O oitavo dia das audições relativas à Operação Marquês ficou marcado por alguma crispação entre José Sócrates e o líder do trio de magistrados do Ministério Público (MP) presentes na sala. Este último manteve-se sereno, apesar de o antigo primeiro-ministro se ter exaltado por algumas vezes.As alegações centraram-se maioritariamente no Grupo Lena, em função da construção de casas pré-fabricadas na Venezuela, na sequência de um acordo entre o Governo português e o executivo venezuelano, assinado em 2008. Também esteve em foco o empreendimento Vale do Lobo, a propósito do qual se falou de Armando Vara.Grupo Lena no centro das atençõesO tema central da manhã passou pelos acordos entre Portugal e Venezuela, iniciados em 2008. Em causa esteve, de por um lado, aquele que estabeleceu a construção de casas pré-fabricas numa fábrica situada na Venezuela. As obras ficaram a cargo do Grupo Lena, com o propósito de criar habitação social em território venezuelano.De acordo com as alegações do MP, terá havido um benefício ao Grupo Lena, neste âmbito, com o antigo primeiro ministro a receber "pagamentos" irregulares, nas palavras de Rómulo Mateus, magistrado do MP que tomou a palavra durante boa parte da sessão. Algo que o antigo político nega veementemente.“Não meti dinheiro nenhum ao bolso”, garantiu Sócrates, antes de lançar farpas ao referido magistrado. “O senhor procurador não confunda os meus bolsos. Às vezes, julgamos os outros à nossa medida”, atirou.Entre este e outros momentos de exaltação do ex-primeiro ministro, a juíza interviu, de forma a pôr água na fervura "Conhece a expressão 'show, don't tell'"? Não tem de estar sempre a fazer considerações sobre as perguntas e o que diz o MP", disse Susana Seca. "Prometo ter isso em consideração", respondeu Sócrates, sem grande convicção aparente.A argumentação passou, sobretudo, pela garantia de que a Lena não foi beneficiada em relação a outros players do mercado da construção. “Não teve um tratamento especial, teve o mesmo tratamento de todas as outras empresas”, reiterou o próprio.“O acordo com a Venezuela era um dos mais vantajosos para o nosso país”, salientou.O antigo líder de Governo deixou ainda claro que, na perspetiva da defesa, os benefícios recaíram sobre as várias empresas envolvidas (não apenas a Lena).Vale do Lobo tomou conta dos trabalhos com Armando Vara em focoVale do Lobo, no Algarve, “não me dizia nada”. A garantia é do antigo primeiro-ministro, além de garantir que tal nunca foi mencionado numa conversa em que tenha participado. De resto, salienta que ouviu falar de Vale do Lobo pela primeira vez em 2015, a propósito precisamente da Operação Marquês.Ora, de acordo com a acusação redigida pelo MP, o antigo chefe de governo intercedeu a favor da nomeação de Armando Vara para a administração da Caixa Geral de Depósitos, que acabaria por acontecer no final de 2005. Ao mesmo tempo, há suspeitas de ambos terão influenciado favoravelmente um empréstimo de 200 milhões de euros para que Gaspar Ferreira pudesse adquirir o empreendimento algarvio. Em consequência, os dois governantes terão recebido um valor total na ordem de 2 milhões de euros, de acordo com a acusação.José Sócrates desmente tudo isto. Não apenas diz que não se mostrou favorável àquela decisão, como até terá apresentado “objeções ao ministro das Finanças, Teixeira dos Santos”, a este respeito. Ainda que o ex-primeiro ministro tenha reconhecido uma relação de "amizade" e "confiança mútua" com Armando Vara, recorda que se opôs àquela nomeação, tendo por base o "impacto político" da mesma.José Sócrates reforça que o Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (PROTAL) não envolveu qualquer irregularidade. As audições regressam na próxima terça-feira, dia 9 de setembro. A partir das 9h30, a sessão vai retomar o tema da administração da CGD, à data de 2005..Breve história do Processo Marquês escrita no dia em que faz 10 anos.Operação Marquês. "Levantei objeções” à nomeação de Armando Vara, diz José Sócrates ao 8.º dia de audições.Operação Marquês. Sócrates recusa existência de influência no TGV para beneficiar Grupo Lena