Yevgeny Prigozhin já não invectiva as chefias militares russas. Igor Girkin, também conhecido como Strelkov, condenado à revelia em Haia pelo derrube do voo MH17 que matou 298 pessoas, acabou preso e portanto silenciado em julho, não por crimes de guerra, mas depois de ter classificado a liderança de Vladimir Putin de "mediocridade cobarde". Os opositores políticos que decidiram ficar no país como Vladimir Kara-Murza ou Alexei Navalny há muito enfrentam longas penas de prisão em condições que associação alguma de defesa dos direitos humanos russa pode reclamar nem meios de comunicação para as relatar..Com o regime cada vez mais autoritário não há quem se desvie da linha para questionar publicamente as afirmações do homem que há mais de duas décadas dirige a Rússia, como presidente ou como primeiro-ministro. Junto do presidente turco Recep Tayyip Erdogan, desvalorizou a contraofensiva ucraniana - "um fracasso". Mas são vários os sinais de que na Rússia os dias estão longe de correr de feição..DestaquedestaqueKiev atacou o moral de Moscovo ao divulgar o apelo do capitão desertor para que outros russos sigam o seu exemplo. Segundo a secreta militar ucraniana, foi o culminar de uma operação que durou meses..Nas mais recentes declarações, Putin voltou a um tema ideal para distrair: a religião do presidente ucraniano. No passado recente os comentários do ministro Sergei Lavrov sobre o "sangue judeu" de Adolf Hitler a propósito de Volodymyr Zelensky ser judeu tornou-se num embaraço que levou o líder russo a pedir desculpas ao então primeiro-ministro israelita Naftali Bennett. Agora é o próprio Putin a voltar à carga ao acusar o Ocidente de ter instalado, "ao nível mais repugnante", o antigo ator no poder, de raízes judaicas, para "encobrir a glorificação do nazismo" e uma "essência anti-humana que é a base do Estado ucraniano moderno". A justificação de Putin para a "operação militar especial" é o pretenso "genocídio" de ucranianos russófonos por parte de neo-nazis, daí a alegada "desmilitarização" e "desnazificação" em curso..No terreno, na zona sudeste da frente em Zaporíjia, Kiev diz ter superado a primeira linha defensiva russa e que está agora a tentar romper a segunda linha numa zona com uma densidade de minas mais baixa. Enquanto o ministro da Defesa russo Sergei Shoigu nega os avanços ucranianos, em sintonia com as afirmações da véspera de Putin, ainda ressoam as declarações de um piloto russo que desertou e que instou os compatriotas a seguirem o seu exemplo..O capitão Maksym Kuzminov, de 28 anos, voou para território ucraniano num helicóptero Mi-8 no mês passado. Agora, em declarações aos serviços secretos militares ucranianos, o militar russo explicou num vídeo publicado no YouTube a decisão de não querer envolver-se em crimes de guerra e apelou para outros pilotos russos seguirem o seu exemplo..Em troca da sua segurança e da sua família, os serviços ucranianos ofereceram-lhe novos documentos e uma compensação financeira numa operação que durou meses e exigiu "máximo sigilo" porque a Rússia utiliza "medidas sem precedentes" para não permitir que os seus pilotos tenham qualquer contacto com pessoas "não verificadas", revelou a secreta militar ucraniana.."Vocês não se vão arrepender de forma alguma. Terão absolutamente tudo para o resto da vida", desafiou Kuzminov no vídeo, dirigindo-se aos pilotos russos. De acordo com o vídeo, Kuzminov ficou ferido após a aterragem, mas recebeu assistência médica a tempo. Os serviços secretos ucranianos confirmaram que outros dois tripulantes morreram após se terem recusado a render. Segundo Kiev, Kuzminov forneceu informações "muito valiosas sobre as aeronaves, sistemas de comunicações e rede de campos de aviação do exército inimigo"..DestaquedestaqueDepois de os serviços militares britânicos terem informado que Moscovo está a tentar recrutar arménios e cazaques, o governo cubano revelou estar a pôr fim a uma rede de tráfico humano que levava cubanos para combater na Ucrânia..Além da perda do helicóptero e dos três tripulantes, há uma derrota simbólica. Tendo em conta as deserções que se registaram há meses, a incerteza sobre os combatentes do grupo de mercenários Wagner e as perdas humanas em combate - Washington calcula que de um e de outro lado haja meio milhão de mortos e feridos -, a liderança russa tenta preencher as vagas como pode. O vice-presidente do Conselho de Segurança russo Dmitri Medvedev informou que desde o início do ano entraram nas fileiras das forças armadas 280 mil pessoas, enquanto as autoridades tentam evitar uma impopular mobilização geral..Há dias, os serviços secretos militares britânicos disseram que Moscovo está a tentar recrutar na Arménia e no Cazaquistão através de publicidade online. E agora o governo cubano anunciou estar a pôr fim a uma rede de tráfico de pessoas recrutadas para lutarem como mercenários na Ucrânia..Havana, que tem feito eco dos pontos de vista da propaganda de Moscovo sobre a guerra na Ucrânia, não mostrou aqui qualquer resquício de solidariedade internacionalista e anunciou estar a trabalhar para o desmantelamento da rede. "Cuba não faz parte do conflito armado na Ucrânia", lembrou o Ministério dos Negócios Estrangeiros, tendo afirmado que "está a agir e agirá energicamente" contra quem "participe em qualquer forma de tráfico de seres humanos com o objetivo de recrutamento para que os cidadãos cubanos possam usar armas contra qualquer país"..Enquanto o comunismo cubano rejeita interferir na guerra, já o norte-coreano poderá revelar-se um precioso aliado para Moscovo. Limitada pelas sanções económicas, a Rússia estará a preparar a visita de Kim Jong-un a Vladivostok. Ao contrário de Havana, Pyongyang tem estado do lado russo nas Nações Unidas e agora estará a preparar-se para vender munições para artilharia e matérias-primas para a indústria de defesa russa.."Diz muito da Rússia ter que recorrer a um país como a Coreia do Norte para reforçar as suas capacidades de defesa", comentou conselheiro para a Segurança Nacional dos Estados Unidos Jake Sullivan, um dia depois de o The New York Times ter avançado a notícia da viagem de comboio do ditador norte-coreano. Vladivostok acolhe, entre os dias 10 e 13, o 8.º Fórum Económico do Oriente..cesar.avo@dn.pt