Nuno Magalhães: "Costa tem dois ministros que já não o deviam ser"

O líder parlamentar do CDS entende que com o acumular de casos na área da segurança, como as falhas de comunicação no incêndio de Pedrógão, a situação nos serviços de informações e o caso de Tancos, Portugal tem um sério problema de segurança e credibilidade externa.
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Para Nuno Magalhães, o primeiro-ministro apenas mantém os ministros da Defesa e da Administração Interna porque "escolheu a lealdade política em detrimento da segurança e da credibilidade do país".

Passaram duas semanas desde o incêndio de Pedrógão Grande, que vitimou 64 pessoas. O que já devia estar esclarecido e que responsabilidades políticas deviam estar assumidas?

Foi uma catástrofe como nunca vimos no nosso país. O que é que o governo faz? Faz perguntas. O governo serve para assumir a sua responsabilidade política e dar respostas. O espetáculo que nós temos visto, da ANPC acusar a GNR, a GNR à ANPC, a Secretaria-Geral do MAI à ANPC, a ANPC à Secretaria-Geral do MAI, o SIRESP a acusar todos, todos a acusarem o SIRESP. É dramático do ponto de vista da autoridade do Estado, põe em causa a própria autoridade da ministra, põe em causa a cadeia de comando e, pior, diria eu, põe em causa a confiança dos portugueses numa área muita sensível como a segurança e a capacidade de resposta para o Estado. No Ministério da Administração Interna a cadeia de comando é essencial, é preciso clarificar quem manda. Por isso tenho dito e repito: exige-se que a senhora ministra seja isso mesmo, seja ministra.

Há falta de autoridade?

Claramente que há uma falta de autoridade e, lamento dizê-lo, que é reiterada quando o PS está no poder. Uma falta de autoridade e uma falta de credibilização das forças de serviços de segurança. Há quase que uma desvalorização. É verdade que a criminalidade tem descido, ainda bem, mérito dos homens e das mulheres das forças de segurança, tem descido de há seis anos a esta parte. Mas gostava que houvesse um estudo de vitimação para termos toda a certeza de que isso não tem a ver mais com a falta de confiança dos cidadãos na Justiça e falta de participações e de queixas. Estou muito preocupado com o que tenho ouvido, e falo com muita gente, nas forças e serviços de segurança. Há muitos problemas, com a cativação de verbas, falta de meios e pessoal. Temos o problema na nova lei sindical da PSP que não foi aprovada, apesar da disponibilidade dos próprios sindicatos para reduzirem as folgas sindicais dos seus delegados e direções, por incapacidade absoluta do governo em negociar. E vem apresentar uma proposta que é uma autêntica lei da rolha para os sindicalistas...

Acredita mesmo que a comissão técnica independente da Assembleia da República vai ter capacidade, meios, autoridade para ter respostas concretas sobre o que aconteceu em Pedrógão Grande e apontar responsáveis?

Não espero excessivamente da comissão, mas espero um contributo para se apurar aquilo que se passou, que é fundamental. Isto não foi um simples incêndio, morreram 64 pessoas. Esta comissão pode ajudar o Parlamento a fazer o trabalho que é necessário, diria mesmo que é exigível, de apurar o que é que aconteceu. Deixe-me ser claro nisto: a comissão não se pode substituir nem substitui aquilo que é o dever do Parlamento, que é apurar o que se passa, e as responsabilidades do governo, que é responder ao que se passa. Pode contribuir do ponto de vista técnico, apurar matérias técnicas, das comunicações, sobre a deflagração do incêndio e o hipotético fenómeno natural excecional extraordinário. Não se substituirá ao dever do governo de dar respostas sobre o que se passou e assumir as devidas responsabilidades.

Nuno Magalhães era o secretário da Administração Interna em 2003, ano com a maior área ardida de sempre e 21 mortos. Vou ler-lhe só o último parágrafo do relatório de um vice-presidente da Proteção Civil sobre o que aconteceu: "A calamidade vivida por Portugal deverá permitir retificar muitas deficiências até agora imutáveis, desde aspetos de gestão florestal, passando pela rede de deteção, acabando na estrutura de combate terrestre e aéreo. As gerações futuras não nos perdoarão se perdermos esta oportunidade." Pergunto: o que é que não merece ser perdoado aos políticos que governaram o país nos últimos 15 anos, nomeadamente o CDS, que fez parte de governos nos ministérios da Administração Interno e da Agricultura?

