"O objetivo do Womens' Club é dar mais voz, mais presença à mulher"

Sandra Correia que "fazer todas as outras coisas", agora que vendeu a empresa Pelcor que a lançou na economia nacional, também internacional, aos 46 anos. Significa ajudar os jovens a lançar-se no seu próprio negócio, um mundo onde diz ser preciso trabalhar as competências mas também o corpo e a mente. Faz meditação esteja onde estiver, é mestre de reiki. E têm outros dois desafios: trazer maior consciência para os empreendedores e uma igualdade de género efetiva para o mundo empresarial e ajudar as startups e os empreendedores.
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Qual a principal característica que a levou a vingar no setor da cortiça?

Desafiar-me a mim própria, sou o meu maior desafio, ser persistente, ser sonhadora, ser resiliente.

Porque escolheu o curso de Comunicação Empresarial?

Gostava muito de jornalismo, dizia que queria ser jornalista, jornalista e famosa, aqueles sonhos de miúda. Na altura apareceu-me uma brochura do Instituto Superior de Comunicação Empresarial (ISCEM) e gostei muito do conceito. Tinha jornalismo, marketing e publicidade, e sempre gostei de comunicação. Outra coisa que me atraiu foi o facto de termos estágios logo no 2.º ano, nenhum outro tinha. Disse aos meus pais que me candidatava ao ensino oficial, mas queria ir para o ISCEM, sempre fui muito decidida.

Muito decidida, o que se refletiu logo no primeiro emprego.

Sim. Fui trabalhar para uma seguradora e fiz um curso de vendas, o que também foi bom, só que não deixavam usar calças de ganga. Assinei dois contratos e quando fui fazer a entrevista para o terceiro fui de calças de ganga e entreguei uma carta de demissão. Disseram-me: "Sandra, já podes vir de calças de ganga", respondi: "Pelo menos mudei alguma coisa e agora vou-me embora!" Fui para o Algarve trabalhar numa fábrica do meu pai. Não é a roupa que nos define, é evidente que em determinadas alturas temos de usar tailleurs, mas não é a roupa que nos define.

O facto de viver numa cidade mais pequena não a limitou?

Não, nada, mas depende dos objetivos que temos e o que queremos fazer da vida. A mim nunca me limitou, se não podia fazer de uma maneira, fazia de outra. O Algarve representa o meu ninho, o meu aconchego. Depois de ter criado a Pelcor, de ter viajado pelo mundo - há 13 anos que praticamente vivo em hotéis, ou vivia -, a minha casinha, o meu lar, é muito importante. Ande por onde andar, é o meu canto.

Não tem muito sotaque.

Às vezes sai. Voltei para a empresa da família porque podia pôr em prática o que aprendi na faculdade, tinha toda a liberdade. Era uma fábrica antiga, não tínhamos nada, quase que nem havia um computador. Implementei a comunicação interna, as newsletters, a parte de marketing. Paralelamente, comecei a apreender com o meu pai e a contactar com o produto, a conhecer o negócio. Já gostava e apaixonei-me. Considero que sempre fui feliz e tive sorte, tive sorte em ter os pais que tive.

E o seu irmão?

O meu irmão, que é mais velho do que eu três anos, só se interessou pela cortiça mais tarde, tocava música nos hotéis, é mais artista. Só quando criei a minha empresa, a Pelcor, é que veio trabalhar para a Nova Cortiça.

São a terceira geração de corticeiros, já se advinha a quarta geração?

Talvez os meus sobrinhos.

Tem filhos?

Não, tenho um cão-de água com 5 anos.

Que coisas são essas de que tanto gosta e está a fazer?

Estou a fazer mentoring com as startups, tanto em Portugal como no estrangeiro. Na minha época, estive muito tempo sozinha, queria internacionalizar, ir para os EUA, e não tive quem me ensinasse, quem me dissesse quais eram os circuitos e o caminho para chegar lá. O que gosto de fazer é trabalhar com os jovens, de olhar para o negócio deles e dizer "aqui está bem, ou não está", fazer perguntas, ajudá-los, limar os seus negócios. Vão mais rapidamente chegar ao seu destino do que eu. Demorei muito tempo até chegar lá.

Como é que esses jovens chegam à Sandra Correia?

Estou a colaborar com a Startup de Lisboa [incubadora de empresas] e com a Câmara do Comércio, e acompanho-os, isto a nível oficial. Depois, há casos particulares, de jovens que vêm ter comigo, que pedem colaboração, aqui é mais um aconselhamento do que um mentoring. Mas eu não faço, dou as dicas, eles é que têm de trabalhar.

Tem uma área específica?

Não, é qualquer área, mas claro que de tecnologia não percebo, é mais difícil. A minha especialização é o produto, produto ou serviço, mas mais produto.

