A Ucrânia afasta o PCP das OVNI
Nada diverte tanto os anticomunistas do que a recorrente desculpa “não resultou porque não era o comunismo real”. E embora os comunistas portugueses nunca tenham conseguido impor o seu regime, evitando que viéssemos a descobrir o que teria sabotado a sua perfeição até deixar o habitual rasto de miséria e opressão, o PCP nunca desilude na explicação dos fracassos.
Nos últimos dias, antes e durante o congresso que prepara um ano difícil, não faltaram referências à “má interpretação” das posições do partido sobre a invasão da Ucrânia. Nas palavras de vários dirigentes, houve uma dolosa compreensão do “pacifismo” que irradia da Soeiro Pereira Gomes, onde se pugnou pela negociação com Putin com tal fervor que se pode adivinhar que, munidos de uma máquina do tempo, instariam Estaline a fazer um segundo pacto Molotov-Ribbentrop com Hitler, poupando a Europa à contra-ofensiva que levou à conquista de Berlim.
Por muito que os dirigentes comunistas martelem os factos, a forma como reagiram à invasão russa é uma mancha que não sai. E causa piores danos do que os apoios à ditadura convicta de Havana e à ditadura sonsa de Caracas. A erosão eleitoral do PCP não começou com o silêncio perante as atrocidades na Ucrânia, mas essa atitude isolou-o ainda mais. Basta recordar como Mariana Mortágua, que na véspera apoucava Zelensky, condenou a agressão desde a primeira hora. Ou como André Ventura se adiantou à ala russófila do Chega.
No próximo ano, um PCP reduzido a quatro deputados na Assembleia da República e em que João Oliveira garantiu representação no Parlamento Europeu in extremis, enfrenta um teste difícil à sua relevância política.
Como o DN explicou, 12 das 19 câmaras municipais da CDU perderão os atuais responsáveis, por limitação de mandatos. Isso põe em risco Évora, Palmela, Alcácer do Sal e Grândola, com o regresso de Dores Meira, agora independente, a ter idêntico efeito em Setúbal.
A tão famélico cenário, Paulo Raimundo e outros dirigentes contrapõem possíveis reconquistas de autarquias que foram comunistas até 2021, com Loures à cabeça. Mas a tendência de esvaziamento da base eleitoral do PCP é inclemente ao ponto de serem meras Oportunidades de Vitória Não Identificáveis, tão prováveis quanto o avistamento do tipo de OVNI proveniente de outra galáxia.
Grande repórter do Diário de Notícias