O planeta na gaveta

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O combate às alterações climáticas tem sido um dos grandes desígnios do atual mandato nas instituições europeias, iniciado em 2019. Depois de largas décadas reservado a um nicho de especialistas, o clima passou a marcar presença assídua no debate público, consagrando-se como prioridade política e pedra basilar no trabalho da União Europeia.

Com a aprovação da Lei Europeia do Clima, os 27 Estados-membros comprometeram-se a reduzir as emissões poluentes em 55% até 2030 e a atingir a neutralidade carbónica até 2050. Há poucos anos seria inimaginável, hoje é uma realidade.

Mas, sem diminuir a importância deste desenvolvimento positivo, lançar já os foguetes seria prematuro. A vasta maioria dos países continua distante dos objetivos estabelecidos; alcançá-los exige passar da teoria à prática. E tal não acontecerá na ausência de determinação ou de solidariedade.

Determinação porque se exigem grandes investimentos em energias renováveis, em transportes (coletivos, de preferência) elétricos e de baixas emissões, em agricultura mais sustentável, em repensar o modelo industrial de poluição intensiva. Portugal não é estranho ao tema, marcando presença frequente no grupo de países europeus com bons exemplos. Um deles, recente: em abril, mais de metade da eletricidade produzida no país teve origem em energia solar e eólica.

Solidariedade porque ninguém pode ser deixado para trás. Há trabalhadores, pequenas empresas e territórios mais afetados do que outros - seja pelo efeito das alterações climáticas, seja pelas implicações da transição. Para com eles temos o dever de procurar, juntos, oportunidades e soluções.

E é precisamente por isso que noto, com preocupação, essa ausência em alguns grupos da direita europeia nas discussões mais recentes em matéria climática. Não me refiro à extrema-direita negacionista das alterações climáticas (e de tantos outros factos científicos), pois tal já seria de esperar.

O problema é que o Partido Popular Europeu (PPE, integrado por PSD e CDS), nitidamente já focado nas próximas eleições europeias, continua preocupado em disputar eleitorado com a extrema-direita. Primeiro foi a aproximação nas migrações, agora seguem-se indícios da mesma estratégia na oposição a leis climáticas.

No mês passado, o PPE adotou formalmente a sua posição contra a redução de pesticidas agrícolas e contra a lei do restauro da natureza. Isto depois do seu presidente, Manfred Weber, e de vários deputados no grupo parlamentar defenderem uma moratória legislativa, ou seja, trata-se de travar a ação climática.

É claro que o debate democrático deve tolerar e contemplar o realismo de quem se preocupa com as consequências, diretas ou indiretas, de uma lei. Essa é uma boa prática que, naturalmente, se estende a todos os temas.

Mas não é esse o caso, nem há como confundir realismo com conformismo. O primeiro é o esforço de execução mediante as limitações da realidade; o segundo é aceitar e ajudar o atrito que impede a mudança.

Ao defender uma moratória legislativa, o PPE expõe a superficialidade do seu compromisso climático, pronto a ser despejado em segundo plano ao primeiro obstáculo. Com "aliados" destes, a ação climática não precisa de mais adversários.

O ciclista português conseguiu um impressionante pódio no Giro de Itália, uma das três provas mais importantes do desporto. João Almeida, que aos 24 anos já promete ser uma das grandes referências nacionais do ciclismo, está de parabéns.

Eurodeputado

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