Recebeu vários prémios, qual o que lhe diz mais?

É o de 2011, o de Melhor Empresária da Europa. Foi o que mudou e fez o click, não só em mim como em toda a minha carreira. Foi a maneira como Portugal me reconheceu. Ganhei prémios lá fora e depois é que comecei a ganhar prémios em Portugal. Embora eu ache que foi um bocadinho cedo, seria mais justificável em 2012/2013. Talvez não tivesse bem noção do que tinha feito, mas foi o mais importante.

Percebeu melhor quando contactou com outras realidades, outras empresárias?

Fui percebendo que tinha feito uma obra, algo fora da caixa.

Também foi convidada para participar num programa cujo mentor era precisamente Barack Obama.

Fui convidada pela Embaixada dos EUA para representar Portugal na New Begin, um programa de três semanas nos EUA e que foi maravilhoso. Abriu-me as portas e proporcionou o contacto com 27 empreendedores do mundo inteiro. O programa terminou nos EUA e o departamento de Estado americano autorizou que o trouxesse para Portugal. E assim o fiz durante dois anos.

Parece estar sempre a começar e a deixar alguma coisa, porquê?

Para mim, nada é eterno. Há um princípio, meio e fim. E o que faço, primeiro faço-o por mim, mas depois faço-o para os outros, para deixar um legado. Na New Begin for Portugal foram realmente dois anos em que os empreendedores tiveram de dar provas da sua resistência, da sua resiliência não só a nível profissional mas também de corpo e espírito, porque trabalhámos com as três áreas do ser humano. Ajudou-os a entender que o sucesso do seu negócio tem também que ver com o seu "eu", com o seu meio envolvente, são fases para depois continuarem o seu caminho. Ficaram algumas marcas e estou a fazer o tal mentoring. E eu própria limitei o programa a dois anos. E agora criei outro, o Women"s Club.

Cansativo?

Sou Gémeos. No New Begin temos 400 empreendedores. O Women"s Club é totalmente diferente, não tem data para terminar. O meu objetivo e, se tudo correr bem, é levar este projeto para o mundo, é dar mais voz, mais presença à mulher. Aprendi isso nos EUA, estava lá há bastante tempo e só tinha amigos americanos, não tinha amigos portugueses. Quando ao fim de três anos fui a um encontro do Portuguese Circle, percebo a importância do networking e penso em trazer esse conceito para Portugal, mas para as mulheres. Os homens ao fim de um dia de trabalho mais facilmente vão beber um copo, nós temos de ir buscar um filho à escola ou fazer outra coisa qualquer, a mulher tem muito mais solicitações. Além do uso das redes sociais, a minha ideia é, uma vez por mês, proporcionar a todas as mulheres, os homens também são convidados, beberem um copo durante duas horas num sítio giro, onde possam confraternizar, conhecer-se, fazer networking . E juntas começarem a dizer: "Eu também tenho voz", não interessa se é dona de casa ou dona de uma empresa. Tivemos o primeiro encontro em fevereiro em Lisboa.

Fazer lobby é o que falta às mulheres?

Não têm disponibilidade, outras por timidez, há todo o tipo de razões. A aceitação do Women's Club tem sido tão boa que acabámos por criar uma família e têm surgido muitos negócios destes encontros, parcerias, ajuda mútua.

É mestre de reiki, como é que o reiki entra no mundo dos negócios?

É a maneira de manter a consciência e o equilíbrio nesta vida louca e agitada que temos. Tomei contacto com o reiki há 11 anos, numa feira em Espanha, onde me fizeram uma primeira sessão, adorei. Estava num stress elevadíssimo e foi um bálsamo, fez tão bem que fiz o curso todo. E desde menina que sei que tenho esta ligação com as pessoas, não quero ser presunçosa, mas as pessoas vêm ter comigo e acabo por as ajudar, o reiki também ajuda. Foi o melhor para mim, estivesse na China, na Europa, ou nos EUA, fazia sempre a minha meditação, faço sempre. Contactamos com tanta gente, com tantas energias, que temos de ter os pés bem assentes no chão, e é preciso ter aqueles momentos para nós, para nos ouvirmos. Foi através do reiki que consegui este equilíbrio e é isso que quero hoje. Organizei um retiro em junho e estou a organizar outro, "eu sou amor", para ensinar às pessoas como se podem amar.

Qual é o próximo projeto?

A partir de setembro, o objetivo é juntar a área do conhecimento da pessoa ao mundo empresarial, para que as empresas possam ter maior rentabilidade.

Onde se vê daqui a 20 anos?

Vejo-me a viver pelo mundo e a ser uma guru moderna.

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