Juro pela minha honra

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O princípio da política, da nobre arte da política, pressupunha, noutros idos tempos, que os cargos de governação, representação de eleitores e nomeação fossem ocupados por pessoas "honradas". A honra quase desapareceu do vocabulário e é, por estes dias, uma palavra "antiga". O conceito tem definição, mas como é "apenas" um conceito, sem força de "lei", pode ser "interpretado" da forma que der mais jeito e consoante a ocasião.

Não precisamos de ir muito longe. Bastaria olhar com cuidado para as bancadas parlamentares saídas das primeiras eleições livres e compará-las com os dias de hoje. O mesmo vale para os governos. O critério de eleição para eleitos e nomeados era, antes de mais, de gente influente e com pensamento, vida profissional com provas dadas, respeito conquistado entre os pares e autoridade reconhecida pelos demais. Não eram cidadãos modelo, porque isso não existe, porque não há pessoas perfeitas, mas eram homens e mulheres distintos, no sentido em que se distinguiam. A política e os cargos públicos eram vistos como missão e nunca como profissão, como tarefa e não como ocupação, como serviço e não como benefício.

Há décadas que esse tempo passou. Os "políticos" que tomaram conta dos "aparelhos" dos dois principais partidos tornaram-se profissionais da política e, curiosamente, são ao mesmo tempo políticos muito pouco profissionais. O caminho deixou de ser feito através da profissão, da sociedade, da vida, do exemplo, do mérito, da sabedoria -- outra palavra antiga -- do reconhecimento, e a via de entrada num parlamento ou num governo, ou em outros altos cargos da administração, é feita quase exclusivamente através da escola partidária, dos alinhamentos internos, do xadrez onde se movem concelhias e distritais, do apoio que, em cada momento, o chefe da ocasião recebe das suas tropas.

Nestes quase 50 anos de democracia, o mérito, o valor, o conhecimento, o reconhecimento, deu lugar aos amigos certos, à conquista do poder interno, à "confiança pessoal", ao percurso feito para lá chegar, como se governar ou estar no parlamento fossem o justo prémio para uma vida "dedicada" ao partido.

Respeito e defendo os partidos políticos. Para que não haja dúvidas. No nosso sistema, são a estrutura, a base, a espinha dorsal da democracia. Mas se os partidos são um meio, um veículo, não devem ser nunca um fim em si mesmo. Ser um bom diretor de campanha, um fervoroso agitador de bandeiras, um chefe de claque da jota para animar arruadas, ou um assessor competente e dedicado não torna, de forma automática, o militante competente para poder vir a ser chefe de gabinete, secretário de estado ou ministro.

Este governo até tem, entre os seus ministros e secretários de estado, homens e mulheres que vieram pela primeira via, a do mérito de uma vida profissional, a do reconhecimento e da competência. Mas, depois, ficam escondidos na chamada "orgânica" do governo, acabado frustrados e desiludidos, com pouca margem de manobra e, até, muitas vezes, humilhados publicamente pela malta do "aparelho" que, no fim do dia, é quem domina a coisa.

São tão modernos que até governam por WhatsApp.

E a honra?


Jornalista

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