Contra sanções. Textos da esquerda e da direita aprovados
O Parlamento aprovou esta quinta-feira dois votos contra a aplicação de sanções a Portugal por parte da Comissão Europeia. Apesar de terem sido submetidos à apreciação dos deputados dois textos - que, na verdade, poucas diferenças apresentam mas que desencadearam uma acesa troca de palavras entre a esquerda e a direita -, o presidente da Assembleia da República congratulou-se com "o consenso bastante verificável" na resposta do hemiciclo a Bruxelas.
O voto de condenação apresentado pelo PS, BE, PCP, PEV e PAN passou, como seria de esperar, embora tenha merecido a abstenção de PSD e CDS, ao passo que o voto (expurgado da palavra condenação) dos sociais-democratas e centristas contou com o apoio dos socialistas e do PAN. Contudo, e após o curto mas intenso debate parlamentar, BE, PCP e PEV posicionaram-se contra o diploma da direita.
Houve interrupções, protestos, apartes e pateada nas várias bancadas, mas quando Ferro deu por terminada a votação - com a frase "No Parlamento há um consenso bastante verificável contra a aplicação de sanções a Portugal" e a alusão ao último parágrafo dos dois documentos, de rejeição a eventuais sanções por incumprimento da meta do défice do ano passado -, da esquerda à direita houve muitos aplausos.
Ora, antes da votação, o líder parlamentar do PS deu o mote para a discussão ao estabelecer um paralelo entre a seleção nacional (prestes a iniciar a sua participação no Europeu de futebol) e a recusa das sanções. "Quando se trata da seleção nacional, uns e outros entusiasmam-se e aplaudem pelas mesmas razões e motivos. Assim é ou deveria ser com as sanções impostas. A Assembleia da República deveria dar 7-0", afirmou Carlos César para alfinetar PSD e CDS. "No PS não somos capazes de não estarmos unidos quando se trata de defender Portugal", completou.
E Pedro Passos Coelho tratou de devolver. O presidente do PSD considerou que "não há nenhuma razão para que as sanções sejam aplicadas", dado que "Portugal não incumpriu as regras do semestre europeu". Para o antigo primeiro-ministro, o défice de 2015 só foi superior a 3% (o limite máximo fixado no Pacto de Estabilidade e Crescimento) devido à resolução do Banif, pelo que, se assim não tivesse sido, Portugal teria saído do procedimento por défice excessivo.
"No dia em que a Europa tiver de sancionar aqueles que cumprem está tudo virado do avesso", prosseguiu Passos, que deu o troco a César por a esquerda ter recusado incluir no texto uma frase que reconhecia a trajetória de correção do défice (nominal e estrutural) feita durante a sua governação. "É preferível não falar dos resultados do passado (...) e ficar a falar apenas contra as sanções", atirou.
O líder parlamentar do Bloco, Pedro Filipe Soares, observou de seguida que existe uma "resposta unânime" do hemiciclo em relação a eventuais sanções, mas criticou a direita por querer transformar o voto "em vitórias para a Comissão Europeia ver". E ainda ironizou sobre o pin com a bandeira de Portugal que Passos habitualmente utiliza na lapela: "Pelos vistos, valem menos que um Parlamento unânime."
A tese foi, de resto, seguida por João Oliveira, chefe da bancada do PCP, que apontou o dedo a PSD e CDS por procurarem "sublinhar a redução do défice" feita nos últimos quatro anos "ignorando à custa do que é que isso foi conseguido". Mas o dirigente comunista regressou àquela que é a posição clássica do partido, sugerindo que Portugal se deve libertar "dos mecanismos de condicionamento da nossa soberania".
Já Nuno Magalhães, em nome do CDS, lembrou que a sua bancada, "desde a primeira, foi, é e será contra qualquer sanção desde a primeira hora" e reproduziu o argumentário de Passos: "Sem o Banif, o défice era de 3%." "Em quatro anos, défice caiu de 11% para 3%", continuou o presidente do grupo parlamentar do CDS.
Daí, e avisando que a defesa do "interesse nacional" por parte dos democratas-cristãos não pode "servir para desculpabilizar a incompetência deste ou de qualquer outro governo", atacou o PCP por não ter havido um único texto. "Se não foi possível é porque o PS está nas mãos do PCP. Foi o PCP que impediu o acordo", asseverou, antes de rematar: "É a geringonça no seu melhor."
A bancada do PS ainda dispunha de tempo e Carlos César aproveitou. "Já percebi porque é que não houve um acordo: o PSD não aceita defender o seu país se não incluir um elogio ao seu próprio partido", finalizou.