Todos nós devemos fazer a análise disso e ao mesmo tempo assumir as nossas responsabilidades. Agora quero dizer duas coisas. Primeiro, este incêndio não é só um incêndio florestal, é muito mais do que isso e por isso é que merece ser individualizado. Quanto aos outros, é evidente que o Parlamento já fez três livros aprovados por unanimidade sobre os incêndios, e nesse aspeto todos nós temos responsabilidades. Tenho também de reconhecer que tendo em atenção as alterações climáticas e o aquecimento global, temos assistido cada vez mais a verões mais prolongados e mais quentes. Apesar disso, e não obstante 2013, nos últimos anos, estou a falar de vários governos, tem havido menos área ardida, ou seja, acho que tem de se fazer mais e melhor. Agora, também acho injusto para todos dizer que não se fez nada.

Só neste mês tivemos o caso de Pedrógão Grande e o assalto à base militar de Tancos na semana passada. No início do ano, o roubo das 57 pistolas Glock da instalações da Direção Nacional da PSP. Que país é este, que, por outro lado, é dos mais seguros do mundo?

Este governo tem tido uma postura pouco proativa nesta matéria. E junto a esses ainda outro caso que é a situação dos serviços de informações. Portugal vive neste momento sem um secretário-geral e sem uma fiscalização. Isto é gravíssimo e a forma ligeira como o governo tratou toda esta matéria é preocupante. Quem está de fora pensará, não queria utilizar uma expressão muito forte, que não será necessariamente o melhor país para se trocar informações. Desde logo não tem interlocutor e depois porque quem trata assim os seus serviços de informações não merece credibilidade para que haja essa cooperação e coordenação. Com a confusão do incêndio de Pedrógão, a situação nos serviços de informações, com o caso de Tancos, Portugal tem um sério problema de segurança e credibilidade externa. O primeiro-ministro tem dois ministros que já não o deviam ser nesta área e que os mantém. Escolheu a lealdade política em detrimento da segurança, da credibilidade do país e da confiança dos cidadãos no Estado. Passou a ser o primeiro e último responsável pelo que aconteceu e vier a acontecer. Como é sabido, o CDS, com grande empenho do deputado Telmo Correia, tem estado muito ativo nesta matéria. Recordo todos os diplomas que propôs, e foram aprovados no Parlamento, na prevenção do terrorismo. Um deles, fundamental para o trabalho dos serviços de informações, que é acesso aos metadados das comunicações dos suspeitos de terrorismo ou de crime organizado grave e violento.

O CDS tem o perfil definido para o próximo chefe das secretas?

Terá de ser uma pessoa de uma competência e de um prestígio inatacável e que gere confiança em todas as forças e serviços de segurança. Alguém com provas dadas no terreno, alguém com capacidade de coordenação, de colaboração com as forças de serviços de segurança e em quem as forças de serviços de segurança tenham confiança. É fundamental perante a atual ameaça a ligação muito estreita entre os serviços de informações e as polícias.

Qual é o resultado satisfatório para o CDS nas eleições autárquicas? Manter as cinco câmaras que tem?

O CDS tem a ambição de poder acrescentar mais algumas. Tenho esperança de que possa.

Mas se ficar na mesma com as cinco câmaras, fica satisfeito?

Eu acho que não podemos ficar insatisfeitos, mas acho que podemos aspirar a ter mais uma câmara e sobretudo mais vereadores. Eu acho que o CDS vai concorrer a mais câmaras e vai aumentar o número de autarcas, mais membros nas juntas de freguesias, mais gente nas assembleias municipais.

Em Lisboa, qual é o objetivo? Ganhar a Fernando Medina, competir com o PSD ou Assunção Cristas ter mais votos do que Paulo Portas?

O objetivo em Lisboa é muito claro, é ser alternativa ao presidente de câmara que se chama Fernando Medina. Não há outro campeonato. O objetivo é ser alternativa a Fernando Medina. Há um projeto que o CDS tem e que creio que é sólido, é pensado. Vejo da parte da candidata, que por acaso é presidente do partido, Assunção Cristas, um enormíssimo empenhamento, e por isso é uma candidatura ambiciosa. Mas como a Assunção tem dito, é uma candidatura ambiciosa, mas obviamente também realista. Ambição máxima, realismo total. O que é que isto quer dizer? Ambição máxima no sentido de que estamos a apresentar um projeto para ser uma alternativa a Fernando Medina. Realismo total no sentido em que também sabemos de onde partimos e os resultados que tivemos quando concorremos sozinhos, é nesse compromisso que avaliaremos, com esperança, mas avaliaremos os resultados em relação a Lisboa.

