiência “do terreno” e aplicar as tecnologias de analítica e de visualização mais avançadas aos problemas quotidianos da cidade e à sua gestão operacional e planeamento. Por outro lado, permite às universidades o acesso a dados reais e atuais da cidade..O desafio é contínuo e a inovação o ingrediente principal para construir uma cidade inteligente, centrada na melhoria da qualidade de vida e na sustentabilidade. A par com os projetos em curso, por agora a CML está a definir a Estratégia Lisboa Inteligente 2030, “um processo de construção participado envolvendo todos os serviços e empresas municipais, a academia e ouvindo peritos na área, assente em três eixos: pessoas, organização e cidade”, revela Célia Aguiar. Este será, diz a responsável, um documento orientador, assente num plano de ação composto por medidas com impacto na cidade, “mas também por outras que contribuam para a eficiência dos serviços municipais, consolidando a ideia de Lisboa como uma plataforma assente numa governança centralizada dos dados e dos sistemas de inteligência urbana”.