BE e PCP falam em "revolta sincera". Chega está na manif da Fenprof

Fenprof prevê poder juntar mais de 100.000 pessoas na manifestação que termina no Terreiro do Paço.
Publicado a
Atualizado a

Milhares de professores começaram cerca das 15:20 a descer a Avenida da Liberdade, em Lisboa, em direção ao Terreiro do Paço, a exigir "respeito", numa marcha encabeçada pelo secretário-geral da Fenprof, Mário Nogueira.

"Respeitar os professores. Valorizar a profissão" são as palavras de ordem que abrem a marcha que, segundo a Fenprof, contará com a participação de cerca de 100.000 professores.

"Respeito" é, de resto, a palavra que mais se lê nas faixas, cartazes e t-shirts que trazem os manifestantes. "Os professores estão em luta nas escolas e na rua", "não paramos" e a "luta vai continuar" são as palavras mais ouvidas esta tarde na Avenida da Liberdade.

O deputado do Chega Gabriel Mithá Ribeiro marcou presença na manifestação nacional de professores, em Lisboa, e defendeu que estes profissionais "querem soluções a sério", mas o Governo "não está a fazer a sua parte".

Em declarações à Lusa, o deputado indicou que, "na substância", esteve na manifestação convocada pela Fenprof "a titulo pessoal, por ser professor" e para acompanhar a sua mulher, mas admitiu que não se pode "desligar de ser membro do Chega".

O deputado, que foi vice-presidente do partido mas demitiu-se no ano passado, considerou que "o Governo claramente não está a fazer a sua parte" no que toca a atender às reivindicações desta classe.

Gabriel Mithá Ribeiro defendeu que o enfoque está "muito na questão laboral, e é absolutamente fundamental", embora salientando que "há todos os problemas culturais, psicológicos, sociais que não estão a ser olhados".

"Não é normal um protesto tão denso e durante tanto tempo dos professores, se tem esta dimensão é porque querem soluções a sério", salientou.

O deputado assinalou que o Chega tem "propostas concretas para os problemas salariais que os professores enfrentam" e anunciou que o partido vai entregar no parlamento "nos próximos dias uma grande reforma do ensino" para "mudar o estatuto do aluno e ética escolar", tendo marcado para terça-feira uma conferência parlamentar com o tema ""A crise do Ensino em Portugal: que reforma?".

Gabriel Mithá Ribeiro apontou que este estatuto "é responsável pelo agravamento da indisciplina e violência nas escolas" e indicou que o Chega quer, entre outras, flexibilizar a expulsão dos alunos nas aulas e passar a "burocracia para o lado do prevaricador".

Também o Livre marcou presença na manifestação. Em declarações à agência Lusa, Isabel Mendes Lopes, membro da Assembleia do partido, defendeu que as "reivindicações dos professores e dos profissionais da educação são justas e tardam em ser resolvidas".

"É mais do que tempo de atender às reivindicações", salientou.

A dirigente do Livre, partido representado na Assembleia da República pelo deputado Rui Tavares, apontou que estes profissionais "têm sido castigados nos últimos muitos anos" e salientou o "esforço incrível que a escola pública fez para acompanhar os alunos durante a pandemia".

O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, considerou este sábado que a luta dos professores "é justa" e afirmou que o Governo "não pode ficar indiferente" aos protestos destes profissionais.

"É justa a luta dos professores, são justas as suas reivindicações, como se pode ver por esta magnífica mobilização que está em curso", afirmou o secretário-geral comunista, que marcou presença na manifestação nacional de professores convocada pela Fenprof.

Paulo Raimundo defendeu que o "Governo não pode é ficar indiferente ao que se está a passar também hoje aqui na Avenida da Liberdade", em Lisboa.

Uma delegação do PCP, que incluiu também a líder parlamentar, Paula Santos, esteve presente na manifestação em "solidariedade com a justa luta dos professores" e com "o respeito que merecem, mas também uma solidariedade com a escola pública, que também é isso que está em causa".

Paulo Raimundo assinalou que os professores "são muitos e estão muito determinados" e salientou que esta realidade "não pode passar ao lado" do Governo, "porque só a convicção, só a justeza destas reivindicações é que permitem que esta gente toda se concentre durante várias semanas consecutivas, da forma como têm feito".

"Estão a lutar por eles mas também estão a lutar pelo futuro do nosso país, que é a educação pública", assinalou.

