Dos cortes dentro de campo ao negócio dos cortes de cabelo
Fernando Aguiar era daqueles médios duros e agressivos, que no interior das quatro linhas tinha a missão de cortar ataques adversários. Contudo, de há cerca de dez anos para cá que o antigo trinco do Benfica se tem dedicado a outro tipo de cortes - gere um cabeleireiro com a mulher na Maia, onde vive desde a reta final da carreira.
"A minha mulher já trabalhava no ramo, e decidimos abrir um salão", revelou ao DN o antigo futebolista, de 45 anos. "Também tenho investimentos no Canadá, em imobiliário, bolsa e terrenos, e tem sido assim. Nada de trabalhos dia-a-dia", acrescentou o ex-centro-campista, que nasceu em Chaves mas emigrou para aquele país da América do Norte com apenas 2 anos.
No Canadá, Fernando Aguiar praticou hóquei no gelo, modalidade da qual ainda é apreciador, nomeadamente do Toronto Maple Leafs, equipa pela qual torce. "Jogava muito com os meus amigos, a nível amador. Na altura não havia grandes hipóteses a nível financeiro", contou, com saudades de dar "uns toques" quando lá vai durante o inverno.
Do outro lado do Atlântico, desenvolveu igualmente a paixão pelo... Benfica. "Os meus pais eram benfiquistas e assistíamos aos jogos por satélite. Daí que ir para o Benfica com quase 30 anos e ganhar a Taça de Portugal em 2003/04 tenha sido um sonho tornado realidade", confessou, lembrando como chegou à Luz com uma idade com a qual poucos são alvo de aposta: "Jogava pelo Beira-Mar e empatámos 3-3 com o Benfica [setembro de 2001]. No final do encontro, o Toni, que era o treinador do Benfica na altura, disse-me que eu tinha passado ao lado de uma grande carreira. Em janeiro fui contratado. Não estava à espera."
E embora tenha ganho carinho por todos os clubes que representou - "o Beira-Mar marcou-me muito", vinca -, é o Benfica que vai acompanhando com mais regularidade num pós-carreira no qual o futebol não tem feito parte. "Sinto saudades das brincadeiras de balneário. Gostava de estar ligado ao futebol, mas não como treinador. Gostava de fazer parte de uma estrutura, talvez como diretor desportivo", atirou, piscando o olho a um regresso ao desporto-rei.
O eterno Robocop
Fernando Aguiar não era dos jogadores mais talentosos da sua geração, mas deixava tudo em campo, ganhando a alcunha de Robocop. "Estava no Beira-Mar, a treinar com um joelho ligado, e um jornalista que estava a assistir à sessão chamou-me isso e ficou", esclareceu, bem-disposto, aparentando rever-se no epíteto.
"Depois de retirar-me em 2009 devido a uma lesão no menisco, voltei a jogar em 2013/14, nos distritais, pelo Pedrouços. Notava-se que os meus companheiros estavam contentes por me ter ao lado, mas os jogadores das outras equipas diziam-me que nos distritais era só porrada, mas eu disse-lhes que não sabiam com quem estavam a falar", brincou, nostálgico.
Sem complexos em falar do seu estilo de jogo - foi recentemente escolhido por Simão para o pior onze com o qual tinha jogado, o que motivou resposta severa através das redes sociais -, o luso-canadiano acredita que o sucesso do Benfica nos últimos anos também se deve à presença de mais jogadores à... Fernando Aguiar. "Não pode haver só jogadores tecnicistas. O Benfica começou a ganhar força quando passou a contratar médios defensivos mais duros e a proteger os jogadores nos jornais", frisou, deixando elogios a Fejsa, "um excelente trinco que é campeão por onde passa", ainda que "seja propício a lesões".
Marcou no jogo da morte de Fehér
Questionado sobre a maior mágoa da carreira, Fernando Aguiar não tem dúvidas em apontar "o jogo de Guimarães, da morte de Fehér", um encontro no qual o antigo médio até marcou o golo da vitória dos encarnados, minutos antes da tragédia.
A outra má lembrança que guarda foi a forma como deixou de jogar de águia ao peito. "Tinha sido o 12.º jogador mais utilizado, fiz muitos jogos e acho que fui importante no trajeto da equipa. Mas o Camacho saiu para o Real Madrid e disseram-me para esperar pela opinião do novo treinador. Só que não pude esperar e fui jogar para a Suécia. Depois fiquei a saber que o Trapattoni queria ter ficado comigo. Agora nada há a fazer", rematou o centrocampista.
Representou seleção do Canadá
Foi o Canadá o país que Aguiar representou ao nível de seleções nacionais, numa fase da carreira em que já jogava em Portugal. "Estava no Marítimo [1994/95] e não estava a jogar muito, não esperava atingir um nível que me permitisse ambicionar jogar por Portugal", recordou o antigo médio, que ainda somou 13 internacionalizações antes de desentender-se com o selecionador Holger Osieck, em 1999.
"O selecionador era alemão e impunha regras muito rígidas. Não me dei muito bem com ele e acabei por não ser chamado a uns jogos particulares. Acabou por me voltar a convocar quando fui transferido para o Benfica, mas aí fui eu a dizer que não. Queria que fosse à Gold Cup, mas nunca mais fui à seleção. Acho que tomei a decisão certa, pois estando no Benfica era complicado, devido às longas viagens até à América do Norte, Central e Caraíbas", disse o ex-futebolista, puxando a cassete atrás.