Freelancers com maior risco de sofrer de doença mental

Quem trabalha por conta própria deve fazer lista de objetivos diários, priorizar tarefas importantes e eliminar distrações.
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Ser freelancer tem as suas vantagens. Jorge, 29 anos, jornalista, passou o último ano a trabalhar como independente e aponta algumas. Raramente tem dias iguais. Ora passa toda a manhã a trabalhar, ora a dormir. Tanto se veste para ir fazer reportagens como passa o dia de pijama ou de fato de treino no seu pseudoescritório, entre telefonemas, e-mails e textos para escrever. "O horário é flexível, há menos pressão, o ambiente é mais tranquilo do que numa redação e posso ser mais criativo." Mas nem tudo são rosas. Se há semanas em que consegue faturar 300 euros, noutras não passa dos 25. Pode tirar férias, mas não são pagas. E ainda tem de lutar contra a inércia.

Apesar de todos os aspetos positivos, o trabalho independente pode ser prejudicial para a saúde mental. Quem o diz é um grupo de investigadores do Hospital Universitário de Bellvitge, em Barcelona, que estudou o papel da crise nas baixas por problemas relacionados com a saúde mental: "Os trabalhadores por conta própria têm o dobro das probabilidades de sofrer de um baixa prolongada do que aqueles que trabalham por conta de outrem." Isto porque, de acordo com a investigadora Eva Real, o freelancer está sujeito a maior vulnerabilidade.

Embora trabalhe de forma autónoma, destaca o psicólogo Jorge Gravanita, o trabalhador por conta própria está dependente de empresas, da flutuação do mercado. "Além disso, sente-se mais vulnerável e isolado. Há um sentimento de maior insegurança", explica. E um dos fatores que desencadeiam os problemas de saúde mental "é precisamente a instabilidade pessoal e profissional."

Liliana Silva, psicóloga e coach na We Care On (plataforma de consultas online ), diz que "existem algumas medidas que podem ajudar à redução do stress e da ansiedade, da procrastinação e da instabilidade financeira a que empresários por conta própria normalmente podem estar sujeitos". Em primeiro lugar, sugere, o freelancer deve perceber se "os seus valores e propósito de vida estão adequados à área em que atua ou pretende empreender ou se, pelo contrário, está a investir no negócio errado."

Para a psicóloga, é importante que haja uma boa gestão do "tempo que é dedicado à família, à vida social e ao trabalho." Além disso, prossegue, o trabalhador por conta própria deve procurar "ter uma rede de apoio sempre presente, quer na sua vida pessoal quer na sua área de trabalho". Se sentir que está sem energia, recursos ou motivação para continuar, deve "procurar ajuda especializada."

Eliminar distrações

Marco Pinto, 36 anos, fotógrafo, trabalha por conta própria há quase três anos e não acha que ser freelancer possa vir a ser prejudicial para a sua saúde. Está tão satisfeito com o novo sistema de trabalho, que recusou recentemente uma proposta de trabalho por conta de outrem. "Faço o que gosto. Além disso, faço a gestão do meu trabalho. Sou eu quem dita as regras." Quando não está a fotografar, ou está em casa a editar - de fato de treino, descalço e com o fiel companheiro ao lado - ou está em cafés. A grande desvantagem é a instabilidade financeira. E às vezes ter de lutar contra a preguiça.

Um dos grandes problemas no trabalho autónomo é a procrastinação: deixar para amanhã o que pode fazer hoje. Com um número cada vez maior de distrações, pode ser difícil manter o foco.

Segundo a investigação espanhola, além do trabalho como freelancer, existem outros fatores que podem contribuir para uma maior prevalência de transtornos mentais: ter mais de 50 anos, já ter sofrido perturbações mentais graves, não ter contrato de trabalho permanente ou trabalhar em áreas do imobiliário e da construção civil. "Esta investigação vem corroborar a importância de social e politicamente sermos responsáveis e de estarmos atentos aos fatores que podem condicionar a felicidade e a realização profissional das pessoas", destaca Liliana Silva.

Além do prejuízo pessoal, adianta a psicóloga, "ficam financeiramente debilitadas as empresas e a nação pelo custo que acarreta o absentismo laboral e as despesas com a saúde." Jorge Gravanita reforça que "a precariedade, a insegurança na relação laboral e a crise têm impacto na saúde mental."

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