Considerando que "o Governo não tem alternativa", Raimundo defendeu que o Governo deve "encontrar caminhos" para atender às reivindicações dos professores, e "não partir de uma premissa que os problemas são o que são e não há nada a fazer".

A coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, defendeu este sábado que a luta dos professores se deve a "uma revolta sincera" e desafiou o Governo a "assumir a sua responsabilidade" e atender às reivindicações da classe.

"O Governo partiu a corda e agora precisa de assumir a sua responsabilidade, e a responsabilidade é dar condições a quem deu tudo, a quem deu tudo pelo nosso país, pela nossa democracia, e faz a escola pública funcionar todos os dias", afirmou a líder do BE, que esteve presente na manifestação nacional de professores, em Lisboa.

Catarina Martins afirmou que os professores "estão em luta pela escola pública", que foi "desprotegida e humilhada durante tanto tempo", considerando que "esta revolta é uma revolta sincera". "Os professores, literalmente, pagam para trabalhar, porque andam com a casa às costas e não têm sequer despesas de deslocação pagas", criticou.

A coordenadora do BE considerou que esta é também a "revolta do país que vê que há milhões para tudo e para mais alguma coisa", mas "onde faltam sempre os milhões é nos salários de quem trabalha", e apontou que "há um problema no país com uma inflação que galopa e os salários não acompanham".

"Muitas crianças não têm professor não é por causa da greve, é porque já não há professores no país porque as carreiras foram de tal forma desarticuladas e as condições da escola são tão difíceis que há muitos professores a reformar-se e os mais jovens não querem ser professores, e com razão", acrescentou.

Catarina Martins afirmou que "o que falha em absoluto é o Governo", sustentando que não se pode "fazer de conta que é o ministro da Educação a negociar quando o ministro das Finanças vai e diz não vai haver aumento de despesa estrutural".

"O que o ministro das Finanças está a dizer é que quer que os professores paguem eles a inflação e a escola pública", criticou.

Questionada se deve ser o primeiro-ministro a liderar as negociações, a bloquista afirmou que é "muito estranho" que António Costa "ainda não tenha dito uma palavra sobre a escola e os professores", um "serviço público fundamental da democracia que precisa de resposta".

Sobre os protestos destes profissionais, que já contam greves e várias manifestações nas últimas semanas, Catarina Martins assinalou que "os professores esperaram e desesperaram" e se "ficarem quietos, não é nada resolvido".

"Faremos o nosso trabalho de forma institucional, mas fazemos também o nosso trabalho quando solidariamente estamos na rua, porque quando há uma maioria absoluta que acha que pode tudo e não ouve os professores, é também a força da rua que obriga à justiça", defendeu, considerando que "essa força na rua faz mover maiorias absolutas e vai obrigar o Governo a ceder".

Para Conceição Viana, professora de Filosofia, em Oeiras, os motivos para participar na manifestação são vários, "mas os que têm prioridade têm a ver com a contagem do tempo de serviço", as condições laborais e os critérios de recrutamento. "Fundamentalmente, em termos pessoais, a questão da contagem do tempo de serviço, mas estou solidária com as questões que dizem respeito a professores com outra idade e noutra fase do percurso", disse à Lusa.

Já para Álvaro Oliveira, professor de Português e Francês, no Monte da Caparica, em Almada, "a paragem obrigatória do 5.º e 7.º escalão não faz sentido nenhum". "Os professores têm tempo de serviço, fazem tudo, progridem e depois ficam pendurados nestes escalões. Além disso, o tempo de serviço que esteve sem contar, continua sem contar e a questão dos salários é uma coisa ridícula, porque o senhor ministro [da Educação] diz que há progressão salarial, mas eu desde de 2008 que ganho exatamente o mesmo, estamos em 2023, portanto é uma mentira pegada", apontou.

Também Dina de Jesus, professora de Português em Vale de Cambra, disse que vem "a todas as manifestações, porque a situação não se altera". "Nós temos de manter a nossa posição, porque é importante para nós, para os nossos alunos, para os pais, para o país inteiro", disse à Lusa, mostrando um cartaz com as palavras "democracia", que considera estar em causa, e "respeito", porque é o que não sente que falta por parte dos dirigentes políticos.