Considera que a direita perdeu uma oportunidade para, depois do que aconteceu nas legislativas, fazer tudo para se unir, conquistar Lisboa, vencer o PS e mostrar o que vale?

Estou convencido de que da parte do CDS tudo isso foi tentado. Não foi possível, amigos como dantes.

Em Ponte de Lima, um bastião autárquico do CDS, um ex-deputado e ex-dirigente municipal centrista vai concorrer contra o candidato oficial do partido, Vítor Mendes. Que imagem é que esta situação passa dá aos eleitores?

Essa é uma pergunta muito difícil. Sabe porquê? Porque eu sou muito amigo do Abel Baptista, gosto muito do Abel Baptista, portanto é muito difícil responder e reconheço que vou fugir à questão. Digo apenas o seguinte: tenho muita pena que não tenha sido possível - e eu sei que foi tentado tudo pela presidente do partido - chegar a um acordo com o Abel Baptista. Desejo-lhe sorte, não obviamente que ganhe a câmara.

Vai ser apoiado pelo PS...

Desejo-lhe sorte, surpreende-me esse apoio, surpreende-me que tenha aceitado, mas sou amigo do Abel e por aqui me fico na convicção, na certeza, porque merece, de que o Victor Mendes vai ganhar.

Nuno Magalhães foi um dos defensores de Assunção em relação aos críticos, nomeadamente Filipe Lobo D"Ávila e outros ex-deputados. Significa que a liderança do Parlamento está absolutamente comprometida com a liderança do partido?

Não é a liderança do Parlamento, são todos os deputados, incluindo o Filipe Lobo D"Ávila. Eu não vejo o Filipe Lobo D"Ávila como um crítico, vejo o Filipe como alguém muito competente, um deputado que tem feito tudo o que lhe tem sido pedido, um deputado com quem eu tenho trabalhado lindamente. Agora podemos ter, e às vezes temos, opiniões divergentes. Eu vivo bem com essa diferença e não tenho essa visão de nós e eles, acho que estamos todos no mesmo lado, independentemente de às vezes termos posições diferentes. Por isso quero sublinhar isso: não é a liderança parlamentar, são todos os deputados, incluindo o Filipe Lobo D"Ávila, que está comprometida com a direção do partido.

Como partido, o CDS vangloria-se de ser defensor do mérito e da competência, que Paulo Portas considerava fundamental para aquilo a que chamava "elevador social". Como se explica agora o CDS das cotas, que se dividiu na votação do diploma que estabelece cotas de mulheres nas empresas?

O CDS não teve posição, o CDS teve liberdade de voto, teve sete votos contra, seis votos a favor e a minha abstenção por ser líder parlamentar. Acho que não muda nada neste sentido.

As cotas são contra o mérito e a competência...

Não acho que seja o oposto. Percebo a pergunta e percebo a provocação, mas acho que há circunstâncias. Eu fui contra as cotas, por exemplo, e votei contra as cotas do Parlamento. Mas reconheço hoje que às vezes, para que determinado objetivo tenha de ser atingido, tem de se provocar de forma artificial. Devo dizer que esta lei choca-me numa parte, que é obrigar empresas privadas a cumprir as cotas. Acho que é inconstitucional e contra o direito de propriedade e contra a iniciativa privada. Se o Estado quer dar o exemplo, acelerando aquilo que também é importante que é a igualdade de género, aí já não me choca. Neste sentido, isto não é contra o mérito, é procurar potenciar precisamente o contrário, que é o mérito. Repare, muitas vezes, e acho que é uma indignidade para uma sociedade moderna, uma mulher tem de escolher entre a família, ter filhos e a carreira. Nós todos sabemos de casos destes em todas as áreas. Se o Estado quer dar o exemplo, acho que é uma forma de promover o mérito e não contrário, por isso é que não acho que seja oposto nem contraditório. Portanto, acho que deve ser uma medida temporária, não acho que deva ser uma medida extensiva no tempo, ou seja, só para proporcionar e para provocar que esse mérito dessas mulheres que têm de fazer essa escolha não seja prejudicado. Repito, percebo que o Estado queira dar esse exemplo, não percebo e até acho inconstitucional que obrigue as empresas privadas a fazê-lo.

Se não fosse líder parlamentar votava a favor?

Abster-me-ia, pelo que disse. É positivo que o Estado dê o exemplo e provoque estas alterações na sociedade, mas sou contra isso estar na lei para as empresas privadas.

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