Costa não levou PEC. Draghi não falou da banca

Primeiro-ministro ainda negoceia programa à esquerda. Líder do BCE também evitou a sua batata quente
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António Costa chegou ontem ao Conselho de Estado sem levar, nem mesmo em esboço, o que quer que se pareça com um Programa de Estabilidade (PE), o documento antigamente chamado PEC (Programa de Estabilidade e Crescimento), cuja versão final será no Parlamento no próximo dia 27.

A discussão do PE - e do Programa Nacional de Reformas (PNR) - estava na mesma agenda da reunião, mas em relação ao primeiro tema a ausência de dados concretos impediu uma discussão mais aprofundada. Implicitamente, a "nota informativa" que a Presidência da República emitiu depois da reunião do Conselho de Estado acaba por reconhecer que a substância do PE não foi discutida. Fá-lo dizendo que "os senhores conselheiros debateram o tema do Programa Nacional de Reformas e do Plano de Estabilidade" em vez de afirmar que "os senhores conselheiros debateram o Programa Nacional de Reformas e o Plano de Estabilidade".

O primeiro-ministro justificou a ausência de um draft do PE alegando que o documento ainda está a ser negociado com o BE e o PCP, os parceiros do governo PS na plataforma que dá maioria ao executivo no Parlamento. O PE é uma projeção macroeconómica a quatro anos - ou seja, o governo vai ter de revelar até ao horizonte de 2020 (portanto, um ano para lá do último da legislatura, 2019) as suas previsões de défice público: PIB, desemprego, dívida pública, etc. Costa revelou aos conselheiros de Estado que o documento será aprovado no Conselho de Ministros de dia 21 e dia 27 será discutido no Parlamento (juntamente com o PNR). E algures nos dias seguintes deverá voltar ao executivo para aprovação final. Depois, os dois documentos serão enviados para Bruxelas.

Outra surpresa da reunião teve que ver com a exposição que o presidente do BCE fez aos conselheiros (tendo a seu lado o governador do Banco de Portugal, que não abriu a boca). Na exposição destacou-se uma total ausência de referências substantivas aos problemas da banca nacional.

César, o acelerador e o travão

Houve conselheiros que após a exposição, no período de perguntas e respostas, tentaram puxá-lo para as questões relacionadas com o BPI, o Banif e a CGG - mas Draghi sacudiu sempre as respostas afirmando que o BCE só faz supervisão e que no momento atual o que interessa é a atuação da DGCom (Direção-Geral da Competitividade) da Comissão Europeia. Antes da reunião do Conselho de Estado, Draghi almoçou em Belém com o Presidente da República, o primeiro-ministro, António Costa, o ministro das Finanças, Mário Centeno, e o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa. Aí sim as questões concretas da banca portuguesa terão sido discutidas - mas esta é uma informação sem confirmação oficial.

Genericamente, a reunião do Conselho de Estado decorreu de forma cordata, mesmo quando Francisco Louçã, um crítico da atuação do BCE, falou. Discutiram-se as ideias já conhecidas do PNR e aqui Carlos César teve uma tirada bastante reveladora de como o PS e o governo olham, em comparação, para este documento e para o Programa de Estabilidade. "O Programa Nacional de Reformas é o acelerador e o Programa de Estabilidade é o travão." Dito de outra forma: com o PNR o governo permite-se sonhar, mas com o PE tem de descer à terra e assentar bem os pés no chão.

Na sua exposição aos conselheiros de Estado - colocada online assim que se iniciou -, Mário Draghi elogiou os esforços "notáveis" do governo de Passos Coelho. "Os esforços de reforma desenvolvidos por Portugal foram notáveis e necessários. Observamos agora sinais claros de que esses esforços notáveis estão a dar fruto dentro e fora do país."

Manter "reformas anteriores"

Draghi referiu especificamente "alguns exemplos" do sucesso português, como "o crescimento dinâmico do emprego desde 2014", o qual, no seu entender, sugere "que as reformas do mercado de trabalho estão a tornar a economia mais adaptável". Registou ainda que "as reformas educativas estão igualmente a dar fruto, tendo a taxa de abandono escolar precoce baixado para quase metade do seu valor desde 2009".

Por isso, e porque "todas as reformas levam algum tempo a produzir resultados", sendo esse "o caso para todos os Estados membros da União Europeia, tanto grandes como pequenos", "não se justifica anular reformas anteriores". É que "além de preservar o que já foi alcançado são necessárias mais reformas no conjunto da área do euro, tal como indicado nas recomendações específicas por país de 2015", sendo necessária "a melhoria do funcionamento do mercado de trabalho", o que "continua a ser fundamental" para "uma rápida adaptação a choques ou alterações estruturais".

"Este domínio permanece um importante desafio em Portugal, como também referido nas recomendações específicas por país de 2015", diz o presidente do BCE.

Ao mesmo tempo, "necessitamos também de reformas que incentivem as empresas a investir", e "tais reformas incluem medidas para melhorar ainda mais o enquadramento empresarial", o que pode ser conseguido, por exemplo, aumentando "a eficiência dos instrumentos de reestruturação da dívida".

Para o presidente do BCE, "a área do euro como um todo apenas conseguiu regressar aos níveis de atividade económica registados antes da crise no ano passado", mas "alguns países, entre eles Portugal, ainda não o conseguiram". O problema que se destaca é o do desemprego jovem - "aproximadamente um terço da população ativa jovem continua sem ter emprego" e para evitar criar uma "geração perdida", precisamos de agir com rapidez".

Saudação ao plano B

Mário Draghi congratulou-se com o facto de "a Comissão Europeia considerar que o projeto de plano orçamental para 2016 não revelava um incumprimento particularmente grave das disposições do Pacto de Estabilidade e Crescimento".

Acolheu ainda "com agrado o compromisso das autoridades portuguesas para preparar medidas adicionais destinadas a ser implementadas quando necessário para assegurar a conformidade [com o Pacto de Estabilidade e Crescimento]".

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