O Banif revisitado um ano depois da resolução
No dia 19/12/2015, o Banco de Portugal (BdP) decidiu, com carácter de urgência, declarar que o Banif se encontrava "em risco ou em situação de insolvência", iniciando assim o processo de aplicação de uma medida de resolução e promovendo as diligências necessárias para a alienação do conjunto de ativos, passivos e atividades do Banif a uma instituição financeira que pudesse assegurar a continuidade da atividade do banco, salvaguardar os interesses dos clientes e a poupança das famílias, preservar a estabilidade do sistema financeiro, evitando um risco sistémico e o colapso económico das regiões autónomas, ao abrigo do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.
Passado um ano sobre a aplicação da medida de resolução ao Banif, impõe-se revisitar o respetivo contexto. Ao tempo, a deliberação do BdP foi tomada perante a elevada probabilidade de uma decisão da Comissão Europeia (CE) declarar ilegal o auxílio do Estado português no contexto da recapitalização do Banif com fundos públicos, ocorrida em 2013, após a recusa sucessiva pela CE de várias versões do plano de reestruturação do banco e considerando que nenhuma das propostas de aquisição apresentadas pelos concorrentes, no processo de venda voluntária iniciado em meados de 2015 pela administração e pelos acionistas do Banif, foi aceite por implicarem um auxílio do Estado ou não garantirem uma perspetiva de viabilidade do banco.
Adicionalmente estávamos na iminência da entrada em vigor, a 01/01/2016, das regras do novo Mecanismo Único de Resolução e da plena aplicação do regime da Diretiva 2014/59/EU do Parlamento Europeu e do Conselho, que poriam fim às resoluções e recapitalizações de bancos não viáveis assentes em dinheiro dos contribuintes e que poderia dar origem à liquidação do Banif com consequências para alguns credores, tais como titulares de dívida sénior do banco e de depósitos acima de 100 mil euros. Esta liquidação teria tido um custo direto estimado de 5107 milhões de euros (secretário de Estado do Tesouro e Finanças, Público, 7/04/2016).
Naquele momento apenas foram chamados a apresentar propostas de aquisição, num contexto de resolução, o Banco Popular e o Banco Santander Totta, por terem sido considerados pelo BdP, de entre os concorrentes que haviam participado no processo de venda voluntária do Banif, os únicos que corresponderiam ao perfil de potenciais adquirentes exigido pelo Estado português. Só o Santander veio a apresentar uma proposta vinculativa de aquisição.
No dia seguinte, às 23.30, o CA do Banco de Portugal aprovou a deliberação que determinou: 1) a alienação ao Santander de um conjunto específico de direitos e obrigações que constituam ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do Banif; e 2) a constituição de um veículo de gestão de ativos especialmente criado para receber e gerir a maior parte dos direitos e obrigações do Banif a transferir para o mesmo (atualmente a Oitante, SA).
As obrigações subordinadas são aquelas em que é convencionado que, em situação de insolvência, as mesmas apenas serão reembolsadas após terem sido pagos os créditos garantidos, privilegiados e comuns.
A deliberação do BdP de 20/12/2015 determina expressamente que as obrigações ou responsabilidades emergentes de emissões de dívida subordinada do Banif, nas quais se incluem títulos subscritos por muitos clientes de retalho daquele banco, não fazem parte dos ativos transferidos para o Santander no contexto da resolução nem foram incluídas na lista de ativos transferidos para a Oitante, pelo que permanecem no Banif.
Apesar de, do ponto de vista jurídico, não assistir ao Santander qualquer obrigação de reembolso perante os titulares de obrigações subordinadas do Banif, aquele banco lançou em julho de 2016 uma oferta de subscrição de obrigações não garantidas e subordinadas, exclusivamente dirigida ao universo dos investidores não qualificados e pessoas singulares que fossem titulares de obrigações subordinadas do Banif, prevendo uma remuneração que visava conferir-lhes a possibilidade de recuperarem uma parte significativa do capital investido a longo prazo. É de referir que esta oferta, de natureza comercial, mereceu reduzida adesão e não tem impacto na responsabilidade jurídica do Banif e do Fundo de Resolução, que permanece.
Assim, em primeira linha, perante os titulares das obrigações subordinadas responde o próprio Banif, que se mantém enquanto entidade jurídica objeto de resolução e de intervenção corretiva, ou a respetiva massa insolvente, em sede de revogação da autorização bancária e de liquidação do banco.
Adicionalmente, poderá também responder o Fundo de Resolução, na hipótese de se vir a verificar, após a realização da avaliação independente a que o regime de resolução aplicável obriga, que os credores, incluindo os titulares de obrigações subordinadas, suportaram um prejuízo superior com a medida de resolução ao que suportariam caso a mesma não tivesse sido aplicada e o Banif entrasse em liquidação no momento em que aquela foi aplicada, tendo os mesmos direito a receber essa diferença do Fundo de Resolução.
Advogado da CTSU -Sociedade de Advogados SPRL, SA