O ucraniano que representou Portugal e agora treina em Angola

Viktor Tchikoulaev. Antigo andebolista de ABC de Braga, Sporting e Benfica foi internacional soviético e... português. Orienta o Interclube mas tem o coração na Cidade dos Arcebispos.
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Viktor Tchikoulaev foi dos principais nomes do andebol português das décadas de 1990 e 2000. Brilhou no ABC de Braga (em duas passagens pelo clube) e no Sporting, teve uma curta passagem pelo Benfica e, já no final da carreira, vestiu as camisolas do AC Fafe e do Francisco Holanda. Foi ainda internacional português, tendo participado em vários Europeus e Mundiais, incluindo o Campeonato do Mundo de 2003, que se realizou em Portugal.

Ainda que com menos protagonismo, começou a carreira de treinador depois de terminar a de atleta. Esteve no Francisco Holanda, Sporting da Horta, Marítimo e pelos espanhóis do Mecalia Atlético Novás antes de ter emigrado para Angola. Primeiro para orientar a equipa feminina do 1.º Agosto, agora para liderar os seniores do Interclube. "É um projeto muito ambicioso, que está na I Divisão. É um clube com muita história, muito parecido com o 1.º Agosto, que era o clube dos militares. O Interclube é o clube da polícia nacional", começou por narrar ao DN.

A época está prestes a começar, mas o antigo central já trabalha desde setembro. "A seleção de Angola estava a disputar a qualificação para o Mundial 2019 e tinham alguns jogadores nossos, e nós apoiámos de fora. Felizmente, conseguiu o apuramento", continuou, contando que está naquele país há quatro anos. "Estou muito contente, fui muito bem recebido e há aqui boas condições de trabalho, mas ainda há diferenças em relação à Europa", afirmou, satisfeito com a vida em Luanda. "É como em todo o mundo, tem coisas boas e outras menos boas. A mudança de Presidente da República deu esperança a toda a gente. Todos acreditam que a vida social e económica vai melhorar. Material para melhorar a vida não falta, mas falta orientação", considerou o luso-ucraniano, que trabalha de sol a sol. "Acordo às quatro da manhã, saio de casa e oriento o primeiro treino às 06.30, por causa do calor. Fico no clube o dia todo. Às 16.00 começa o segundo treino e o trabalho só acaba de noite. Chegamos a casa e preparamos o trabalho do dia seguinte", descreveu o agora técnico, 53 anos.

Mágoa por falhar Jogos de 2004

Viktor Tchikoulaev começou a jogar andebol em idade de adolescente em Odessa, na Ucrânia, seguindo mais tarde para um centro de formação em Moscovo. Ainda antes de sonhar com a vinda para o nosso país, foi internacional pela União Soviética e conquistou o título mundial em 1985.

Cinco anos depois, chegou a Portugal oriundo do Kuntsevo Moscovo, para atuar no ABC de Braga, a convite do treinador búlgaro Pavel Djenev. Pelo clube da Cidade dos Arcebispos foi tricampeão nacional entre 1991 e 1993, ajudou a equipa a chegar à final da Taça dos Campeões Europeus em 1993-94 e tornou-se internacional... português. "Foi com todo o orgulho que aceitei a proposta de me naturalizar. Como jogador profissional, encarei essa possibilidade com todo o respeito, orgulho e compromisso. Não houve qualquer problema e continuei a trabalhar da mesma forma", vincou, confessando que a grande mágoa da carreira foi precisamente não ter participado nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, ao serviço de Portugal: "Quando Portugal organizou o Campeonato do Mundo, em 2003, tinha grandes expectativas e o objetivo de assegurar uma vaga nos Jogos Olímpicos. Não conseguimos. Pouca gente avaliou o que aconteceu. Tínhamos todas as possibilidades. Foi pena. Seria a cereja no topo do bolo de qualquer jogador profissional. Custou muito."

Com Vale e Azevedo no Benfica

O ABC de Braga, clube que deixaria em 1995 para representar o Sporting e para o qual voltou em 1999, é o que tem mais espaço no coração de Tchikoulaev. "Sem dúvida. Passei lá dez ou 11 anos como jogador profissional, foi o meu primeiro clube no andebol português. Vai ficar sempre na minha memória e no meu coração. Tenho muitos amigos em Braga. Passei por outros clubes, mas a minha família e a minha casa estão em Braga. Na minha cabeça, sinto-me quase 100% bracarense", vincou. O antigo jogador da seleção nacional, porém, teve um litígio em tribunal com o emblema minhoto, mas já está tudo sanado: "Não vamos tocar no assunto, já está resolvido. Não era nada fora do normal."

Em 1995, protagonizou uma das transferências mais badaladas do andebol português ao ingressar no Sporting. Pegou de estaca na equipa e sagrou-se MVP do campeonato na época de estreia, com 127 golos e 80 assistências. Depois, esteve no Benfica... durante dois meses. "Foi azar! Apresentaram um grande projeto aos jogadores contratados, tínhamos uma excelente equipa e um excelente treinador. Poderíamos ter feito coisas muito bonitas, mas a política entrou no desporto. E se as pessoas se preocuparem mais com a politização, não vai dar certo. Durou dois meses: fizemos a pré-época, trabalhámos muito, fizemos vários torneios de preparação e um jogo de campeonato, mas Vale e Azevedo fechou a modalidade. Então mudei--me para a Alemanha, uma das nações mais fortes no andebol", recordou.

Feitas as contas, faz um balanço muito positivo da carreira de jogador: "Entre o dia em que entrei e o que saí, houve uma longa vida. Tive orgulho e felicidade de jogar com grandes jogadores."

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