A neuropediatra que acompanhou as gémeas luso-brasileiras confirmou esta sexta-feira que foi pressionada para marcar uma consulta para as crianças após indicação do antigo secretário de Estado da Saúde Lacerda Sales, afirmando o pedido a "irritou um pouco"..Teresa Moreno disse que, depois de dois telefonemas da diretora de departamento a pedir a marcação de consulta para as gémeas luso-brasileiras a pedido da secretaria de Estado da Saúde e do ex-secretário de Estado António Lacerda Sales, lhe foi dito, num terceiro contacto, que o pedido teve um origem superior, que não foi identificada..A neuropediatra declarou que foi a sua diretora de departamento, Ana Isabel Lopes, que lhe passou essa informação, anteriormente transmitida pelo diretor clínico, Luís Pinheiro, e que teve a perceção de que estes seus superiores hierárquicos eram apenas intermediários de uma informação com origem num ponto superior da hierarquia..A médica explicitou, em resposta ao deputado socialista João Paulo Correia, que não sabia a quem se referia a diretora de departamento quando falava de alguém "acima da secretaria de Estado", mas que em conversas informais entre profissionais do hospital se afirmava, embora sem qualquer informação concreta e apenas no "plano da confabulação", que "acima da secretaria de estado estão a ministra e o Presidente".."Estamos a entrar no plano da confabulação, que é uma coisa que não é lógica. Eu digo o que eu ouvi. O que os outros sabem, compete-vos a vocês investigar, não é?", disse, dirigindo-se aos deputados da comissão de inquérito..O deputado João Paulo Correia afirmou, após esta resposta, que "não era por acaso que corriam pelos corredores do Hospital de Santa Maria os rumores de que teria havido uma interferência do Presidente da República", frisando que isso foi dito por Ana Paula Martins, quando era presidente do hospital, numa reportagem televisiva, embora não houvesse qualquer evidência..A médica confirmou o rumor referido pelo deputado socialista, detalhando que nos corredores do Santa Maria as gémeas luso-brasileiras eram referidas como as "meninas do presidente" pelas auxiliares da consulta..Em resposta ao deputado do Chega, André Ventura, Teresa Moreno reconheceu que considerou "irregular" a natureza do pedido, mas que não lhe ocorreu fazer qualquer denúncia e que apenas estava a "cumprir ordens".."Nem sequer ponderei. Obedeci a uma ordem hierárquica, irritou-me essa ordem hierárquica Como já tinha acontecido outras vezes (...) hoje já não faria muitas coisas que fiz na altura, com as coisas que sei hoje", acrescentou..Teresa Moreno, questionada pela deputada da IL, Joana Cordeiro, referiu também ainda que não teve qualquer contacto com Nuno Rebelo de Sousa, e que só ficou a conhecer o seu envolvimento no caso através da comunicação social..Vigilância à medicação implica residência no país.Teresa Moreno defendeu que a administração do medicamento Zolgensma implica uma "vigilância muito apertada" e por isso é necessário que os doentes residam no país.."O Infarmed obriga-nos a um 'follow up' [acompanhamento, em tradução simples] de pelo menos de quatro anos a seguir ao tratamento", pelo que é preciso que os doentes residam no país, salientou, depois de ser interpelada pelo deputado do PS, João Paulo Correia.."Tratar com Zolgensma implica ficar internado uns dias e depois vir semanalmente ao hospital, fazer análises e ser observado durante três meses todas a semanas, medicação", explicou..E acrescentou: "Os efeitos secundários não surgem logo após a administração"..Para Teresa Moreno, a residência em Portugal "é um facto incontornável" para se fazer a medicação, como obrigam as boas práticas.."Esse é um daqueles problemas que eu acho que a nossa classe política tem mesmo de decidir, não são os médicos", observou..A médica do Hospital de Santa Maria, que contestou o tratamento numa carta enviada ao diretor clínico lembrou que a residência era também umas das preocupações inscritas no documento.."Era o que estava refletido na carta: de as pessoas não residentes virem para Portugal para terem acesso aos cuidados de saúde (...) e ficarem cá a residir. Clinicamente têm de ser residentes. Tinham de ficar cá a viver", sustentou..Na audição, que durou mais de três horas, a neuropediatra recordou que a mãe das crianças se comprometeu a permanecer no país, mas realizava viagens com as meninas para o Brasil.."Durante estes anos, a família das meninas e Daniela Martins deslocaram-se ao Brasil, por vezes, durante períodos de dois ou três meses, entre consultas, em que iam por questões familiares ou para realizar fisioterapia intensiva", disse após ser questionada pelo líder do Chega, André Ventura..De acordo com Teresa Moreno, as crianças "voltavam para as consultas e vinham e iam com alguma facilidade".."Nós adaptávamos as consultas, de modo a que elas fossem vistas de quatro em quatro meses" passado o primeiro ano, que é de alto risco justificou..Neuropediatra reencaminhou email da mãe para direção clínica do Santa Maria.A neuropediatra Teresa Moreno disse que não respondeu ao 'email' da mãe das crianças, tendo-o reencaminhado para a direção clínica do Hospital de Santa Maria.."O primeiro contacto que tenho com a mãe das gémeas é no dia 14 de novembro [de 2019]. Manda-me um email a dizer: Sou a senhora Daniela Martins, sou a mãe das gémeas, penso que já deve ter ouvido falar do meu caso. É aí o primeiro contacto, ao qual eu não respondi", indicou a médica, em resposta ao deputado do PCP Alfredo Maia..Na sua audição, no âmbito da comissão parlamentar de inquérito ao caso das crianças tratadas com o Zolgensma em 2020, a médica salientou que não caberia a si decidir uso da medicação.."Não caberia a mim decidir. Até pelos custos escandalosos que isto implica, e existindo, e isto é ponto importante, uma medicação que na altura já era uma medicação alternativa. [...] Estávamos em 2019, onde nós estávamos a fazer uma mediação que tem bastante valor e que não impediria que houvesse um desfecho fatal. Eu não estava a escolher entre nada e todas estas crianças que me contactaram já estavam a fazer Nusinersen", salientou..Teresa Moreno recordou ainda que foi "contactada várias vezes" por vários lusodescendentes que souberam do tratamento e queriam tratar dos seus filhos em Portugal, e que havia alguns contactos dirigidos às crianças..Além da mãe das gémeas, "um colega abordou-me no hospital, um telefonema de outra colega, um telefonema de um familiar, pedindo a medicação", contou.