Cidadãos imigrantes com documentos atrasados realizaram um protesto na semana passada em Lisboa
Cidadãos imigrantes com documentos atrasados realizaram um protesto na semana passada em LisboaLeonardo Negrão / Global Imagens

“Inépcia política”, diz Presidente Marcelo sobre criação da AIMA

Marcelo Rebelo de Sousa afirma que Governo do PS não pensou nas consequências dos serviços que o órgão não está a oferecer, como a renovação dos documentos.
Publicado a
Atualizado a

A impossibilidade de renovação de títulos de residência e o atraso nos serviços da Agência de Imigração, Integração e Asilo (AIMA) “é uma coisa de outro mundo” e que “faz confusão”. As declarações são do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, questionado pelo DN sobre os problemas que os imigrantes estão a enfrentar pela deficiência no serviço da AIMA. 

De acordo com o chefe do Estado, este foi um “aspeto negativo” do Governo anterior, que encontrou uma “solução à portuguesa” para resolver o fim do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). A pergunta sobre o tema foi realizada durante o polémico jantar com jornalistas estrangeiros em Lisboa nesta semana, onde o Presidente da República falou sobre vários temas que tiveram impacto no país.

Durante o jantar, várias vezes o Presidente defendeu a necessidade de Portugal receber imigrantes, mas não poupou críticas ao atual serviço da AIMA. “Foi, de alguma forma, discriminação negativa, causada por inépcia política. Não se pensou na consequência que isso poderia ter. E que teve”, afirmou. 

Apesar de nunca ter sido admitido pelo Partido Socialista (PS), Marcelo afirmou que o “escândalo que houve no aeroporto com um cidadão ucraniano” motivou o fim do SEF. “Foi quando começou o drama de quem vai substituir o SEF”, relatou. O Presidente avaliou como uma “resolução à portuguesa”, para “deixar feliz” todos os órgãos públicos envolvidos no processo. A este desfecho, elogiou o então ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, dono de uma “paciência cristã” por ter dialogado na distribuição das funções da agência.

Marcelo Rebelo de Sousa confidenciou que a ministra Ana Catarina Mendes, com a tutela das migrações prometia rapidez. “Jurava-me que seria muito rápido, mas coitada, ela também não pode fazer milagres”, disse. O DN tentou contacto Ana Catarina Mendes para reagir às declarações e responder a questões sobre a AIMA, mas não obteve uma resposta.

Para o chefe de Estado, o PSD deve tratar do tema com “prioridade” de forma “urgente”, mas sem “soluções radicais” para que os cidadãos estrangeiros possam seguir com suas vidas em Portugal. “Para saberem qual é o seu estatuto, para trabalhar, ter acesso à Saúde, à Segurança Social e escola das crianças”, citou.

As questões apontadas pelo Presidente já foram avançadas pelo DN, que, todos os dias, recebe relatos de imigrantes com problemas relacionados com a AIMA. Há brasileiros demitidos do emprego porque não possuem documento de residência renovado - serviço que a AIMA não disponibiliza para os portadores do título da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP). Há também casos de recusa no acesso ao Sistema Nacional de Saúde (SNS) e de prejuízos aos estudantes universitários.

Marcelo sugeriu a criação de uma task force  para resolver, “em tempo recorde”, as pendências e que, para isso, “contrate quem seja necessário”.

Interrogações respondidas dois anos depois

As críticas de Marcelo Rebelo de Sousa à AIMA não são comuns, mas o alerta não é novo. A 6 de novembro de 2021, data em que promulgou o diploma que acabou com o SEF, Marcelo escreveu que faltava “esclarecer” detalhes da nova agência - na altura com outro nome - sobre a composição, operacionalidade, e, “sobretudo, a coordenação entre a APMA [a primeira designação da AIMA] e as diversas entidades policiais e delas entre si”. Na verdade, os pormenores que Marcelo referiu na altura da promulgação do diploma foram esclarecidos quase dois anos depois, a 27 de outubro de 2023, três dias antes do início das atividades da AIMA. A publicação do documento tinha sido pedida dois dias antes no Parlamento, quando foi aprovada uma audição “de urgência” com a ministra Ana Catarina Mendes a respeito da falta do estatuto e sede da futura agência. Na altura, as críticas foram à direita e à esquerda. O PSD classificou como “grande confusão em volta do processo de extinção do SEF e da criação da nova agência” e também destacou que já haviam atrasos na entrega de documentos renovados - problema que mantém-se atualmente. O Bloco de Esquerda tinha lamentado que a órgão teria menos funcionários, o que continuaria a gerar demora no atendimento aos cidadãos. 

O Governo ainda não detalhou o que irá fazer com a AIMA - contra cuja criação votou contra no passado recente. Para já, o que se sabe é que Luís Montenegro decidiu não ter uma Secretaria de Estado para as migrações. A tutela está com António Leitão Amaro, ministro da Presidência. 

Até agora, Amaro divulgou apenas uma nota pública sobre o tema, após o DN ter pedido uma reação ao protesto de imigrantes em frente à AIMA na semana passada. Marcelo disse esperar uma resposta rápida. “Espero que esse ensaio seja rápido, para não se perder mais tempo do que já se perdeu.”

amanda.lima@globalmediagroup.pt

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt