Nicolau Santos: "Não é seguro que a RTP não entre no vermelho e que não existam ondas de choque na paz social"
O fim da publicidade comercial na RTP, que terá um impacto de sete milhões de euros já no próximo ano, pode levar as contas da empresa aos prejuízos, alertou o presidente do conselho de administração. "A RTP não é uma empresa que cause problemas e preocupações ao Estado, há 14 anos que tem resultados positivos. Não é seguro que a RTP não entre no vermelho", avisou esta quarta-feira, 16, Nicolau Santos.
Recorde-se que no ano passado a RTP registou receitas de 235 milhões de euros e lucros de 2,5 milhões de euros, prevendo atingir receitas de 233 milhões de euros em 2024.
"No ano passado houve três grupos de media em Portugal com resultados positivos. A concretizar-se esta medida, em 2025, provavelmente, só haverá dois", reiterou na comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto em resposta aos deputados na audição sobre Plano de Ação para os Media anunciado na semana passada, no âmbito dos requerimentos dos grupos parlamentares do Bloco de Esquerda (BE), PCP, PS, Chega e do Livre
Nicolau Santos assumiu que o travão do Governo, que dita o fim da publicidade comercial nas grelhas da RTP até 2027 - atualmente de seis minutos por hora, implementando uma redução de dois minutos por hora em 2025 e 2026 - irá "fragilizar a empresa" e que os impactos não serão apenas económicos. "Nos últimos anos houve paz social, [e esta medida] pode colocá-la em causa e causar ondas de choque",alertou.
O responsável referiu que o operador de serviço público está a "tentar encontrar" outras vias de financiamento além da contribuição audiovisual (CAV) através dos meios de streaming e digitais, mas frisou que o encaixe financeiro é ainda residual. "No digital captamos um milhão de euros [em receitas comerciais], não é comparável [aos sete milhões de euros provenientes da televisão]", elucidou.
O presidente da RTP acredita ainda que o fim da publicidade nas grelhas da televisão pública não irá transitar para os outros canais generalistas, mas sim para as plataformas digitais. "O setor da comunicação social está a passar por uma situação muito difícil. Se há uma falha de mercado, o Governo tem de intervir. O corte de publicidade na RTP é anunciado com a ideia de que estes 20 milhões de euros que a RTP deixará de ter serão transferidos para os orçamentos dos privados. Não é o que nos diz a experiência internacional, as indicações vão no sentido de que estas receitas migram para as grandes plataformas internacionais. Há 15 anos a publicidade para as televisões era 375 milhões de euros e hoje são de 200 milhões, é uma quebra de 47%. Este drama não será resolvido se a RTP deixar de ter publicidade", avisou.
Nicolau Santos sublinhou também a "abertura" do ministro dos Assuntos Parlamentares para debater eventuais alternativas ao financiamento da RTP e disse esperar sentar-se à mesa com Pedro Duarte "em breve". Ainda sem propostas concretas no centro das negociações, o presidente da RTP deu o exemplo das congéneres europeias e socorreu-se de exemplos em que os Estados financiam diretamente o serviço público de rádio e televisão. "Não nos importamos de não ter publicidade se, como a RTVE [Espanha], tivermos 1100 milhões de euros de apoios públicos. Se tivermos uma compensação deste ponto de vista, seria suficiente", sugeriu.
Sobre as conversações com a tutela, a propósito do Plano de Ação para os Media e das medidas destinadas à RTP, o presidente referiu que o conselho de administração endereçou uma contraproposta ao Governo sugerindo o aumento da CAV, a redução da publicidade em detrimento do corte definitivo e o pagamento da dívida do Estado à RTP no valor de 14 milhões de euros, conforme avançou o DN.
Também a presidente do Conselho de Opinião da RTP, que foi ouvida esta manhã na mesma comissão parlamentar, destacou que a publicidade "é muito importante" para a RTP. "Não somos favoráveis à retirada da publicidade de nenhum minuto, precisamos não só de reforçar mas de encontrar também novas formas de financiamento", vincou Deolinda Machado.