Execução da bazuca europeia afetada pela crise política é "a última coisa de que precisávamos"

As palavras são de António Costa Silva, o empresário a quem o primeiro-ministro pediu que desenhasse as linhas estratégicas para o país até ao final da década. O responsável falava esta tarde na conferência anual da AICEP, em Coimbra, onde defendeu ser necessário recapitalizar as empresas.

A programação da Conferência Anual da AICEP, este ano dedicada ao tema das Exportações e Investimento, continuou na tarde desta segunda-feira com a intervenção de António Costa Silva. O presidente da Comissão Nacional de Acompanhamento do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) elencou alguns dos desafios e oportunidades que o país enfrenta ao nível do crescimento económico. "Somos um país que não tem capital, é um dos maiores problemas que temos", começou por dizer. A par da falta de recursos financeiros para investir, Costa Silva aponta ainda o funcionamento em "silos" da economia como obstáculo ao desenvolvimento das contas nacionais.

Embora veja no PRR e no próximo quadro comunitário, o Portugal 2030, instrumentos "importantes", fez questão de lembrar as condicionantes impostas pelo contexto internacional. Entre elas, os problemas relacionados com as cadeias de abastecimento, o aumento do custo do frete marítimo e ainda os custos de energia e matérias-primas. Costa Silva garante ser necessário implementar e executar a bazuca europeia com rapidez e eficácia, até porque, diz, "a última coisa de que precisávamos era que a aplicação do PRR e do Portugal 2030 fosse afetada".

O sucesso destes programas comunitários é fundamental, já que em todo este século, recordou, "a economia portuguesa esteve estagnada". Para que esse cenário possa ser invertido, há três pontos que o empresário defende ser preciso atentar: a falta de qualificações, a operacionalização do banco de fomento e a mudança do tecido produtivo. "Não vamos dar um salto significativo se continuarmos a exportar o que já exportamos", afirma. Sugere, por isso, uma aposta no campo da saúde e da ciência, considerando que "o país pode ser uma das fábricas de medicamentos da Europa".

Em plena transição energética e digital, a digitalização é uma das prioridades que deve preocupar toda a sociedade, segundo António Costa Silva. "Os dados vão mudar a economia do futuro", acredita, reforçando que o país tem "competências nestas áreas" nas empresas e nas universidades que deve aproveitar. "Não há retoma económica sem pessoas, sem conhecimento e sem tecnologia", remata.

Aposta na qualificação

Sobre a falta de recursos financeiros para alavancar maiores investimentos e apostar em reformas profundas, o secretário de Estado da Internacionalização reconhece a dificuldade e diz mesmo que Portugal "continua a ser um país com forte escassez de capital". "Tem um elevado nível de dívida pública, de dívida privada e que tem, por isso, fortes restrições ao investimento", analisa Eurico Brilhante Dias. Apesar de apontar que nunca foi construída uma "capacidade endógena de geração de capital" na economia nacional, o governante é otimista em relação ao futuro e aponta o tema das qualificações como essencial para um crescimento económico forte e sustentado.

"O país tem feito, nos últimos 25/30 anos, um esforço muito significativo na qualificação dos portugueses", defende, acrescentando que Portugal é capaz hoje de competir com outros países europeus nas qualificações das pessoas com até 50 anos. Existe, porém, uma "parte da força de trabalho" que ainda não tem as competências necessárias para alavancar o desenvolvimento económico desejado. Em sentido contrário, a existência de trabalhadores com excesso de qualificações para os postos de trabalho que ocupam cria "frustração" que leva a maiores níveis de emigração, perdendo o país talentos em cuja formação investiu.


Estes são obstáculos a um desempenho mais positivo da economia nacional que importa endereçar ao longo dos próximos anos e em que os fundos comunitários do PRR e do Portugal 2030 podem ter um papel relevante.

Crescimento das exportações

A sessão de encerramento de mais uma edição da Conferência Anual da AICEP contou com a presença de Pedro Siza Vieira, que aproveitou o momento para destacar o aumento "exponencial das exportações" na última década e para contrariar a ideia de que o crescimento económico deste século tenha sido "medíocre". Segundo o ministro da Economia e da Transição Digital, em 2015 as exportações portuguesas representavam cerca de 30% do PIB, um valor que subiu para 44% do PIB em 2019 e que em parte foi sustentado por bens e serviços com uma forte componente tecnológica.

Para o ministro, há questões fundamentais que importa resolver para que Portugal possa conquistar taxas de crescimento elevadas que permitam reduzir a dívida pública, dinamizar o tecido empresarial e apoiar novos investimentos. "Temos limitações do ponto de vista das nossas contas públicas", diz, detalhando que "no ano passado [a dívida pública] voltou a ultrapassar os 130% do PIB" em consequência da pandemia.

Um desses desafios passa pela modernização da administração pública, que está "mais envelhecida, menos capacitada e muito atrasada na utilização de tecnologia", que torna o Estado menos capaz de dar resposta às necessidades das empresas. "Precisamos de melhorar a forma como a administração pública utiliza a tecnologia", pede. É preciso mais eficiência e eficácia, duas características que podem ser impulsionadas através da aplicação do PRR. "Vou continuar a acelerar estes processos", assegura.

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