PJ investiga texto sobre eleições internas no PS
A Polícia Judiciária vai ter de decidir se um dos seus inspetores-chefes violou os deveres de isenção e imparcialidade do código deontológico dos trabalhadores da polícia criminal ao partilhar nas redes sociais um longo texto dedicado às eleições internas no PS. O inspetor-chefe Paulo Ferrinho escreveu que, "atendendo às condições políticas do país" e "à possível polarização de votos em vários partidos", o ex-ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos é o candidato à sucessão de António Costa "que melhor, no PS, reúne as condições de agregar as esquerdas a 11 de março de 2024", dia seguinte ao das próximas legislativas.
Fonte da Direção Nacional da Polícia Judiciária confirmou ao Diário de Notícias que o texto partilhado por Paulo Ferrinho no Facebook e LinkedIn será avaliado em sede de potencial violação do código deontológico. Em causa está o artigo 7.º, relativo aos deveres de isenção e de imparcialidade, no qual se lê que "os profissionais da PJ tratam de forma equidistante e imparcial todos os cidadãos e atuam segundo rigorosos princípios de neutralidade, abstendo-se da prática de qualquer ato que possa pôr em causa a liberdade da sua ação e a independência do seu juízo".
O texto de Paulo Ferrinho, onde defende que "Pedro Nuno Santos é o único capaz de agregar as esquerdas para poder formar Governo" e que José Luís Carneiro "não tem, ainda, os apoios no partido e sociedade civil, nem dimensão nacional que possa ombrear e concorrer, em igualdade de circunstâncias, com Luís Montenegro", será analisado pela Direção de Serviços de Disciplina e de Inspeção da Polícia Judiciária (PJ), dirigida pela procuradora-geral adjunta Luísa Carrajola.
Ainda sem conhecimento oficial de que o seu texto será analisado por esse órgão da polícia criminal, Paulo Ferrinho recusou, em declarações ao Diário de Notícias, que tenha cometido qualquer violação do código deontológico dos trabalhadores da PJ. "Não faço nenhum apoio a Pedro Nuno Santos", defende, argumentado que só fez uma análise, "enquanto cidadão ativo".
"Se ler bem o texto, tem a ver com clarificação política", defende o inspetor-chefe, para quem "pessoas sérias e intelectualmente honestas" não podem dizer que aquilo que escreveu viola os deveres de isenção e de imparcialidade.
Realçando que não trabalha na área da investigação de crimes económicos, Ferrinho também garante não ficar minimamente condicionado no seu trabalho pelo que escreveu. "Se os inspetores da PJ não puderem, enquanto cidadãos, ter liberdade de expressão é que passam a ficar com a sua capacidade diminuída", disse ao Diário de Notícias, acrescentando que o código deontológico não pode ser "um voto de silêncio e de clausura".
Não sendo a primeira vez que se envolve em polémicas devido a intervenções públicas, tendo sido alvo de um processo judicial quando foi mandatário de uma candidatura autárquica em Penafiel, diz-se "completamente tranquilo". Até porque "está claramente no texto que não sou militante do PS".
O inspetor-chefe, que ganhou notoriedade ao entrevistar o ex-primeiro-ministro José Sócrates para um canal de YouTube, faz no texto que será agora analisado "um pedido especial" a Pedro Nuno Santos: "Rogo que se modere, sem deixar de ousar, que saiba escutar sem deixar de decidir, que se saiba rodear de pessoas de mérito e excelência, gente de coragem, distanciamento e desprendimento de interesses, no sentido de lhe dizerem "não" antes de cometer erros, capazes de travá-lo da explosividade, evitando-se futuros pântanos e atos de contrição de renegação publica de amizades, mitigando-se, antecipadamente, a sua impulsividade política e alguma imaturidade relacional."
Ferrinho foi responsável pela Unidade Local de Investigação Criminal de Évora até maio. Pediu exoneração, invocando motivos pessoais, na sequência de um processo em que foi acusado pelo Ministério Público de seis crimes, incluindo um de ofensa à integridade física qualificada, por alegadas agressões a outro inspetor da PJ.