No final da década de 70 e início de 80 surgiram em Portugal as primeiras cooperativas de habitação. O objetivo era dar resposta às necessidades de habitação de famílias de classe média baixa que não tinham a possibilidade de comprar uma casa. Uma solução que Jorge Raposo, presidente da Cooperativa Giraldo Sem Pavor, entende poder ser uma hipótese a analisar para ajudar na crise de habitação que se vive atualmente..As cooperativas de habitação permitem o acesso a habitação a custos controlados (HCC), pois são casas construídas com o apoio financeiro do Estado, que concede benefícios fiscais e financeiros para a sua promoção. Na altura em que surgiram as cooperativas os terrenos para estas construções eram cedidos pelas câmaras municipais e existia ainda o apoio da parte do atual Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana que ajudava na preparação dos processos para a construção.."A cooperativa não persegue o objetivo final do lucro. Em termos de vantagens temos a redução do IVA para 6% e a isenção de pagamento do IRC", explica ao DN Jorge Raposo, presidente da Cooperativa Giraldo Sem Pavor, que tem a sua base em Évora. Para ter estas benesses, as cooperativas têm a obrigação de construir dentro do código da habitação a custos controlados e não podem ultrapassar as áreas estabelecidas para os vários imóveis..A Cooperativa Giraldo Sem Pavor já tem quase 40 anos e ao longo deste tempo já construiu mil casas a custos controlados. "Estas casas de facto resolvem total ou parcialmente um problema da habitação", afirma Jorge Raposo..O presidente da Giraldo Sem Pavor explica que nos últimos anos as cooperativas deixaram de ter tanto apoio das câmaras municipais em termos de terrenos pois as próprias autarquias começaram a ficar sem espaços para doar.."Estas habitações são construídas em zonas que ainda não estão infraestruturadas e portanto temos de fazer um projeto desde essa fase. É um processo difícil moroso, caro e muito exigente", sublinha. Os preços de construção têm vindo a aumentar com o impacto dos sucessivos aumentos de juros, o que depois vai afetar o valor final da construção..Algumas cooperativas de habitação em funcionamento em Portugal são a Cooperativa Cortel (Madeira), a HabitaRegen (Grande Lisboa), a Cooperativa de Habitação e Construção de Cedofeita (Porto) e a Giraldo Sem Pavor (Alentejo). Apesar de ter Évora como base, a Giraldo Sem Pavor está a construir em Beja, Reguengos de Monsaraz, Vendas Novas e no concelho de Arraiolos. Depois da crise financeira de 2008 várias cooperativas faliram e desapareceram e este presidente entende que neste momento não há condições para nascerem novas..Jorge Raposo considera que a cooperativa a que preside tem ajudado a resolver os problemas de habitação nas zonas em que intervêm e que esta pode ser a solução para o problema de habitação que se vive atualmente em Portugal. "Não vejo no quadro atual outras soluções, a não ser que sejam as câmaras a promover diretamente a construção. Trabalho com várias autarquias que sei que não têm todas as condições para fazer isso". Jorge Raposo considera mesmo que, a longo prazo, as cooperativas de habitação podem ser a chave principal para resolver parte da questão da habitação..A guerra na Ucrânia, a crise energética, a subida da inflação e o aumento dos juros do crédito à habitação levaram o Governo a apresentar, no dia 16, o programa "Mais Habitação" onde apresenta o que consideram ser algumas soluções para o problema da habitação. O Executivo quer aumentar a oferta de imóveis para habitação, em que uma das medidas inclui disponibilizar terrenos para cooperativas ou privados fazerem habitações a custos acessíveis. O executivo pretende também simplificar o licenciamento, aumentar o mercado de arrendamento, combater a especulação e apoiar as famílias com medidas quer no contrato de arrendamento quer no crédito à habitação. Este pacote está em consulta pública até 10 de março..No entanto, as cooperativas consideram que existe demasiada burocracia e pouco apoio das câmaras. "Antigamente o Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana tinha uma estrutura que de facto apoiava as cooperativas, preparava-lhes e estudava o processo de financiamento e acompanhava-os na promoção. O que depois conjugado com o apoio das câmaras permitia que as cooperativas funcionassem", diz Jorge Raposo..Além do excesso de burocracia que pode levar projetos a ficar em pausa durante vários anos, as cooperativas são confrontadas com a demora dos processos junto de infraestruturas importantes para avançar os projetos em terrenos que ainda têm de ser preparados para receber habitação..sara.a.santos@dn.pt