Caro Zé Tuga
Passados que estão cinquenta anos, continuamos a ver, ouvir e ler nas notícias, quase todos os dias - estás preso.
Estás preso! Por ter cão e por não o ter! Já não pela polícia política, mas pela política que policia e que te tem agrilhoado ao longo destes últimos anos de vivência em liberdade, passe o paradoxo.
Estás às vezes em prisão preventiva, outras vezes detido por uns tempos ou mesmo numa “falsa” liberdade, aquela de arguido, aquela na qual se pode continuar “a fazer das suas” sem que ninguém lhe chegue ao pêlo só porque é suspeito de umas coisas pouco edificantes, mas isso pouco interessa, porque o resultado final é o mesmo – estás preso!
Estás bem lixado. Mas isso já sabes há muito tempo, não é?
É assim, dizem, porque a Justiça funciona, querem-nos fazer crer, a Justiça funciona cá no País
(estará, de facto, a Justiça, a funcionar?)
Dizem os entendidos que sim, que funciona, e bradam alto e bom som que assim é que é bom, que a Justiça aplica-se a todos os cidadãos deste País independentemente do credo, cor ou orientação – política ou outra – dizem.
Mas então, já não há atrasos na apreciação dos processos, já não há prescrições, já não há colapso de plataformas informáticas, que foram instaladas para agilizar precisamente as prescrições e os atrasos, já não há falta de pessoal, de instalações condignas por esse País fora?
Afinal já corre tudo sobre rodas!
Quer isto dizer, a Justiça a funcionar, que já temos acesso rápido pronto e eficaz cada vez que precisemos de recorrer a um tribunal? Que não precisamos de esperar anos por decisões que podem afectar o correr de muitas vidas?
Estamos pois de parabéns.
A Justiça funciona, atestam os decisores e comentadores, e ainda bem que funciona, dizem. Salvaguarda o povo das más decisões pessoais desses mesmos decisores quando deixam de ser decisores, dizem.
E todos os outros, nós todos, que não têm o estatuto de decisores, ou de ex-decisores, nem colarinho branco, têm também a Justiça a funcionar?
Silêncio! dos que tanto apregoaram o funcionamento da Justiça.
Está preso, Zé!
Estás preso entre duas franjas de Oceano Atlântico a Oeste e Sul e duas franjas de terra espanhola (e bem sabemos que daí nem bom vento nem bom casamento) a Leste e Norte, ou em ilhas no meio do Atlântico, preventivamente para que não possas dizer livremente de tua justiça à Justiça que dizem estar a funcionar na perfeição.
Estás preso a séculos de atraso, crónico nas mentalidades dos decisores, para quem o continuar do estado da coisa mantem-te, preventivamente, recluso das suas incúrias.
Estás preso às políticas de adversidade que são impostas precisamente por aqueles a quem compete regular a Justiça à qual recorres em momento de necessidade e que não a deixam funcionar dizendo em casos pontuais que funciona às mil maravilhas.
Estás preso a ti próprio quando declinas a tua (sabemos que a tens) capacidade de revolta quando te sentes espezinhado.
Estás preso a um País que exporta a sabedoria que não utiliza em proveito próprio e de todos os que nele acreditam.
Estás preso, não preventivamente, mas definitivamente, ao País onde livremente escolheste viver e lutar por um futuro risonho para ti, para os teus filhos.
Estás preso, caro Zé Tuga, sem Justiça, mesmo que digam que a Justiça funciona.
E poderíamos dizer o mesmo da Educação, da Saúde, da Defesa, das Polícias, etc., etc., etc.
No ano em que comemoras o cinquentenário da tua liberdade conquistada, alguns continuam a brincar e a fazer de conta que o que é bom para uns não significa que seja bom para todos e, por isso, continuas preso, em prisão preventiva, detido por uns tempos ou mesmo até em liberdade, na liberdade de arguido, aquela na qual pode continuar a fazer das suas sem que ninguém lhe chegue ao pêlo só porque é suspeito de umas coisas pouco edificantes!
Mas, mesmo assim caro Zé Tuga, grita bem alto:
Viva a Liberdade!