Críticas à atuação do ministro Pedro Nuno Santos chegam ao PS
É um pouco usual "ralhete" público da líder parlamentar do PS a um ministro do seu partido. Ana Catarina Mendes considera que o ministro Pedro Nuno Santos teve uma reação "truculenta" às críticas de Michael O"Leary, presidente da companhia aérea Ryanair, e defende que o titular da pasta das Infraestruturas deve ter mais "ponderação" e "sensatez".
"Eu não gosto de ver ataques como os que foram feitos pela Ryanair, mas não acho que reagir de forma mais truculenta resolva problema nenhum, antes pelo contrário. E, por isso, maior recato ou sensatez, bom senso, nestas reações", disse Ana Catarina Mendes no programa Circulatura do Quadrado, na TSF. A líder parlamentar socialista argumenta que Pedro Nuno Santos "não se pode pôr no mesmo patamar" do responsável da Ryanair "porque é ministro". "Tem uma responsabilidade acrescida e, sobretudo, tem que haver aqui alguma ponderação e alguma sensatez na forma como se reage", advertiu.
A relação entre o ministro e o presidente da low cost irlandesa tem sido marcada pela polémica. No final de maio, na sequência de uma reunião entre ambos, por videoconferência, o ministério emitiu um comunicado afirmando que transmitiu ao responsável da Ryanair que "não aceita intromissões nem lições de uma companhia aérea estrangeira que responde apenas perante os seus acionistas", sublinhando que "a Ryanair é uma empresa privada e não tem de interferir nas decisões soberanas tomadas pelo Governo português". "Perante os sistemáticos atos hostis de ataque à TAP, a Ryanair não deve esperar do Ministério das Infraestruturas e da Habitação uma atitude de cooperação ou sequer de indiferença", refere ainda a nota.
Sobre a mesma reunião O"Leary veio dizer, também em comunicado, que defendeu que o dinheiro dos contribuintes deveria ser aplicado em escolas, hospitais e outras infraestruturas, como o aeroporto do Montijo, em vez de numa "companhia aérea falhada".
A polémica surge na sequência da decisão do Tribunal de Justiça europeu que, na sequência de uma queixa da Ryanair, anulou a decisão da Comissão Europeia que aprovou uma ajuda estatal de 1200 milhões de euros à TAP, considerando-a "insuficientemente fundamentada". Pedro Nuno Santos diria depois que está em causa uma "guerra comercial" por parte de uma empresa (a Ryanair) que "aliás, respeita pouco as legislações nacionais". O"Leary respondeu que não se trata de uma guerra comercial, mas de "concorrência".
As palavras de Ana Catarina Mendes, além de serem um caso raro de crítica de um alto dirigente socialista a um ministro do Governo, surgem numa altura em que Pedro Nuno Santos tem estado debaixo de fogo, e num dossier particularmente pesado e melindroso como é o da TAP. E sem que o PS saia, audivelmente, em respaldo do ministro das Infraestruturas. Mas esta não é a primeira vez que a líder parlamentar se coloca do lado oposto ao ministro e os antecedentes também têm a TAP por pano de fundo.
Em dezembro, Ana Catarina Mendes manifestou-se claramente contra a votação no Parlamento do plano de reestruturação da companhia aérea nacional, no que seria depois secundada por António Costa. Do outro lado estava Pedro Nuno Santos, que queria levar o plano à aprovação dos deputados, e que assumiu então a divergência.
Este episódio transformou-se, aliás, num dos mais claros sinais de afastamento entre o ministro das Infraestruturas e o próprio líder do Executivo desde que, em 2018, Pedro Nuno Santos foi ao congresso do PS afirmar-se como pré-candidato à sucessão de Costa, com um projeto ideológico claramente mais à esquerda - e que levantou os congressistas na Batalha - levando o primeiro-ministro a avisar que ainda não tinha metido os "papéis para a reforma". Certo é que, desde então, Pedro Nuno Santos é apontado como um muito provável candidato à sucessão de Costa. E, não menos previsível que isso, Ana Catarina Mendes estará nas hostes contrárias de uma futura disputa pela liderança.
O DN tentou obter uma reação do ministro das Infraestruturas, sem sucesso.