O fim de Balsemão é o início de uma nova era

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Ao longo destes dias repetiram-se, de viva-voz, e também nas páginas do Diário de Notícias, as evidências que precisamos que perdurem no tempo e na História: Francisco Pinto Balsemão foi uma figura incontornável do nosso país, não apenas porque foi um acérrimo defensor da Liberdade, fundador do PSD, antigo primeiro-ministro, fundamental para a revisão constitucional de 1982 – precisamente pelo seu respeito pela democracia – mas também porque foi para nós, jornalistas, um exemplo.

Fundador do semanário Expresso e do primeiro canal privado nacional, a SIC, Pinto Balsemão era, mais do que um empresário de pulso firme, um jornalista que representa tudo aquilo que, quando começamos a entrar em redações, acreditamos ser o profissional ideal: atento, curioso, justo, corajoso, rigoroso e leal. Lembrava, constantemente, aqueles com quem trabalhava, da importância do jornalismo como guardião dos portões da frágil Democracia, algo que fazia não apenas por convicção, mas também pela própria experiência de ter lutado contra a ditadura que rejeitava a imprensa livre.

Francisco Pinto Balsemão, patriarca de uma família que é também uma empresa, deixa agora um vazio no jornalismo – no pensamento livre, na capacidade de dialogar com quem lhe era tão oposto – mas também nos negócios. Numa altura em que a Impresa, grupo atualmente liderado pelo seu filho Francisco Pedro Balsemão, negoceia com os italianos do MFE a venda de uma participação maioritária da holding familiar, o desaparecimento do fundador da Impresa marca, efetivamente, o início de uma nova era. Uma que, possivelmente, vai ver sair de mãos nacionais mais um meio de comunicação de referência, leitura obrigatória para tantos milhares de portugueses e veículo fundamental no panorama mediático nacional.

São mais do que públicas as dificuldades que os diferentes grupos de media têm atravessado ao longo da última década, sobretudo, com o mercado português a ser particularmente fustigado pela sua reduzida dimensão. A consolidação parece ser um caminho inevitável numa indústria que, apesar de fundamental, continua a não ter os apoios necessários para que possa sobreviver sem ter de dedicar grande parte da sua estrutura à prossecução dos mais elementares fundamentos dos negócios: rentabilidade, solidez e lucros. Balsemão representou também, até agora, uma espécie de resistência a esta nova norma que mostra que dificilmente um grupo de media pode viver sem outros negócios que o suportem. Não é algo que seja certo ou errado, é apenas o mundo a evoluir e nós a tentarmo-nos adaptar a alterações que ainda temos dificuldade em compreender. Mas Balsemão não só as compreendia como tentava encontrar alternativas – os problemas financeiros da Impresa não são de agora (estima-se que necessite de uma recapitalização de 80 milhões de euros) – através de diferentes estratégias de financiamento, inovação e modelos alternativos.

O fim de Balsemão marca o início de uma era para o país, naturalmente, mas para os media também. Costumamos dizer, nas redações, que não há ativo mais valioso para um meio de comunicação do que a sua memória. Se conseguirmos que a dele não se esvaia, talvez encontremos, finalmente, um novo caminho para os desafios que continuamos a ter pela frente. Guardemos a sua perseverança e curiosidade inesgotáveis como exemplo a seguir. E sigamos.

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