Capitalismo de Estado com características americanas

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Na atual administração Trump 2.0, para além das habituais medidas fiscais e orçamentais, pacotes de estímulo económico e mecanismos regulatórios, existe um manifesto maior controlo político sobre a economia. Começou com um forte desejo de controlar também a política monetária – da responsabilidade da Reserva Federal (Fed) – com sucessivos ataques à governação do Fed e contínua pressão para que baixe as taxas de juro de referência. Acompanhado por sucessivas saraivadas de tarifas, ameaças de sanções, e perseguições a empresas e empresários de que Trump não gosta. Esta deriva para o diktat foi para além do plano económico, incluindo ações contra estados governados por Democratas, universidades, escritórios de advogados. Trump tem ainda tomado decisões inéditas nos EUA relativamente à intervenção direta em empresas. Relativamente a uma das principais empresas americanas produtoras de semicondutores, a Intel, depois de Trump ter exigido a demissão do seu CEO (que acusa de ligações à China), o governo federal converteu 8,9 mil milhões de dólares em subsídios federais previamente acordados em 10% no capital social da Intel. No mês passado, o Departamento de Defesa americano revelou que iria assumir uma participação de 15% no capital social da MP Materials, uma mineradora de minérios críticos. Atenta a justificação dada – apoiar o fortalecimento das indústrias tecnológicas, o relançamento industrial e a segurança nacional dos EUA – é provável que haja mais casos de envolvimento direto do governo americano em empresas relevantes para o sector tecnológico. Por outro lado, a venda pela Nvidia e pela AMD de alguns chips avançados à China – anteriormente proibida por razões de segurança nacional – foi autorizada por Trump contanto que 15% do valor das vendas seja pago ao governo americano. A “segurança nacional” voltou a ser postergada por razões mercantis quando Washington autorizou a aquisição da U.S. Steel pela Nippon Steel condicionada à outorga de uma “golden share” ao governo americano. Está ainda a ser preparada a criação de um invulgar fundo soberano dos EUA, que deverá deter ativos não decorrentes de superavits orçamentais, “incluindo reservas de recursos naturais” que a Forbes estima serem “potencialmente mais de US$ 100 biliões”. E há ainda os elevados montantes (1,5 biliões de dólares) de investimento estrangeiro nos EUA prometido por blocos económicos (UE, Japão, Coreia do Sul) que Trump já anunciou planear dirigir pessoalmente.

Quiçá no seu afã de emular líderes estrangeiros que lhe são queridos, a intervenção direta do governo de Trump em empresas privadas, na sua gestão e nos seus negócios e o cada vez maior controlo político da economia, estão a fazer os EUA caminhar a passos largos para um capitalismo de Estado com características americanas.

Consultor financeiro e business developer www.linkedin.com/in/jorgecostaoliveira

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