Suriname. A arquitetura colonial holandesa
Mala de viagem (173). Um retrato muito pessoal do Suriname

Um edifício de madeira, restaurado e respeitando o estilo colonial holandês, sobressai no centro histórico da cidade de Paramaribo, capital do Suriname. O que mais me impressionou quando cheguei ali foi a magnífica arquitetura colonial ainda presente. Porém, cresce a opinião entre os surimaneses de que se deveriam demolir os originais e reconstruir semelhantemente, o que é um paradoxo. Remonta a meados do século XVII a primeira colonização, pelos ingleses, a que se seguiram disputas entre holandeses e ingleses. Em 1667, os holandeses decidiram manter a colónia de plantações do atual Suriname conquistada aos ingleses, decorrente do Tratado de Breda. Estes ficaram com Nova Amesterdão, que mais tarde se tornou a cidade de Nova Iorque, nos Estados Unidos da América. A escravatura foi abolida pelos holandeses, em 1863, mas os escravos não foram totalmente libertados até 1873, após um período de transição obrigatório de 10 anos, durante o qual foram obrigados a trabalhar nas plantações por um pagamento mínimo e sem tortura sancionada pelo Estado. Assim que se tornaram verdadeiramente livres, eles abandonaram em grande parte as plantações a favor da cidade. Mais recentemente, os holandeses libertaram a sua colónia para se tornar no Suriname (1975). Apesar das duras condições sob o domínio colonial, os surinameses abraçaram com entusiasmo a cultura e a língua holandesas. Este segmento é focado na arquitetura. Os vestígios materiais refletem muitas vezes o hibridismo complexo do contexto colonial e, em alguns casos, até formam símbolos nacionais fortemente influenciados pelas culturas locais. A arquitetura colonial é, muitas vezes, resultado de adaptações climatológicas ou do uso de materiais de construção locais e, ainda, dos contextos culturais ricos e diversos. É neste hibridismo que reside a qualidade destes edifícios. A arquitetura mostra que a estrita taxonomia racial de um sistema colonial não poderia ser mantida. Os edifícios coloniais ainda existentes no Suriname ficam no centro histórico e comercial da capital, listado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). Paramaribo tem mais de metade da população do país, uma população multiétnica composta por uma mistura de povos indígenas sul-americanos, indianos, indonésios, chineses, europeus e descendentes de escravos africanos. Um dos aspetos mais exclusivos da cidade reside, sem dúvida, no facto de tantas pessoas de múltiplas etnias e origens culturais viverem juntas pacificamente. Um problema persistente é a decadência dos antigos edifícios característicos que tornam a cidade única para os turistas. Muitas medidas são tomadas pelo Governo para minimizar esse problema, incluindo o restauro meticuloso de edifícios antigos. A arquitetura colonial holandesa é um bem representativo, e a maior parte do tecido urbano de Paramaribo, datado de 1680-1800, ainda sobrevive, principalmente devido ao baixo crescimento económico. O padrão urbano original ainda é autêntico em relação ao ambiente construído histórico, porque nenhuma grande mudança de estrutura ocorreu. Porém, muitos dos edifícios classificados apresentam elevada autenticidade, devido à utilização de técnicas e materiais tradicionais nas obras de reparação e reabilitação. Só que algumas construções de madeira têm sido substituídas por outras em betão. Será necessário pensar que nós não fomos feitos para o fingimento e sim para a autenticidade, porque mais cedo ou mais tarde é quem realmente somos que fica em evidência, tal como as cidades e a arquitetura.
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Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.