Fiscalistas saúdam decisão do Supremo sobre tributação de mais-valias

Os fiscalistas contactados pela Lusa consideram que a decisão recente do Supremo Tribunal Administrativo (STA) relativamente à tributação de mais-valias em sede de IRS vem resolver os diferendos com o Fisco nesta matéria.
Publicado a
Atualizado a

\tA Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) liquidou mais de 155 mil euros a um contribuinte a título de tributação de mais-valias decorrentes da venda de ações de uma empresa, uma situação que foi contestada junto do STA, que deu razão ao queixoso.

\tO STA concluiu que se trata de situação de "retroatividade autêntica", proibida constitucionalmente, pelo que as mais-valias em causa "estão excluídas de tributação, sendo, por isso, ilegal a liquidação que sobre elas incidiu".

\tO advogado da SRS Legal João Maricoto Monteiro disse à Lusa que esta decisão é "perfeitamente adequada e correta", permitindo que, daqui para a frente, "sempre que haja uma alteração na lei fique claro que só terá efeito sobre as mais-valias alienadas após a entrada em vigor na lei".

\tTambém os fiscalistas Mariana Gouveia de Oliveira e João Ascenso, da Miranda, entendem que "é muito positivo que o STA tenha proferido um acórdão uniformizador de jurisprudência relativamente a uma matéria que tem sido tão controvertida desde 2010", uma vez que a decisão "vem finalmente dar alguma segurança jurídica" aos agentes económicos, aos fiscalistas e à própria AT.

\tOs advogados referem que esta decisão do STA é "a única conforme a tutela da confiança e segurança jurídica imposta pela Constituição".

\tMariana Gouveia de Oliveira e João Ascenso afirmam que, tecnicamente é a decisão mais correta porque "o cálculo da mais-valia é feito por referência ao momento da venda", que é "o momento relevante para a incidência do imposto".

\tTanto os fiscalistas da Miranda como o da SRS Legal referem ainda "a necessidade de tutela das legítimas expectativas dos contribuintes", que não estariam salvaguardadas se se entendesse que a lei nova era aplicável a ganhos resultantes de negócios concluídos antes da entrada em vigor da nova lei.

\tNuma 'newsletter' da RFF Advogados enviada na quarta-feira, o fiscalista Rogério Fernandes Ferreira concorda com a decisão do STA e defende que "o facto gerador do imposto deve ser localizado no tempo de acordo com a respetiva norma de incidência e não de acordo com uma norma de determinação do rendimento coletável".

\tA decisão da AT de liquidar a este contribuinte 155.588,29 euros a título de mais-valias mobiliárias foi feita em 2014 com base na lei 15/2010, que entrou em vigor em 27 de julho daquele ano. No entanto, a operação ocorreu a 12 de março de 2010, antes da entrada em vigor daquela lei, o que levou o contribuinte a recorrer ao STA.

\tAté à entrada em vigor da lei 15/2010, as mais-valias geradas por valores mobiliários estavam excluídas de tributação desde que verificadas determinadas condições, um regime que foi revogado com aquela lei que passou a tributar aquele rendimento à taxa de 20%.

\tO que estava em causa neste diferendo era saber se se tratava de cobrar impostos retroativamente, como argumentou o queixoso, ou se a lei de 2010 se aplica a todos os rendimentos apurados ao longo daquele ano, como defende a Autoridade Tributária, considerando que "a anualidade do IRS conduz necessariamente à aglutinação de todos os factos gerados e dos rendimentos que se verifiquem até 31 de dezembro do período em causa".

\tO STA entendeu que, uma vez que o legislador se limitou a definir a data de entrada em vigor da lei "sem estabelecer qualquer norma que permitisse a sua aplicação a um período tributário anterior, cabe "necessariamente aplicar a regra geral que rege a aplicação da lei fiscal substantiva no tempo" vertidas no artigo 12.º da Lei Geral Tributária (LGT), que determina que "as normas tributárias se aplicam apenas aos factos posteriores à sua entrada em vigor".

\tNo acórdão, o STA sublinha que "ocorreu a aplicação de lei nova a factos tributários de natureza instantânea já completamente formados em momento anterior à data da sua entrada em vigor", tratando-se por isso de uma situação de "retroatividade autêntica", proibida constitucionalmente.

\tAssim, o STA entende que as mais-valias em causa "estão excluídas de tributação, sendo por isso ilegal a liquidação que sobre elas incidiu".

\t

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt