Músico faz apresentação nesta quarta (29), no Coliseu dos Recreios.
Músico faz apresentação nesta quarta (29), no Coliseu dos Recreios.Paulo Spranger

Paulinho da Viola. “O samba não acaba porque o povo não deixa”

Em Portugal para apresentações em Lisboa e no Porto, músico concedeu entrevista onde relembrou a sua carreira e falou sobre o passado, o presente e o futuro da Música Popular Brasileira.
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Não é à toa que Paulinho da Viola é conhecido como o Príncipe do Samba. Dono de carisma e elegância proporcionais ao seu talento, o cantor e compositor carioca de 82 anos está em Lisboa, onde falou com jornalistas mais de uma hora no Hotel Dom Pedro, nas Amoreiras, relembrando diferentes momentos da sua carreira, a música brasileira na atualidade e sua relação com Portugal. "Eu falo muito", brincou o músico. Mas ouvir Paulinho nunca é demais.

Na capital, o carioca prepara-se para nesta quarta-feira, 28 de outubro, subir ao palco do Coliseu dos Recreios com o espetáculo Quando o Samba Chama, que ainda terá uma sessão na Casa da Música, no Porto, no sábado, dia 1 de novembro. Os espetáculos enquadram-se numa turnê que já estava preparada há cinco anos e que, quando o artista viu os seus concertos cancelados pela pandemia de covid-19, temeu que não voltasse a acontecer.

Paulinho da Viola em conferência de imprensa no Hotel Dom Pedro, em Lisboa.
Paulinho da Viola em conferência de imprensa no Hotel Dom Pedro, em Lisboa. Paulo Spranger

"Esse trabalho começou um pouco depois dessa pandemia que todos sofreram e houve uma surpresa, porque nós imaginávamos, com tudo aquilo que vinha acontecendo, os shows cancelados, que a retomada disso seria muito difícil", relembra. "Mas nós, artistas, não só músicos mas também atores, atrizes, percebemos que após a abertura, o público veio muito atrás destes eventos, lotando as salas de concerto, de teatro".

O momento de reabertura pós-pandemia coincidiu com o período próximo do 80.º aniversário de Paulinho. Questionado sobre o que gostaria de fazer para celebrar a data, o músico decidiu então fazer um espetáculo que navegasse pelas diferentes fases da sua carreira, iniciada nos anos 1960. Foi nessa época que Paulinho circulou por diversos festivais do Brasil, conviveu com nomes como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia e Clementina de Jesus e virou um dos principais artistas do país após o lançamento do álbum Foi Um Rio Que Passou Em Minha Vida, em 1970.

"80 anos e aí o que você faz? Você separa algumas músicas que são mais conhecidas do público e algumas que você fez recentemente, embora eu não tenha composto muito agora. Mas como fazer isso? São centenas de músicas, não só minhas, mas de outros autores que eu cantei, do samba, coisas que eu ouvia meu pai cantando... muita gente acaba indo no concerto e depois fala que não toquei determinada música. Mas se fosse para tocar tudo o show ia ficar muito grande", ri.

O retorno a Portugal

Das suas passagens por Portugal, para onde já tinha concertos marcados em 2020, Paulinho da Viola guarda dois momentos com carinho. Da sua primeira visita, em 1981, o artista recorda a participação no festival de música do jornal Se7e, na Praça de Touros do Campo Pequeno, em Lisboa. Naquele dia, no entanto, o protagonista foi outro.

"Estava o Sérgio Godinho, que fazia um sucesso inacreditável. Não sei quantas vezes ele voltou ao palco, cada vez que ia ao camarim dizia que já não tinha mais nada para cantar. Quando ele enfim parou de voltar ao palco lá fui eu, me apresentei, porque as pessoas não me conheciam e reagiram muito bem, quer dizer, pelo menos não me vaiaram. Porque elas queriam mesmo era o Sérgio", recorda.

Cerca de 20 anos depois, retornou a Portugal e conheceu Carlos do Carmo, com quem teve aventuras na noite lisboeta. “Fomos a uma casa de fado que estava fechada, mas, de repente, a Argentina Santos apareceu com um violonista, botou o xale e cantou três músicas para nós. Cantou lindamente e depois ainda me deu um disco. O Carlos disse: ‘Ela nunca fez isso para ninguém’.”

Ficou ainda a admiração por nomes como Amália Rodrigues, que viu voltar ao palco “doze vezes” numa mesma noite num festival em Itália, e pelos Madredeus. "Lembro-me de uma apresentação que vi do grupo com o Carlos Paredes no Brasil e aquilo me marcou muito. A Teresa Salgueiro também, cantora que tem uma voz impressionante, todo mundo ficou admirado com ela", recorda.

Entre outros temas, o artista falou também sobre a nova geração da Música Popular Brasileira. A fragmentação trazida pela internet, o volume de informação e a crise do direito autoral são temas que inquietam Paulinho, mas não o suficiente para apagar o seu otimismo com o futuro do som. "Acho que vai surgir muita gente jovem fazendo muita coisa boa, na verdade já tem. A vida muda, novos problemas irão surgir, e tem sempre gente preocupada com o que se passa no mundo e fazendo coisas novas e boas a partir disso", acredita o cantor.

Sobre o gênero que o consagrou, Paulinho da Viola não tem dúvidas de que segue bem representado e longe de cair no marasmo. "Mesmo quando eu comecei, nos anos 60, já falavam que o samba era uma coisa de velho. Só que depois ainda surgiram Jovelina Pérola Negra, Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Arlindo Cruz, que faleceu recentemente... esse pessoal enchia ginásios no Rio De Janeiro. Isso numa época que o rock já começava a ter um certo predomínio", relembra o artista.

"Samba tem em tudo quanto é canto, já vi samba até no Japão. Quando surgiu o rock e as rádios FM falavam que ia acabar, cair em desuso. Mas o samba não acaba porque o povo não deixa", sublinha Paulinho.

O concerto de Paulinho da Viola no Coliseu dos Recreios nesta quarta-feira (29) está marcado para às 21h. Ainda há bilhetes disponíveis através deste link. Já a apresentação na Casa da Música no Porto no sábado (1), decorre às 21h30, com bilhetes disponíveis aqui.

nuno.tibirica@dn.pt

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