UE ainda dividida e com poucas respostas para a crise dos refugiados

Merkel avisa Londres que há pontos "inegociáveis" nas questões que Cameron quer rever para ficar na União.
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O último Conselho Europeu de 2015, que hoje se inicia em Bruxelas, irá analisar a questão dos refugiados, a ameaça terrorista e as exigências de Londres para que o Reino Unido permaneça na União Europeia (UE), entre outros assuntos. Mas será o primeiro tema aquele a que os dirigentes europeus irão dedicar mais tempo, pela dimensão de que se reveste e pelas divergências entre os Estados membros.

"A resposta europeia está a ser demasiado lenta na questão dos refugiados", reconhecia recentemente fonte da Comissão durante um encontro com jornalistas portugueses em Bruxelas. E o fenómeno surpreendeu a UE "pela sua dimensão, apesar de ser uma realidade que existe há bastante tempo", sustentou Elissavet Vozemberg-Vrionidi, eurodeputada grega do Partido Popular Europeu (PPE), falando num seminário sobre o tema promovido pelo Parlamento Europeu em que o DN participou. Para a eurodeputada grega, "é necessário um mecanismo obrigatório", uma diretiva da Comissão Europeia (CE), para concretizar "a boa decisão" que é a repartição dos refugiados entre os Estados membros. "De outro modo, não haverá soluções reais", pensa Vozemberg-Vrionidi.

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O problema central na questão dos refugiados é para o eurodeputado português José Manuel Fernandes, do PPE, a "credibilidade". Intervindo no mesmo seminário, este eurodeputado disse que se "os Estados membros assumem compromissos e não os cumprem, temos uma crise de credibilidade". Uma crise desnecessária, pois "a economia da UE é a maior economia do planeta", com recursos suficientes para enfrentar o problema. Referindo-se à pressão migratória sobre a Grécia, José Manuel Fernandes, frisou que este "é um problema de toda a UE" e que "tem de ser resolvido na origem". No mesmo sentido se pronunciou a alemã Ska Keller, eurodeputada do grupo Verdes/Aliança Livre Europeia, sublinhando a inexistência de "solidariedade europeia", predominando a "tentação de apontar o dedo e criticar os outros". Os refugiados "não são o problema", é a atuação da maioria dos 28, insistiu a eurodeputada alemã. E da UE em si, pensa a italiana Laura Ferrara, do grupo Europa da Liberdade e da Democracia Direta, que dá como exemplo o apoio financeiro de três mil milhões de euros concedidos à Turquia para, na prática, manter os refugiados e migrantes no seu território. "Estamos a pagar aos outros para resolverem um problema que é da UE", notando a eurodeputada que aquele país tem um registo negativo na questão dos direitos humanos.

"Transporte forçado"

Uma situação denunciada ontem pela Amnistia Internacional (AI) num documento em que a Turquia é acusada de maltratar grupos de refugiados, que teria forçado a regressarem à Síria. A AI considera que a "pressão" da UE sobre Ancara para travar a entrada de refugiados na Europa está a resultar "no transporte forçado" de centenas de pessoas para zonas de conflito e aconselha a suspensão do programa acordado entre a UE e a Turquia até existirem garantias reais deste país na questão dos direitos humanos. Ancara negou qualquer repatriamento forçado de sírios. O primeiro-ministro Ahmet Davutoglu reúne-se hoje com o presidente da CE, Jean-Claude Juncker e os governantes da Alemanha, Áustria, Holanda, Bélgica, Suécia, Finlândia, Grécia e Luxemburgo para analisarem o acolhimento dos refugiados na Turquia e na UE.

A dimensão da crise é reconhecida por uma das responsáveis do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) para a Europa. Para Sophie Magennis, a crise existe, mas "pode ser gerida, desde que sejam adotadas as medidas adequadas e haja solidariedade" entre todos os Estados membros. Esta responsável do ACNUR, que intervinha no seminário do PE, notou ainda que a esmagadora maioria dos refugiados no mundo - 86% - está fora da Europa. Vive em países em vias de desenvolvimento, como o Paquistão, Irão, Jordânia e Líbano. A única exceção é a Turquia, que possui parte do território na Europa.

Apesar das reticências e oposição expressas por alguns Estados membros, como a Hungria, Eslováquia e Polónia, entre outros, a UE está a apoiar um importante número de refugiados através de programas não concebidos para situações desta natureza. Isso mesmo foi explicado num encontro com um porta-voz do Serviço de Ajuda Humanitária e de Proteção Civil (ECHO) da CE. Como a ajuda humanitária da UE não pode ser utilizada no território dos Estados membros, esta está a ser ministrada, através do ECHO, a coberto de apoio a situações de emergência que forçassem a deslocação de populações. Desde 2014 até ao início de dezembro, pedidos de ajuda desta natureza foram ativados pela Bulgária, Hungria, Eslovénia, Croácia, Sérvia e, recentemente, pela Grécia.

O desafio britânico

Neste Conselho Europeu, que é o primeiro em que participa António Costa como chefe do governo português, a renegociação da presença do Reino Unido na UE será outro foco das atenções, depois do primeiro-ministro David Cameron ter anunciado a realização de um referendo em 2017 sobre a questão. Países como a Alemanha defendem a permanência britânica, tendo ontem Angela Merkel considerado Londres um "aliado natural", mas advertiu que há princípios, como a liberdade de circulação e a igualdade entre todos os cidadãos dos Estados membros são "inegociáveis". Duas das muitas áreas em que Cameron quer obter exceções.

Em Bruxelas

O DN viajou a convite da Comissão Europeia

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