Durante o dia de ontem, o dólar chegou a valer 4,06 reais, a mais alta cotação desde a introdução da moeda brasileira, em 1994. O anterior recorde era de Outubro de 2002, quando cada dólar equivaleu a 4,005 reais a meio do dia mas fechou a sessão abaixo da meta simbólica de quatro reais. A instabilidade política no Brasil, a possibilidade de alta dos juros nos EUA e uma visita da agência de classificação de risco Fitch ao país são as causas apontadas para o descarrilamento..Eram 13.35 no Brasil - 17.35, em Portugal - quando o dólar atingiu o seu ponto mais alto num dia em que a Bovespa, bolsa de valores de São Paulo, sofreu queda generalizada de ações. Para o nervosismo contribuiu sobretudo a tensão política entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional brasileiro..Por um lado, a equipa económica de Dilma Rousseff, do Partido dos Trabalhadores, apresentou recentemente um pacote de medidas de austeridade que o poder legislativo, em rota de colisão com a presidente, ameaça chumbar nos próximos dias. Por outro, os congressistas devem ignorar os vetos presidenciais às chamadas "pautas-bomba", projetos de iniciativa parlamentar que tem impacto de 26 mil milhões de reais (cerca de sete mil milhões de euros) na economia.."As dificuldades que o Governo enfrenta no Congresso Nacional tornam o país praticamente ingovernável do ponto de vista orçamental", resumiu o analista da SLW Paulo Gracia Correa à Globo News..A tensão política nacional ainda é agravada por notícias de Washington sobre a possibilidade do aumento das taxas de juro pela Federal Reserve, o banco central dos EUA. A elevação das taxas, mantida em mínimos históricos durante a crise global, deve atrair recursos para os EUA e retirar dólares do Brasil, o que incentiva a alta da cotação da moeda..Em paralelo, membros da Fitch, agência de classificação de risco, reuniram-se ontem com o Ministro da Fazenda, o independente Joaquim Levy, aumentando os rumores de corte da nota do Brasil - a Standard & Poor"s já retirou o selo de bom pagador do país no início do mês. Em sentido contrário, porém, executivos da Moody"s afirmaram em Nova Iorque que não tencionam a breve prazo penalizar a economia brasileira com a retirada de grau de investimento..De acordo com estudo do economista-chefe da TOV Corretora, Pedro Silveira, o real é a segunda moeda mundial que mais caiu - 67 por cento - face ao dólar ao longo do último ano. Só o rublo russo desvalorizou mais - 72,37 por cento - mas neste caso tendo em conta a queda abrupta do preço do petróleo e as sanções internacionais aplicadas na sequência da guerra na Ucrânia. As moedas da Colômbia, Turquia, Malásia e Noruega estão nos lugares seguintes da lista de maiores perdas.."A situação é um poço sem fundo", resumiu Pedro Silveira à revista brasileira Exame. "A queda do nível de atividade intensifica-se, as expectativas em relação ao futuro retardam as decisões de gastos das famílias e das empresas, a queda da atividade piora a arrecadação do governo, essa queda da arrecadação amplia o déficit público e isso piora as expectativas"..Com a queda do real face ao dólar, outros dados vindos a público não surpreendem: no mês de Agosto, os gastos internacionais dos brasileiros tiveram queda de 46 por cento. Por outro lado, registou-se uma diminuição do investimento em fundos na ordem dos 70 por cento no mesmo mês.