Marcelo em Londres sem margem para romper protocolo
Marcelo Rebelo de Sousa chega na quarta-feira a Londres para uma intensa visita oficial de trabalho na qual, em pouco mais de 24 horas, almoça com potenciais investidores da City londrina, é recebido no número 10 de Downing Street pela primeira-ministra britânica, Theresa May, encontra-se com a comunidade portuguesa e lusodescendentes, visita o ateliê da pintora Paula Rego e, por fim, reúne-se com a rainha Isabel II, num encontro privado.
À intensidade da agenda soma-se um protocolo britânico avesso a grandes espontaneidades próprias de um Presidente da República que tem feito da quebra de protocolo uma imagem de mandato - como se vê no dia-a-dia em Portugal ou se viu em Moçambique, uma quase segunda casa, em que não resistiu a dançar com miúdos na Escola Portuguesa de Maputo (ver abaixo).
Agora, espera-se mais o Marcelo que se viu no Vaticano e em Madrid, sem oportunidade de romper com protocolos austeros, como na Suíça, onde ainda meteu um pauzinho na engrenagem ao sair da formatura para cumprimentar portugueses.
Não haverá passeios pela rua: em Downing Street, a população passa ao largo e os jornalistas ficarão atrás da baia a registar sorrisos e apertos de mão entre Theresa May e Marcelo. No Palácio de Buckingham, o encontro é privado, com a presença eventual de uma reduzida delegação e um fotógrafo real a registar para a posteridade o cumprimento entre monarca e republicano.
No site de Buckingham explica-se que "não há códigos obrigatórios de comportamento ao encontrar-se com a rainha ou com um membro da família real, mas muitas pessoas desejam observar as formas tradicionais", que podem passar por um breve aceno com a cabeça ou "simplesmente apertar as mãos da maneira habitual". E tratando inicialmente a rainha por "sua majestade" e "ma'am" nas vezes seguintes ("pronunciando-se com um breve 'a', como em 'jam'").
A "ancestralidade" de relações
Segundo explicou fonte oficial de Belém ao DN, com a visita - que surge após o referendo britânico e logo após o início das negociações para a saída do Reino Unido da União Europeia - Marcelo quer abordar tanto "a ancestralidade" como "a importância das relações luso-britânicas", num "nível político e económico", procurando ainda "valorizar o papel da comunidade portuguesa e lusodescendentes residentes" no país.
Ao lado do Presidente estará o ministro das Finanças, Mário Centeno, acompanhado dos secretários de Estado dos Assuntos Europeus, Margarida Marques, e das Comunidades Portugueses, José Luís Carneiro, em vésperas do prazo de entrega de propostas de alteração ao Orçamento do Estado.
Marcelo e Centeno têm a oportunidade, logo à chegada à capital do Reino Unido no dia 16, de estar com potenciais investidores britânicos, num almoço promovido pelo lord mayor da City de Londres, Andrew Parmley (empossado na sexta-feira para um mandato de um ano), e cujas principais funções são a promoção da cidade como líder mundial nas finanças e nos negócios.
Com Theresa May, o Presidente manterá o seu encontro mais executivo, por onde passarão questões relacionadas com investimento, trocas comerciais, mas também a situação dos emigrantes portugueses. Depois de Downing Street, Marcelo pode ouvir da boca dos próprios como é viver no país que se prepara para deixar a União Europeia, ao encontrar-se com portugueses e lusodescendentes, oferecendo uma refeição na embaixada.
Antes do encontro com a rainha, no dia 17 de manhã, Marcelo visita o ateliê da pintora portuguesa há anos radicada em Londres, Paula Rego.
A ida a pé para a posse e o banho na praia
A abrir o seu mandato, Marcelo disse ao que vinha. Já o tinha feito abundantemente na campanha (campanha é campanha), mas no dia da sua tomada de posse, a 9 de março, o Presidente eleito furou o protocolo ao chegar a pé e pela direita do Palácio de São Bento, em Lisboa, ao contrário do previsto. A 13 de junho foi filmado a ir a uma praia de Cascais, aparentemente sem seguranças, conversando com jovens e deixando-se fotografar com eles. Agora, foi fotografado a engraxar os sapatos em Cascais.
A redoma protocolar na visita ao Papa
Era um Marcelo satisfeito por estar com o Papa, na que foi a sua primeira visita ao estrangeiro. Dali seguiu para Madrid e as imagens mostram idêntica satisfação com os reis de Espanha. Mas a espontaneidade ficou às portas do Vaticano e da Moncloa e foi um Presidente que seguiu obediente as indicações dos caminhos a seguir. Na Basílica de São Pedro, o católico Marcelo pôde admirar a Pietà de Miguel Ângelo para lá do vidro que protege a obra das multidões e recolher-se junto do túmulo de João Paulo II. Sempre numa redoma protocolar.
A alegria de Maputo e o espartilho de cimeira
À alegria de Moçambique, em que dançou com alunos da Escola Portuguesa de Maputo, em junho, seguiu-se o rigor do relógio suíço, em que Marcelo teve de puxar por um espantado e divertido presidente suíço, Johann Schneider-Ammann, para ir cumprimentar emigrantes. Mas nem sempre se sentiu bem no seu fato presidencial: no primeiro dia da cimeira iberoamericana, surgiu de fato e gravata (Felipe de Espanha estava de camisa) e no segundo dia viu-se desconfortável na guayabera caribenha que vestiu.