Língua Portuguesa e os desafios da Inteligência Artificial

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Na abertura da Web Summit que encheu Lisboa na última semana, o primeiro- ministro de Portugal anunciou que vai ser lançado, no primeiro trimestre do próximo ano, um “grande modelo de linguagem” em português. Como sabemos estes modelos são os sistemas por detrás dos modelos de Inteligência Artificial (IA), como o ChatGPT.

Também na última Cimeira Luso-Espanhola, os dois países comprometeram-se a reforçar a colaboração em computação avançada, através da criação de uma “Fábrica de Inteligência Artificial Ibérica” para “fortalecer os ecossistemas de inovação e promover o crescimento económico, envolvendo empresas, em especial PMEs e start-ups, universidades, centros de investigação e utilizadores finais, providenciando acesso a serviços de computação avançada orientados para a inteligência artificial e atraindo talentos para a utilização dessas infraestruturas e ferramentas”.

Como concretização deste objetivo, Espanha e Portugal apresentaram à Comissão Europeia uma das sete propostas de fábricas para a criação de modelos de IA generativa para aplicações em domínios-chave como saúde ou energia.

São notícias positivas a que se junta o Plano Brasileiro de Inteligência Artificial (2024-2028), anunciado em final de julho, com um investimento de 23 mil milhões de reais, tendo como objetivo a melhoria dos serviços públicos.

São conhecidos os investimentos estratosféricos dos EUA ou da China em IA, com claros benefícios internacionais para as respetivas línguas, mas as parcerias, nomeadamente entre línguas próximas como o português e o espanhol, podem ser uma importante estratégia num contexto em que a IA terá um impacto determinante nas novas economias.

Está sobejamente estudada a relação entre línguas e geopolítica, bem como os benefícios de partilhar uma língua global como é o caso do português. Mas, atualmente, uma língua global não se define apenas pelo número de falantes, o número de continentes em que é língua oficial ou os recursos naturais desses países. Todos estes indicadores são muito favoráveis ao posicionamento internacional do português, mas os desafios neste mundo contemporâneo implicam um idioma tecnologicamente avançado, virado para a inovação e com uma produção científica relevante.

Neste contexto, uma estratégia de IA para o português implica uma cooperação alargada (incluindo outras línguas) e também uma coerência de políticas.

Nos últimos anos, tem havido um trabalho colaborativo em torno da reflexão e ação sobre o português no espaço digital. É urgente dispormos de indicadores e investigações que contribuam para o seu posicionamento neste domínio.

Este ano celebram-se 35 anos da criação do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), que antecedeu a CPLP. Com todas as suas dificuldades e fragilidades, o IILP é uma instituição singular que estabelece uma gestão pluricêntrica de políticas linguísticas, integrando todos os países de língua oficial portuguesa. Trata-se de um caminho mais difícil, mas também mais sólido, que importa aproveitar se queremos que o português possa ser um ativo estratégico relevante para todos os seus falantes.

Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-americanos

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