Tendo trabalhado como gestor numa empresa familiar e posteriormente tendo-me dedicado ao estudo das mesmas percebi a importância de olhar para estas empresas com um cuidado particular. A gestão das empresas familiares tem vários pontos de análise e áreas de estudo que lhe são específicas..Em primeiro lugar a questão da sucessão. É um processo bilateral que exige muito de quem entra, mas também de quem sai. E que dizer das competências pessoais, do conhecimento do negócio e da empresa, da formação adquirida e até da vontade em ser sucessor e da iniciativa própria? Falamos sempre de pessoas com modos de pensar e de sentir diferentes. Quem virá "depois de" é uma decisão que exige o envolvimento de todos - na empresa e na família. Ninguém é eterno. Planear bem uma sucessão é evitar um problema por antecipação. Aliás se algo aprendi com as empresas familiares é que praticamente todos os problemas se resolvem por antecipação..Depois, a questão do governo da empresa e da família. Saber gerir o todo, mas também as partes, as sensibilidades, as diferentes aptidões e apetências. A profissionalização é o grande salto qualitativo que enfrentam estas empresas, não só na questão de como a empresa deve ser gerida, na forma como a família participa ou não nessa gestão, no respeito pelos gestores externos, na forma como a empresa estabelece os seus relacionamentos hierárquicos e funcionais independentemente dos laços familiares, mas sobretudo como se vive o tema da continuidade..Por último, aquilo que se chama de Acordo de Família como corolário de uma visão de negócio e de família. Este documento em que cada família define aquilo que quer para si, criando a partir daí os órgãos e as responsabilidades que melhor se adaptam à sua forma de estar e gerir visa manter e gerir um equilíbrio familiar..Mas também existem outras áreas muito dinâmicas e menos evidentes, como seja, em primeiro lugar, a comunicação. Além da normal comunicação interna da empresa e com os seus parceiros/meio envolvente, existe a comunicação com a família. Esta tem de ser uma preocupação constante no sentido de garantir um funcionamento harmonioso de todo este ecossistema empresarial/familiar. O papel crescente dos media e sobretudo das redes sociais torna este assunto obrigatório. Quem não comunica e não está nas redes sociais pura e simplesmente é como se não existisse, mas estar implica responsabilidade e muito "savoir faire"..Também há que ter em conta a área da inovação tantas vezes temida pelo seu impacto, mas em que inevitavelmente as empresas são obrigadas a navegar. Não podemos olhar o mundo apenas com os olhos do passado acreditando que "sempre se fez assim" ainda é uma regra da gestão, se é que alguma vez o foi. Disse há dias o Papa Francisco que o empresário tem que ser criativo porque se não o for, então não é empresário..Por último as questões financeiras. O futuro é muito exigente em termos de investimento e de rentabilidade e cada acionista tem a sua vida própria, as suas necessidades financeiras e disponibilidades para investir. Por isso deve existir uma política familiar de investimento, endividamento e dividendos. É também muito importante precaver dificuldades individuais, necessidades financeiras pontuais do negócio e da família, analisar a criação de negócios complementares ou completamente diferentes do core business, situações de desinteresse face à empresa familiar e até de tirania pessoal..Deve-se evitar a corrosão por desacordos e desavenças familiares. Para tal, é importante, estabelecer os órgãos e os canais para formalizar a presença da família no negócio e os critérios a partir dos quais todos estão de acordo..Gerir uma empresa familiar não é gerir o "meu" negócio, mas sim receber um ativo da geração que nos antecedeu e torná-lo ainda melhor e mais forte para a geração seguinte..É por isso que Construir o Futuro nas Empresas Familiares é uma obrigação dos seus gestores e por isso estas empresas são diferentes.. Professor da Aese Business School e diretor do programa para empresas familiares.Autor do livro: Manual de Como Construir o Futuro nas Empresas Familiares