André Ventura ataca PSD e sobe a fasquia: o Chega assume que quer governar Portugal
Na visita técnica que antecede habitualmente os congressos e que serve para as televisões e rádios prepararem as emissões especiais, os responsáveis do Chega foram mostrando o espaço do Centro Cultural de Viana do Castelo, enquanto lembravam que em 2020 Rui Rio ali realizara um congresso do PSD. A informação tinha um propósito: mostrar que o partido de André Ventura quer entrar para a liga dos grandes. Toda a encenação e discursos apontam para aí. Este é um momento de tudo ou nada e Ventura não teme sequer apontar as armas ao PSD de Luís Montenegro.
Desta vez sem atrasos, André Ventura chegou à hora exata que tinha sido antecipada aos jornalistas: 20h19. A ideia é transmitir profissionalismo e o líder do Chega, que tem sido um partido de um homem só, vai agora soltando palavras como “responsabilidade” e “credibilidade”, ao mesmo tempo que anuncia que esta Convenção Nacional servirá para mostrar “várias caras”.
Para já, tem no grupo parlamentar alguns rostos que começam a ser populares e a quem já um ou outro delegado vem pedir uma selfie. Rita Matias, estrela em ascenção no TikTok, o líder parlamentar Pedro Pinto e Filipe Melo, o deputado que ficou como efetivo na comissão parlamentar de inquérito à TAP, têm já notoriedade suficiente para mercer alguma atenção dos militantes.
Mas não chega. E é por isso que André Ventura se esforça por dar a ideia de que há fuga de nomes do PSD para o seu partido, mesmo que recuse avançar quem são e os que têm aparecido façam parte das quintas linhas de PSD e IL. Um dia depois de Maló de Abreu, deputado e ex-vice de Rio, negar a transferência para o Chega, Ventura prefere manter a ideia de que ainda pode vir e que outros lhe seguirão. “Tenho o dever de salvaguardar pessoas e informações que me foi pedido para salvaguardar”, lança, misterioso.
A mensagem a passar é a de que o Chega está numa dinâmica de poder. “Vamos ter nomes de variadíssimos partidos e naturalmente haverá uma prevalência grande de nomes do PSD”, acrescenta, perante a insistência dos jornalistas.
“PS e PSD são os adversários do Chega?”, pergunta uma jornalista. Ventura não hesita: “É evidente, porque são quem está à nossa frente”. Sem coligação à direita e com Luís Montenegro a apelar ao voto útil na AD, André Ventura não tem problemas em dar a entender que o PSD se equivale ao PS.
Deixar de ser partido de protesto
Agora, André Ventura diz que o Chega “tem de deixar de ser uma voz de protesto”. Quer ser um partido de governo. “O Chega vem para vencer as eleições”, disse, numa declaração recheada de farpas à oposição de Luís Montenegro. Ventura acha que esta é vez da afirmação do seu partido, “uma vez que outros não fazem o seu trabalho” e que “o PSD já deu mostras que não fará ou não faria muito diferente do PS”.
O discurso,embora mais agressivo do que é normal entre partidos que fazem parte do mesmo espectro político e que podem estar condenados a entender-se para conseguir governar, faz lembrar o de Assunção Cristas em 2018. “Eu vejo-me como primeira-ministra”, dizia antes de um desaire eleitoral que abriria caminho a Francisco Rodrigues dos Santos para a liderança do CDS. Desta vez, Ventura sustenta-se nas “sondagens”, que cita como se fossem quase já resultados eleitorais, para dar gás a esse discurso de crescimento.
No primeiro dia da Convenção Nacional, a enorme sala do Centro Cultural de Viana do Castelo ficou muito longe de encher. Mas a grande prova de fogo será no domingo, quando Ventura fizer o discurso de encerramento no qual se espera que comece a apresentar já parte do que serão as linhas de força do seu programa eleitoral.
À chegada, Ventura assumiu que o Chega tem “a responsabilidade de dizer que quer governar, que propostas tem para governar e quem tem para governar”. Para já, o partido continua, apesar de tudo, a girar em torno da figura de André Ventura, que volta a ser o único candidato para suceder a si próprio e que já viu sair do partido alguns críticos internos mais vocais, como Nuno Afonso, que veio consigo do PSD e chegou a ser seu número dois, antes de se assumir como o mais próximo que Ventura teve de uma oposição interna, num partido que fala quase sempre a uma só voz.
Mesmo com um discurso sobre a “responsabilidade” e a “alternativa”, o Chega trouxe para o palco o slogan “Limpar Portugal”, o mesmo que está espalhado pelo país em cartazes com cruzes sobre as caras de figuras como António Costa ou Fernando Medina. Por todo o pavilhão há bandeiras nacionais e os ecrãs gigantes estão num tom de azul semelhante ao que é usado pela IL, ao que faz parte da imagem do CDS e ao que Luís Montenegro começou a usar nas suas redes sociais. Mas, quando o líder entra na sala, nota-se a diferença para os outros partidos: o speaker anuncia o “professor doutor”.
margarida.davim@dn.pt