Fausto Amaro: "Homens perderam maior controlo sobre os filhos"

Os homens tornaram-se menos autoritários do que no passado e mais permissivos relativamente aos filhos, diz o sociólogo da área da família.
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Como era a figura paternal antes do 25 de Abril?

Tradicionalmente, o pai era visto como o chefe da família. Ele representava o poder a que todos tinham que obedecer e era quem tomava as decisões importantes. Esse poder vinha-lhe de ser ele o principal sustento da família. Em Portugal, em 1960, só 17% das mulheres trabalhavam fora de casa. O pai adotava uma atitude rígida na educação dos filhos e os filhos tinham-lhe respeito e temor e acatavam as suas indicações. Muitos adultos de hoje, nascidos antes de 74 não têm essa ideia dos próprios pais os quais são recordados como seres bondosos e carinhosos a quem se devia respeito, mas sem temor.

Quais as principais diferenças para os pais de hoje?

Depois de 1974 os pais tornaram-se mais permissivos relativamente aos filhos. Esse tipo de educação e o ambiente mais liberal levou os pais a dar aos filhos mais autonomia e liberdade. Por outro lado as novas tecnologias de informação e comunicação contribuíram para um maior individualismo no processo de socialização das crianças e no controle das mesmas. A mulher também mudou o seu estatuto podendo agora ela própria ser responsável pela família e não apenas o homem. Tudo isto e o desenvolvimento das ideias de igualdade de género enfraqueceu o poder tradicional do homem na família, relativamente não só à mulher, mas também aos filhos.

O que foi ganho com esta mudança de atitude?

Penso que a sociedade atualmente está mais justa. Os homens estão a construir uma nova identidade masculina o que não impede que continuem como referência para os filhos no domínio do amor e da disciplina. Os homens tornaram-se menos autoritários do que no passado, mas vivem, por vezes, com mais stress. Perderam maior controlo sobre os filhos os quais são mais instruídos e autónomos.

No seu caso, como é que via o seu pai? Que tipo de relação tinha consigo, na infância?

O meu pai já faleceu, mas recordo-o como um ser de grande bondade que tinha grande preocupação em que eu aprendesse a viver numa sociedade em mudança. A minha infância foi muito feliz. A relação com os meus pais era muito carinhosa e o meu pai permitia que eu ajudasse em tarefas do campo ou da casa de que ele se ocupava em parceria com a minha mãe.

Esta mudança nos papéis no seio da família alterou a forma como a sociedade se organiza?

Esta evolução que tenho vindo a referir gerou alterações profundas na família, quer na sua estrutura quer no relacionamento entre os seus membros. Hoje temos novas formas de família e a interação entre os seus membros tende a ser mais individualista e mais liberal. Os papéis masculinos alteraram-se no sentido de uma maior partilha das responsabilidades profissionais e domésticas com as mulheres. Mas perdura ainda a ideia do poder masculino que pode levar à violência doméstica e o maior individualismo fez diminuir o sentimento de responsabilidade perante a família. A sociedade atual tem um maior número de famílias monoparentais, sobretudo femininas. Aumentou o número de divórcios, mas por outro lado a família continua a ser algo muito valorizado na sociedade.

professor de sociologia da família

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