Os humanos

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Na história das campanhas fratricidas, há uma frase que fica para a história. Em 2011, quando os dois irmãos Miliband (David e Edward) concorriam pela liderança do Labour britânico, o "Ed speaks human" foi a morte dos almoços em família.

A campanha era bem simples: Edward (o mais novo) era o irmão ideal, parte Obama parte princesa Diana. David, o mais velho, era o contrário: genial mas frio, liberal e insensível, perdido pelos anos no governo Blair. E assim, com o "Ed speaks human" ganhou o irmão mais novo e o mais humano: Ed ficou com o Labour, os humanos respiraram de alívio.

Os meses passaram. Com os conservadores no poder e o irmão já firme na oposição, o mais velho dos Miliband (David) ficou na sombra. Até agora. Em Abril, em entrevista à edição britânica da revista GQ, David começou a olhar para trás. Hoje, garante, está mais próximo das pessoas e o movimento que lançou - Movement for Change - está mais perto dos problemas reais. Na entrevista à GQ, o Rooney dos trabalhistas (Blair pôs-lhe a alcunha quando estava no seu governo) admite que mudou. Cauteloso, não dá recados ao irmão mas admite que o seu caminho, a sua política, agora, é outra.

Se olharmos para a Europa no último ano, muitos líderes podiam aprender com o exemplo. Sarkozy na primeira volta das presidenciais, Merkel em várias eleições regionais, Mark Rutte demissionário na Holanda mostram como a austeridade faz mossa.

Presos à rigidez das contas públicas, todos criaram um fosso com os seus eleitorados, apostando em ideias verdadeiras mas impopulares: uma Europa falida, sem acesso a crédito, perdida em défices excessivos e capturada pelo fraco crescimento. Até Passos Coelho, que arrancou com um discurso de transparência e verdade nas contas, parece ter entrado nesta espiral de realismo depressivo. Em duas semanas, o Governo apresentou um congelamento de reformas, novas taxas alimentares, discutiu o plafonamento da Segurança Social e ameaçou com a deslocalização. Tudo novidades necessárias, garante o PM, para garantir a sustentabilidade do Estado. Tudo verdade, mas socialmente incómodo. David, o menos humano, aprendeu com o irmão que só a lógica financeira não chega, que falta proximidade na abordagem aos problemas. E acabo já com uma frase lamechas: sem humanidade no discurso não há austeridade que aguente.

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