Ennio Morricone, o autor de música para mais de 500 filmes
Numa nota que escreveu para o CD da banda sonora de Os Oito Odiados, Quentin Tarantino fala de um "sonho tornado realidade". A saber: poder contar, finalmente, com uma partitura original de Ennio Morricone. É certo que já tinha utilizado algumas das suas composições provenientes de outros filmes, por vezes dos menos conhecidos - por exemplo, em Sacanas sem Lei (2009), surgia um tema do western-spaghetti Pistoleiro Profissional (1968), de Sergio Corbucci. Mas só agora Tarantino teve uma partitura do seu "compositor preferido".
Compositor preferido de cinema? Nada disso. Ao receber o Globo de Ouro que Morricone ganhou com a música de Os Oito Odiados, o realizador fez questão em sublinhar que não estava a falar do "gueto" do cinema, mas sim de uma classe à parte a que pertencem também "Mozart, Beethoven e Schubert".
O fascínio de Tarantino pelo trabalho do italiano (nascido em Roma, a 10 de novembro de 1928) passa, naturalmente, pelas bandas sonoras que ele compôs para os lendários westerns-spaghetti de Sergio Leone, de Por um Punhado de Dólares (1964) a Aguenta-te, Canalha! (1971), passando, claro, pelos emblemáticos O Bom, o Mau e o Vilão (1966) e Aconteceu no Oeste (1968) - neste último título, o tema que acompanha o duelo final entre Charles Bronson e Henry Fonda é, muito provavelmente, a sua composição mais conhecida.
Em todo o caso, Morricone está longe de ser um músico "especializado" nas aventuras do Oeste. Não podia ser de outro modo, sobretudo se nos lembrarmos que qualquer registo da sua carreira refere mais de 500 autorias de bandas sonoras de filmes e produções televisivas (sem esquecer que são também muitas dezenas as suas composições paralelas ao cinema, desde a experimentação eletrónica a peças corais).
Para além de Leone, Corbucci e Sergio Sollima, outro realizador de westerns-spaghetti, a lista de cineastas com que Morricone já trabalhou é, de facto, impressionante. Ainda em Itália, encontramo-lo ligado a universos tão contrastados como a comédia sarcástica de Marco Ferreri (O Harém, 1968), o thriller político de Marco Bellocchio (O Monstro na Primeira Página, 1972) ou o drama intimista de Bernardo Bertollucci (A Tragédia de Um Homem Ridículo, 1981). Depois do impacto dos filmes de Leone, começou a ser regularmente solicitado pela produção americana, tendo composto bandas sonoras, entre muitos outros, para John Carpenter (Veio do Outro Mundo, 1982), Warren Beatty (Bulworth, 1998) ou Brian de Palma (Missão a Marte, 2000).
Em 2007, a Academia de Hollywood homenageou-o com um prémio honorário mas, na verdade, continua sem ganhar um Óscar competitivo. Este ano, precisamente com Os Oito Odiados, tem a sua sexta nomeação, depois de Dias do Paraíso (Terrence Malick, 1978), A Missão (Roland Joffé, 1986), Os Intocáveis (Brian de Palma, 1987), Bugsy (Barry Levinson, 1981) e Malèna (Giuseppe Tornatore, 2000) - e não será arriscado supor que Morricone é um dos vencedores "antecipados" da noite de gala no Dolby Theatre, a 28 de fevereiro.