"Estou no sexto escalão, mas devia estar no sétimo quase no oitavo. Andamos aqui a marcar passo e descontámos os anos que estivemos congelados, o Estado arrecadou os nossos impostos e roubou-nos o tempo de serviço", acusou Dina de Jesus, exigindo "uma vida digna" para os professores do país.

A manifestação é convocada pela Federação Nacional de Professores (Fenprof), mas conta também com a participação da Federação Nacional de Educação (FNE) e outras sete organizações sindicais, bem como da Associação de Oficiais das Forças Armadas e de representantes da PSP.

O Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (STOP), que ainda tem uma greve a decorrer nas escolas, não faz parte dos organizadores, mas já anunciou que vai estar presente.

Os docentes começaram a juntar-se ao início da tarde no Marquês de Pombal, com muitos autocarros estacionados nas imediações deste local.

Ao som de apitos e bombos, e acompanhados por um grande dispositivo policial, os primeiros manifestantes organizavam-se para a marcha, empunhando faixas, bandeiras e t-shirts que servem de tela para as suas reivindicações.

As duas últimas grandes manifestações em Lisboa aconteceram em janeiro e foram organizadas pelo STOP, levando milhares de docentes para as ruas gritar por "Respeito" e "Melhores Condições de Trabalho".

No início do ano letivo, a tutela decidiu iniciar um processo negocial para rever o modelo de contratação e colocação de professores, mas algumas propostas deixaram os professores revoltados, como foi o caso da possibilidade de os diretores poderem escolher parte da sua equipa.

Desde então, as negociações entre sindicatos e ministério têm decorrido em ambiente de forte contestação, com os professores a realizarem greves e manifestações.

Fora da agenda negocial, estão reivindicações que os professores dizem que não vão abandonar, tais como a recuperação do tempo de serviço ou as progressões na carreira que os docentes.

A plataforma sindical que organizou o protesto deste sábado prometeu que no final da manifestação serão apresentadas futuras ações de protesto.

A Fenprof espera este sábado uma manifestação idêntica à de 2008, que, segundo os sindicatos, juntou cerca de 120 mil pessoas no Marquês do Pombal, em Lisboa.

Há 15 anos, um dos pontos de contestação era a avaliação dos professores e a ministra da Educação era Maria de Lurdes Rodrigues, o Governo era do PS e liderado pelo primeiro-ministro, José Sócrates.

Oriundos de todo o país, muitos professores envergaram camisetas pretas exigindo "Respeito" e apelando ao governo para os deixar trabalhar "sem burocracias".

"Desilusão", "desânimo", "revolta" e "falta de esperança no futuro" foram as palavras mais proferidas pelos docentes para descrever o atual ambiente vivido nos estabelecimentos de ensino.

No final da manif de 2008 que, como a deste sábado, percorreu as ruas de Lisboa, os professores aprovaram então uma greve nacional para 19 de janeiro de 2009 contra o modelo de avaliação de desempenho, que o Ministério da Educação rejeita suspender.

Segundo a organização, o protesto convocado por todos os sindicatos do setor, reuniu cerca de 120 mil professores, superando uma manifestação realizado em março desse ano, até então a maior alguma vez realizada em Portugal por uma única classe profissional. A PSP recusou adiantar números, alegando não serem possíveis de calcular, "dada a dimensão do protesto".

Na altura, os sindicatos afirmaram não haver "entendimento possível" com o Ministério, prometendo "luta o ano todo" contra o modelo de avaliação de desempenho proposto pelo Governo.

"Esta é maior do que a outra manifestação. Perante esta manifestação, que supera alguma já realizada em Portugal, será uma distorção democrática se o governo não retirar consequências e não suspender imediatamente o processo de avaliação de desempenho", disse Mário Nogueira, que já nessa altura era dirigente do Fenprof.

Apesar da dimensão do protesto, a ministra da Educação garantiu então que o modelo iria continuar a ser aplicado nas escolas, para permitir distinguir e premiar aqueles que são os melhores professores.

"Desistir não é uma solução, para isso não tenho disponibilidade", afirmou na altura Maria de Lurdes Rodrigues, acrescentando que o seu pior dia como ministra da Educação não foi o da manifestação, mas sim o da greve aos exames nacionais, em 2005.

Além do protesto contra o modelo de avaliação de desempenho, os professores contestavam também o diploma de concursos de colocação de docentes e o novo regime de gestão e administração escolar.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt